Trabalhos aprovados 2025

Ficha do Proponente

Proponente

    Jefferson de Souza (UNESP)

Minicurrículo

    Atualmente cursa Doutorado em Ciências Sociais na Faculdade de Ciências e Letras da UNESP. Integra o NAIP – Núcleo de Antropologia da Imagem e Performance (UNESP). Mestre em Comunicação (área de concentração Audiovisual) pela Universidade Anhembi Morumbi. Possui especialização em Ciências Humanas pela PUCRS, além de licenciatura em Ciências Sociais pela Faculdade de Ciências e Letras da UNESP. Tem experiência em criação e curadoria de projetos culturais e educativos, especialmente em Cinema.

Ficha do Trabalho

Título

    Filhos da Dinamarca: extremismo, nacionalismo e xenofobia

Resumo

    A partir da ficção Filhos da Dinamarca, do cineasta Ulaa Salim, este trabalho tece relações entre os conflitos estabelecidos na obra citada e a xenofobia sofrida pelos imigrantes/refugiados que vivem na Dinamarca neste século XXI. Nota-se, por meio de reportagens da imprensa dinamarquesa e europeia, bem como da crítica especializada, que há um diálogo significativo entre o filme e o recrudescimento da xenofobia contra árabes, além da radicalização de grupos extremistas representada no filme.

Resumo expandido

    Não importa se consciente, passivo ou mergulhado na franca alienação, o oprimido
    traz uma disponibilidade para a revolta, mesmo que subterrânea. (Xavier, 2007)

    A proposta deste trabalho é referente à pesquisa que desenvolvi em meu Mestrado (Souza, 2024), a qual discutiu o filme Filhos da Dinamarca (2019) do cineasta Ulaa Salim. Este, nascido na Dinamarca e filho de imigrantes iraquianos, tem por característica discutir em seus filmes questões como: emergência climática, identidade, racismo, xenofobia, dentre outras. O que pode ser confirmado por sua filmografia e também por um trecho do manifesto de sua produtora, a Hyaene Film: “Não queremos apenas produzir conteúdo que entretenha. Deve haver algo em jogo, as histórias devem querer algo mais, deve haver algo real no coração e substância” (Hyaene Film)
    Filhos da Dinamarca teve significativo impacto na crítica especializada dinamarquesa. O filme também ecoou entre alguns políticos da extrema-direita do país, os quais propuseram sua censura sob o argumento de que é “Um filme de propaganda perigoso para o dinheiro dos contribuintes” (2019, Brunn, Christensen)
    A narrativa se passa em 2025, um ano após um ataque à bomba em uma estação de metrô. A partir de então, Martin Nordahl, político de extrema-direita, inicia a campanha para as eleições com discursos xenófobos contra os imigrantes de origem árabe que vivem no país.
    Por outro lado, há uma reação organizada de alguns imigrantes que, sob a liderança de Hassan, que planejam assassinar Nordahl. Isso resulta em dois grupos em lados opostos, mas que atuam por meio da violência, e com lideranças que não tem a paz como horizonte até porque o pacto social está quebrado.
    Salim problematiza, em seu melodrama, os radicalismos de uma sociedade distópica que parece já não lembrar a origem destes conflitos. Os imigrantes/refugiados representados no filme aparecem em situações de pauperidade, vivendo em uma espécie de cortiço e amontoados. Além de estarem sob o medo constante de serem atacadas por neonazistas que imaginam se conectar por um nacionalismo radical. E aqui adotamos o verbo imaginar no sentido do historiador Benedict Anderson, o qual reflete sobre o que seria uma nação: “uma comunidade politica imaginada – e imaginada como sendo intrinsecamente limitada e, ao mesmo tempo, soberana. Ela é imaginada porque os membros das mais minúsculas nações jamais conhecerão, encontrarão ou nem sequer ouvirão falar da maioria de seus companheiros, embora tenham todos em mente a imagem viva da comunhão entre eles.” (2008, p. 32)
    Sendo assim, procurei ampliar o espectro de análise do filme ao buscar evidências e fatos que correspondessem a minha hipótese de que a Dinamarca poderia estar, em sua realidade política, deixando sua vocação social-democrata de país que sempre acolheu os refugiados, assim como mostram os documentos do ACNUR (Agencia da ONU para Refugiados). Cabe destacar que a Dinamarca foi o primeiro país a assinar a Convenção das Nações Unidas sobre refugiados em 1951.
    Os dados do próprio site do governo dinamarquês sobre imigração evidenciam parte desta realidade de recuo ao acolhimento. À medida que políticas anti-imigratórias, bem como discursos anti-imigrantes, passaram a fazer parte do jogo politico no parlamento dinamarquês, o número de refugiados sírios que adentraram o país diminuiu significativamente a partir de 2017. Outro dado aponta que atualmente vivem em torno de 270 mil muçulmanos no país que contam com mais de 100 mesquistas.
    Em determinado momento da pesquisa compreendi que outros aspectos da obra, e que compõem a mise-em-cene do diretor, integram os diversos sentidos do filme. A cor vermelha, por exemplo, foi constantemente usada para marcar o nacionalismo dinamarquês como elemento que alinhava a narrativa.
    Por fim, destaco que a pesquisa alerta como a Dinamarca pode estar dentro de um circuito de extrema-direita, apesar de alguns esforços do país para marcar uma postura democrática e anti-extremista.

Bibliografia

    ANDERSON, Benedict. Comunidades imaginadas: reflexões sobre a origem e a difusão do nacionalismo. São Paulo: Companhia das Letras, 2008.
    BRUUN, N. e CHRISTENSEN, C. Filmfolk reagerer på politikers angreb. EKKO Filmmagasinet, 11 abr. 2019. Disponível em: https://ekkofilm.dk/artikler/filmfolk-reagerer-pa-politikers-angreb/ Acesso em: 25/11/2022.
    FILHOS DA DINAMARCA (DANMARKS SØNNER). Direção: Ulaa Salim. Dinamarca: Prime Video, 2019. (126 min).
    HYAENE FILM. Disponível em https://www.hyaenefilm.dk Acesso em: 14/04/2024.
    SOUZA, Jefferson de. Ser ou não ser um filho da Dinamarca, eis a questão: estudo sobre o filme de Ulaa Salim. 2024. Dissertação (Mestrado em Comunicação) – Universidade Anhembi Morumbi, São Paulo, 2024. Disponível em: https://repositorio.animaeducacao.com.br/handle/ANIMA/46102. Acesso em: 29 mar. 2025.
    XAVIER, Ismail. Deus e o diabo na terra do sol: as figuras da revolução, in Sertão Mar-Glauber Rocha e a estética da fome. São Paulo: Cosac Naify, 2007.