Trabalhos aprovados 2025

Ficha do Proponente

Proponente

    CAIO OLYMPIO MATOS DA ROCHA (UFBA)

Minicurrículo

    Doutorando em Comunicação e Cultura Contemporâneas FACOM/UFBA. Mestre em Cultura e Sociedade pelo IHAC/UFBA. Bacharel Interdisciplinar em Humanidades IHAC/UFBA. Graduando em jornalismo FACOM/UFBA. Membro do grupo de pesquisa (an)arqueologias do sensível sediado na FACOM/UFBA. Bolsista de doutorado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia.

Ficha do Trabalho

Título

    Com urubus e Cabral: outros olhares sobre a colonização no cinema entre Brasil, Portugal e PALOPs

Resumo

    O objetivo do trabalho é analisar a construção estético-política dos filmes Memória e Urubu é o amigo desconhecido e inseri-los em uma constelação fílmica (Souto, 2020) sobre a colonização, composta por mais três filmes transnacionais entre Brasil, Portugal e PALOPs, transversalizados pelo atlas do cinema mundial (Andrew, 2004) e o atlas de imagens (Ribeiro, 2023). Os dois filmes apresentam uma abordagem afrocentrada, que se contrapõe a olhares eurocêntricos e dialoga com a produção brasileira.

Resumo expandido

    Tendo em vista o objetivo de pesquisa mais amplo de caracterizar as experiências transnacionais envolvendo Brasil, Portugal e Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa – PALOPs, após o chamado Terceiro Cinema, o presente trabalho visa analisar os filmes Memória (2022) e Urubu é o amigo desconhecido (2021), do guineense Welket Bungué, em comparação com O testamento do senhor Nepomuceno (1998), de Fernando Manso, Tabu (2012), de Miguel Gomes, e A rainha Nzinga chegou (2018), de Júnia Torres e Isabel Casimira, no processo em andamento de construção de uma “constelação fílmica” (Souto, 2020) sobre o tema da colonização e da divisão moderna do mundo.
    Visando trazer um caráter transnacional para a análise, utiliza-se como recurso o atlas do cinema mundial (Andrew, 2004), ao transversalizar elementos fílmicos e extra fílmicos a partir dos mapas linguístico, de orientação e político, e do atlas de imagens (Ribeiro, 2023), o qual abre a possibilidade de investigar as perturbações e derivas do recorte lusófono, expandindo seu raio de ação para a imanência do mundo e suas relações pouco prováveis.
    O curta-metragem Memória é uma produção independente do cineasta Welket Bungué que conta com a colaboração de uma produtora brasileira e co-autoria do português Duarte Lima. A partir de uma linguagem que alia o documentário e a performance, o filme explora a história colonial e a independência de Guiné-Bissau através de um tempo simultâneo entre o passado, presente e futuro e da coexistência entre o discurso revolucionário de Amílcar Cabral e o misticismo intergeracional guineense. Falado em kriol, língua crioula guineense, português e inglês, Memória introduz mitos e referências da literatura africana, trazendo uma visão afrocentrada (Martins, 2024) sobre a colonização e a divisão do mundo em unidades nacionais.
    Urubu é o amigo desconhecido (2021), também dirigido por Welket Bungué, é filmado na Ilha Grande no Rio de Janeiro com a coprodução da produtora brasileira Rádio Escada. O filme trata do reencontro de um casal na praia e o diálogo deles com urubus que os sobrevoam, a partir de uma estética entre o ficcional e a performance, baseada no poema “The Past and Present”, de Paulo T. Bungué. Urubu.. alia a relação entre Brasil e África como territórios correlatos de uma revolução anti-colonial, dialogando com a ideia de Amefricanidade (González, 2014), e direcciona seu discurso para o português europeu através do autodenominado “canto responsorial” sobre a colonização e sua herança pós-colonial.
    Ao inserir os dois curtas na constelação fílmica sobre o tema da colonização composta por O testamento do senhor Nepomuceno, Tabu e A rainha Nzinga chegou, tem-se uma inversão de olhar em relação aos filmes dirigidos por portugueses, O testamento e Tabu, e um diálogo com a direção brasileira em A rainha Nzinga Chegou. Se, os dois curtas se diferenciam de O testamento.. e Tabu, devido a estes apresentarem um ponto de vista português sobre a colonização, variando entre a lusofonia e o eurocentrismo, em relação a A rainha Nzinga Chegou há uma partilha de olhares sobre o tema que envolve a ancestralidade africana e a interligação entre Brasil e África.
    Ao colocar em paralelo imagens de cada filme sobre a colonização é possível identificar estéticas e políticas que afirmam, mas também transbordam o recorte lusófono. Em O testamento… o romance português, a música cabo-verdiana e a dramaturgia brasileira são harmonizadas em um olhar lusófono sobre a colonização, já em Tabu, referências a filmes norte-americanos são visíveis na trilha sonora, no figurino e na narrativa sobre o processo de independência de Moçambique. Enquanto em A rainha Nzinga… o documentário híbrido se aproxima do “cotidiano singular” (Oliveira, 2021) sobre a África pré-colonial e o corte moderno colonial. Por fim, nos curtas de Bungué, é a performance corporal aliada ao documentário ou ficção que possibilita a expressão de epistemologias africanas e seu olhar sobre a colonização.

Bibliografia

    ANDREW, Dudley. An Atlas of World Cinema. Framework, v. 45, n. 2, p. 9–23. 2004.

    GONZÁLEZ, Lélia. A categoria político-cultural de amefricanidade. In: RIOS, Flavia; LIMA, Márcia. (org.). Por um feminismo afro-latino-americano. Rio de Janeiro: Zahar. 2014.

    OLIVEIRA, Janaina. Cotidiano singular. In: Cinema brasileiro anos 2010: 10 olhares, 2021.

    MARTINS, Leda Maria. Ogum humano: A epistemologia decolonial de Wole Soyinka. In: SOYINKA, Wole. Mito, literatura e o mundo africano. Trad. Karen de Andrade. 1 ed. Rio de Janeiro: Zahar; São Paulo: Edições Sesc São Paulo, 2024.

    RIBEIRO, Marcelo R. S. Em busca do mundo: literatura e cinema como dispositivos cosmotécnicos e aparelhos cosmopoéticos. Revista Brasileira de Literatura Comparada, v. 25, n. 49, p. 22–50, mai./ago. 2023.

    SOUTO, Mariana. Constelações fílmicas: um método comparatista no cinema. Galáxia – Revista do Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Semiótica, v.48, n. 1, p. 153–165, ago./dez. 2020.