Trabalhos aprovados 2025

Ficha do Proponente

Proponente

    Tainá Gomes Brasileiro (UFPE)

Minicurrículo

    Tainá Brasileiro é bacharel em Cinema e Audiovisual pela UFPE. Durante a graduação, foi bolsista CNPq no projeto “Cinema como cosmopoética e práticas decoloniais”, orientado pela Profª Drª Catarina Andrade. Foi monitora de Produção Audiovisual, Roteiro Cinematográfico e Cinema Musical, ministradas pelos Profs. Drs. Mannuela Costa, Fernando Weller e Angela Prysthon. Presidiu o Diretório Acadêmico de Cinema da UFPE e exibiu seu curta ERA (2022) no 22º Festival Brasileiro de Cinema Universitário.

Ficha do Trabalho

Título

    Lições de Kiarostami, a educação do olhar através do cinema

Eixo Temático

    ET 3 – FABULAÇÕES, REALISMOS E EXPERIMENTAÇÕES ESTÉTICAS E NARRATIVAS NO CINEMA MUNDIAL

Resumo

    O presente trabalho tem como objetivo analisar o documentário Lição de Casa (1989, dir. Abbas Kiarostami), suscitando reflexões sobre a relação construída entre o cinema e a escola ao longo da obra. Em virtude disso, usaremos as discussões de Bergala (2008) e Larrosa (2002) sobre a experiência, além de explorar as noções de espectador de Rancière (2012). Portanto, desejamos investigar o olhar para o espaço educativo e as sensibilidades dos alunos entrevistados, pensando suas percepções do mundo.

Resumo expandido

    Procuramos neste trabalho examinar a obra Lições de Casa (1989), do diretor iraniano Abbas Kiarostami, indagando o modo como os personagens do filme entendem a si mesmos e a escola, além de questionar como a câmera fricciona as dinâmicas daquela estrutura. A presença do cinema nesse meio será posta como um mecanismo capaz de fomentar sensibilidades distintas e construir novas configurações do comum. Em razão disso, este trabalho nasce em consonância com o projeto de pesquisa “Cinema como cosmopoética e práticas decoloniais: experiências de interculturalidade crítica e desejos decoloniais no cinema”, que propõe pensar o cinema como uma ferramenta de invenção do comum, ligada à crítica decolonial, capaz de transformar a educação e resistir à sua instrumentalização mercadológica.
    Analisando o material fílmico, a obra acompanha o diretor entrevistando alguns alunos da escola Martyr Masumi com perguntas que iniciam nas circunstâncias da lição de casa, contudo, afloram-se para outros debates sobre as vivências dos alunos na escola. Entre algumas conversas, é exposta a ciência dos estudantes sobre as dinâmicas punitivas e a hierarquia das inteligências daquele espaço. Além disso, a gestualidade dos alunos revela que “A arte é por definição um elemento perturbador dentro da instituição” (Bergala, 2008, p. 30), em virtude da maneira comedida com que performam diante da câmera.
    Então, discutiremos o que condiciona alguns entrevistados a sorrirem para a câmera, envergonhados, e outros a se sentirem ameaçados por ela. Existem até momentos em que os alunos mentem ao responder perguntas feitas pelo diretor, revelando uma educação a qual estimula a perda de personalidade dos estudantes (Niney, 2016, p.132), posto que, no lugar de falarem a verdade sobre si, preferem atender às conformidades impostas pelas normas da escola. Esses instantes, originados pela vigilância, serão postos como um dos elementos que engessam as trocas nesses espaços. Em contraste, consultaremos as maneiras pelas quais a experiência advogada por Larrosa (2002) se apresenta enquanto contraponto dessa organização.
    Para mais, pensaremos as lógicas hierárquicas vivenciadas pelos entrevistados, que existem não apenas na relação com os professores, mas entre seus familiares. Esse paradigma, em paralelo ao pensamento de Rancière (2002), será interpelado de modo crítico, pois alguns dos estudantes revelam que seus pais, mesmo sem saber ler, usam o arranjo de poder das suas faculdades parentais para subjugá-los quando não fazem o dever de casa corretamente.
    Os entrevistados do filme também vão ser analisados como construtores do discurso da espectatorialidade, retornando aos relatos imprecisos sobre as lições de casa e à própria narração dúbia do diretor. As lacunas nas narrativas são comuns no cinema de Kiarostami, em consequência das suas convicções enquanto diretor, pois ele acredita na necessidade de “espaços vazios, – como nas palavras cruzadas –, e que é o espectador quem deve completá-los.” (Kiarostami, 2016, p. 32). Essa abertura para a fabulação do espectador também é sustentada por Rancière (2012), que argumenta sobre tal estímulo ligado à emancipação. Por essa razão, será adicionado ao texto reflexões sobre o processo emancipatório, tanto do espectador quanto dos estudantes, além de refletir sobre a operacionalidade do cinema nesse fluxo.
    Assim, observaremos esses materiais do campo prático e teórico buscando compreender o cinema como um agente artístico no âmbito da educação. Por esse motivo, faremos uso de um diretor sensível às questões da escola e convencido de que “a arte dá a cada artista e a seu espectador a possibilidade de perceber melhor a verdade dissimulada por trás da dor e da paixão que os seres ordinários experimentam cotidianamente” (Kiarostami, 2016, p.31). Em suma, o nosso objetivo é explorar caminhos possíveis da vivência em sala de aula para a estimulação da experiência sensível construída através do cinema.

Bibliografia

    BERGALA, Alain. A hipótese-cinema. Rio de Janeiro: Booklink, 2008.
    KIAROSTAMI, Abbas. “Um Filme, Cem Sonhos”. In: Abbas Kiarostami: um filme, cem histórias. pp. 31-34. São Paulo: Catálogo CCBB SP, 2016.
    NINEY, François “Durante o filme, a vida continua…”. In: Abbas Kiarostami: um filme, cem histórias. pp. 129-139. São Paulo: Catálogo CCBB SP, 2016.
    RANCIÈRE, Jacques. O mestre ignorante: cinco lições sobre a emancipação intelectual. Tradução de Lílian do Valle. Belo Horizonte: Autêntica, 2002.
    _________. O espectador emancipado. 1.ed. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2012.
    LARROSA, Jorge. Notas sobre a experiência e o saber de experiência. Revista Brasileira de Educação. [online], n. 19, pp. 20-28, jan./abr. 2002.