Trabalhos aprovados 2025

Ficha do Proponente

Proponente

    João Paulo Pinto Wandscheer (UFRGS)

Minicurrículo

    Doutorando em Comunicação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e bolsista da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). Participa do ARTIS – Grupo de Pesquisa em Estética e Processos Audiovisual. É mestre em Comunicação Social pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS) e, atualmente, desenvolve uma pesquisa sobre cinema queer brasileiro e natureza.

Ficha do Trabalho

Título

    Orgia e ficção ecoqueer: uma análise do filme brasileiro A Torre (2021)

Resumo

    Parte de uma tese em desenvolvimento, este trabalho analisa a cena de orgia que ocorre em meio à natureza no longa-metragem brasileiro A Torre (2021), dirigido por Sérgio Borges. O filme coloca em tensão normas, imposições sociais e preconceitos, conectando também a vivência dos personagens com a floresta, possibilitando assim que se alcance uma ideia de futuro não apenas desprendida de regulações cisheteronormativas, mas também que apresente novas formas de habitar o planeta.

Resumo expandido

    Parte de uma tese em desenvolvimento, este trabalho consiste em uma análise da cena de orgia que ocorre em meio à natureza no longa-metragem brasileiro A Torre (2021), dirigido por Sérgio Borges. O filme retrata uma crise enfrentada pelo protagonista André, que se isola em uma floresta para se questionar sobre os rumos que a sua vida vem tomando – inclusive, a respeito da atração que sente por outros rapazes. A angústia que oprime André coloca em tensão o preconceito voltado a homens que se sentem atraídos por homens.
    Na mata, André cruza por um rapaz mais jovem, que não enfrenta dificuldades para aceitar a sua sexualidade e que tampouco apresenta preocupação em defini-la. O rapaz, inclusive, participa de uma orgia que ocorre em meio à floresta. O enfoque da análise desta pesquisa será a narrativa deste momento em que diferentes pessoas transam em torno de árvores, em frente a um rio. Mota Lopes (2024, p. 4) destaca que, na literatura, a ficção – através de uma perspectiva ecoqueer – embaralha convenções e derruba normatividades em relação a corpo, gênero e sexualidade, ao mesmo tempo que possibilita “uma ampliação dos interesses para com o meio ambiente”. Essa é uma perspectiva que encontra sintonia com a ficção no cinema, enquanto A Torre contribui para o que Mortimer-Sandilands e Erickson (2010) advogam: tornar as políticas queer mais verdes e a ecologia mais queer.
    Marconi (2020), entretanto, nos lembra que a política das imagens queer não se restringe ao seu conteúdo ou a discursos de denúncia, pois também se encontra na sua invenção formal. Durante a orgia que ocorre em A Torre, as árvores que circundam a cena, a tranquilidade da floresta, o som do rio que corta a mata e o carinho entre as pessoas envolvidas na transa sublinham o prazer e os afetos que surgem do toque entre os diferentes corpos – tensionando, desse modo, preconceitos. O filme ainda retrata possibilidades de desejo mais fluidas. De acordo com Nagime (2016), o conceito de queer desestabiliza normas sociais e abre espaço para a fluidez, um contraponto à rigidez de normas voltadas à sexualidade. Além disso, Nagime (2016) ressalta que, assim como a heterossexualidade, a monogamia também é socialmente imposta, sendo portanto um confronto relevante nas lutas queer.
    Em A Torre, a política se revela um fator intrínseco às reflexões que tangem a natureza. Há inclusive diferentes formas de pensar política e cinema. No que se refere à ficção, Rancière (2012) compreende que ela mostra o que não era visto e correlaciona o que não se correlacionava. Para o filósofo, a ficção não é oposta à realidade, uma vez que o real não existe: somente configurações do que é dado como real. Desse modo, segundo Rancière (2012, p. 75), o que a arte pode fazer é fraturar noções dadas sobre o real e contribuir para o desenho de “uma paisagem nova do visível, do dizível e do factível”. Mota Lopes (2024) entende que a ficção, por meio de um viés ecoqueer, faz as experiências narradas existirem e possibilita que se alcance uma ideia de futuro não apenas desprendida de regulações cisheteronormativas, mas também que apresente novas de formas de habitar o planeta.
    A floresta, em A Torre, possui um caráter político e sublinha que o espaço na narrativa cinematográfica, conforme apontam Gaudreault e Jost (2009), não se limita a um papel de apoio. O filme, além de desestabilizar normas e preconceitos, conecta a vivência dos personagens com a mata e assim acaba por tensionar também a destruição da natureza. As ficções ecoqueer, contudo, também podem contar narrativas que envolvem sexualidades e identidades de gênero para além dos contextos apresentados na obra dirigida por Sérgio Borges, sendo narradas nas mais diversas linguagens – literárias ou cinematográficas – nos aproximando assim da pluralidade existente fora dos padrões cisheteronormativos e que apresentam também uma diversidade de conexões com a natureza.

Bibliografia

    GAUDREAULT, Andre; JOST, François. A narrativa cinematográfica. Brasília: Editora UNB, 2009.
    MARCONI, Dieison. Cinema queer brasileiro ou as veias abertas da política da imagem. REBECA – Revista Brasileira de Estudos de Cinema e Audiovisual, v. 9, n. 2, p. 141-157, jul./dez. 2020.
    MORTIMER-SANDILANDS, Catriona; ERICKSON, Bruce. Queer Ecologies: Sex, Nature, Politics, Desire. Bloomington: Indiana University Press, 2010.
    MOTA LOPES, Mariana. (2024). Da Extinção Das Abelhas ao Caos: Reflexões sobre a Dimensão Ecoqueer da Ficção Brasileira Contemporânea. Letras De Hoje, v. 59, n.1, p. 1-10, 2024.
    NAGIME, Mateus. Em busca das origens de um cinema queer no Brasil. Dissertação (Mestrado em Imagem e Som) – Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2016.
    RANCIÈRE, Jacques. O espectador emancipado. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2012.