Ficha do Proponente
Proponente
- Bruno Casalotti Camillo Teixeira (UNICAMP)
Minicurrículo
- Bacharel em Ciências Sociais (FFLCH-USP), mestre em Sociologia (IFCH-UFRGS) e doutorando em Ciências Sociais (IFCH-UNICAMP) onde é vinculado à linha de pesquisa em Trabalho, Política e Sociedade. Realiza pesquisa sobre o mundo do trabalho no setor audiovisual brasileiro desde 2019. Tem interesse em áreas como: Economia Política da Comunicação, da Informação e do Audiovisual; Sociologia do Trabalho Artístico e Cultural; Sociologia do Cinema; Sociologia da Televisão; e Teorias da Comunicação.
Ficha do Trabalho
Título
- A Economia de Temporadas e o Trabalho no Audiovisual: Notas Para Uma Abordagem Teórica e Conceitual
Seminário
- Políticas, economias e culturas do cinema e do audiovisual no Brasil
Resumo
- Nesta comunicação pretendemos apresentar e discutir o conceito de “Economia de Temporadas”, termo criado por nós para ilustrar as transformações no mundo do trabalho em audiovisual no Brasil. O conceito descreve um modelo produtivo intermitente, impulsionado por uma racionalidade de produção por projetos e fundado no princípio da incerteza. Para tanto, temos como base dados quantitativos e qualitativos, além de um referencial teórico inspirado em teoria social e economia política do audiovisual.
Resumo expandido
- A presente comunicação tem como intuito apresentar dados e reflexões teóricas que compõem a fase conclusiva da pesquisa denominada “Trabalho e trabalhadores do audiovisual do Brasil: contextos de produção, relações de trabalho e condições do emprego”. Tal pesquisa tem como objeto de análise as relações sociais, econômicas e políticas que estruturam o mercado de trabalho em audiovisual no Brasil. Nessa exposição, pretendemos apresentar a metonímia “Economia de Temporadas”, conceito que foi desenvolvido para interpretar dados de diferentes naturezas obtidos longo de seis anos de investigação. A ideia de “Economia de Temporadas” tem como referência inicial a obra de Boltanski e Chiapello (2009), especificamente o termo “economia por projetos” (ou “comunidade por projetos”). Trata-se de uma denominação sociológica feita pelos autores para ilustrar o que eles chamam de “novo espírito do capitalismo”, e que tomamos emprestada para construir uma abordagem analítica e crítica. A nossa hipótese é que o avanço da “Economia de Temporadas” sobre o setor audiovisual brasileiro se correlaciona: (i) a mudanças significativas nas relações laborais que permeiam o setor; (ii) ao recrudescimento de contratualidades intermitentes no mercado de trabalho em questão; (iii) à consolidação de um modelo produtivo baseado na volatilidade e na fragmentação organizacional;
Consideramos que a “Economia de Temporadas” é, também, parte de um regime de racionalidade neoliberal (LAVAL; DARDOT, 2016). Tal racionalidade magnetiza fatores estruturais, como o desenvolvimento tecnológico e as ações do Estado para a cultura. Nesse sentido, o caráter intermitente das políticas culturais brasileiras e a ausência de regulação social das plataformas over-the-top (OTT) podem levar o audiovisual nacional a uma adesão acrítica à “Economia de Temporadas”. Igualmente, meios tecnológicos não-lineares que disponibilizam conteúdo sob demanda estimulam a produção por projetos, a qual é marcada pelo imediatismo e pela efemeridade. Assim, em referência a Laval e Dardot (2016), pode-se dizer que a “Economia de Temporadas” governa uma “racionalidade de produção por projetos” que é estimulada, simultaneamente, pelo Estado e pelo mercado audiovisual hegemônico. Para ilustrar a aplicação prática desse conceito, propomos mobilizar o ferramental teórico para dar inteligibilidade a dados quantitativos e qualitativos. A partir de estatísticas atualizadas da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS) e da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), analisamos tendências longitudinais do emprego formal, da pejotização, e da evolução dos rendimentos no setor audiovisual brasileiro. Esses dados são complementados por depoimentos coletados através de entrevistas semiestruturadas junto a técnicos e profissionais do audiovisual “abaixo da linha”. Nesse ponto, temos como intuito explorar a percepção dos depoentes a respeito do trabalho intermitente, bem como as estratégias individuais e coletivas de sobrevivência nesse novo cenário. O material empírico coletado permite sugerir que a “Economia de Temporadas” pode deslocar o setor audiovisual brasileiro para um “regime de expropriação” (FRASER; JAEGGI, 2021). A nossa conclusão é que esse modelo produtivo, caracterizado por ciclos curtos de produção, alta rotatividade e jornadas de trabalho abusivas, intensificam a lógica que Nancy Fraser e Rahel Jaeggi denominam – com base na tese clássica de Rosa Luxemburgo – como “acumulação por expropriação”. Em síntese, acreditamos que o que está em jogo, no contexto da “Economia de Temporadas” não é apenas a soberania imaginativa do Brasil, mas também a fortuna criativa dos trabalhadores do audiovisual. Diante desse cenário, discutimos como essas transformações impactam a organização coletiva dos trabalhadores e quais são os desafios para a regulamentação do trabalho em audiovisual na era das tecnologias digitais.
Bibliografia
- BAHIA, Lia; BUTCHER, Pedro; TINEN, Pedro. O setor audiovisual e os serviços de streaming: da necessidade de repensar a regulação e as políticas públicas. Revista Eletrônica Internacional de Economia Política da Informação da Comunicação e da Cultura, v. 24, n. 3, p. 101-116, 2022.
BOLTANSKI, Luc; CHIAPELLO, Ève. O novo espírito do capitalismo. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2009.
CARLEY, Michael. Indicadores sociais: teoria e prática. Rio de Janeiro: Zahar, 1985
DARDOT, Pierre; LAVAL, Christian. A nova razão do mundo. São Paulo: Boitempo Editorial, 2016.
FRASER, Nancy; JAEGGI, Rahel. Capitalismo em debate: uma conversa na teoria crítica. São Paulo: Boitempo Editorial, 2021.
HUWS, Ursula Elin. Vida, trabalho e valor no século XXI: desfazendo o nó. Caderno CRH, v. 27, n. 70, p. 13-30, 2014.
LADEIRA, João Martins; MARCHI, Leonardo. REDES DE IMBRÓGLIOS: A Regulação do Streaming no Brasil e
suas Ambiguidades. Contracampo, Niterói, v. 38, n.3, p. 68-79, 2020.