Trabalhos aprovados 2025

Ficha do Proponente

Proponente

    Maira Cinthya Nascimento Ezequiel (UFS)

Minicurrículo

    Maíra Ezequiel é doutora em Cinema e Audiovisual, pelo PPGCINE-UFF, mestre em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP e graduada em jornalismo pela UFAL. É professora efetiva do curso de Cinema e Audiovisual da Universidade Federal de Sergipe, onde coordena um grupo de pesquisa (PIBIC) sobre protagonismo de mulheres em narrativas seriadas no contexto da América Latina.

Ficha do Trabalho

Título

    Representações femininas e fronteiriças na minissérie colombiana Fronteira verde

Seminário

    Cinema e audiovisual na América Latina: novas perspectivas epistêmicas, estéticas e geopolíticas

Resumo

    A comunicação se propõe a analisar como a minissérie colombiana Fronteira Verde (2019) trata suas representações femininas em diálogo com as proposições da autora chicana Glória Anzaldúa em sua obra La Frontera/Borderlands (2020). Seu entendimento de fronteira serve como aparato de análise para compreender como a presença dessas personagens brancas, mestiças e indígenas, negociam outras formas de pensar, entender e representar as mulheres em um contexto particular de America Latina.

Resumo expandido

    O pensamento da autora chicana Gloria Anzaldúa em torno do teor polissêmico e plural do conceito de fronteira pauta as reflexões propostas nesta comunicação. Convoco algumas proposições de sua obra La Frontera/Borderlands (2020) para dialogar com o modo como a narrativa da minissérie Fronteira Verde (2019) trata as representações femininas. As reflexões de Walter Mignolo (2015), em diálogo com Anzaldúa, também ajudam nesta proposta.
    Composta por oito episódios, a minissérie colombiana é a primeira produção original da Netflix no país. Na trama, a investigadora Helena Poveda (Juana Del Rio), viaja de Bogotá até a fronteira amazônica entre as cidades fictícias de Puerto Manigua (Colombia) e Yurumí (Brasil) para investigar o feminicídio de quatro missionárias. Há três tipos de mulheres apresentadas em Fronteira verde: a detetive, as missionárias e a mulher-entidade indígena, que também aparece assassinada junto às missionárias. É possível ainda pensar na própria floresta como uma representação feminina, referida pelos locais de forma quase antropomórfica como La manigua. Entre essas representações, um arranjo complexo se estabelece. Há a detetive forasteira, que se revelará uma mestiça cujo passado está intrinsecamente ligado à floresta. Há as missionárias brancas, que evangelizam mulheres indígenas para uma seita só de mulheres, denominada Éden, que alude ao pensamento da teologia feminista (Furlin, 2011). E há a mulher-entidade indígena, Ushe (Angela Cano), que transita pelo mundo físico e metafísico, sendo vista pelas missionárias como uma santidade e cujo passado está ligado à Helena.
    Anzaldúa desenvolve uma ideia de fronteira pautada em sua experiência pessoal, como mulher chicana lésbica. Chama atenção para o teor polissêmico de fronteira como conceito: fronteira como lugar de passagem, transição, mestiçagem, hibridismos. Fronteiras como encruzilhadas, que proporcionam idas e vindas constantes. Fronteira também como categoria de análise: um lugar (ou um estado) de mediação cultural. Fronteiras não apenas geográficas, mas sobretudo étnicas e linguísticas. Línguas também híbridas, mestiças. Anzaldúa (2012) defende um uso performático da língua, já que território e língua são lugares fundamentais na expressão e afirmação da identidade. Fronteiras também de gênero, tanto no sentido literário (cultural, fílmico) como na chave da diferença sexual (Anzaldúa, 2012, p. 35). Citando Anzaldúa, Mignolo (2008) argumenta que, ao pensar a decolonialidade, já colocamos em operação um fazer decolonial, visto que nos deslocamos da base do paradigma epistemológico moderno-colonial para uma outra perspectiva, tanto teórica quanto prática. Como premissa epistemológica, a fronteira é um território conceitual onde estão em disputa identidades, existências, memórias, histórias. É sob essa perspectiva que o conceito de fronteira me serve como aparato de reflexão e análise: para compreender como a presença e o protagonismo dessas personagens mulheres, nesse espaço diegético que opta por uma representação de América Latina híbrida e heterogênea, negociam outras formas de pensar, entender e representar esses mundos e essas mulheres.
    Já no título da obra evoca-se essa noção de fronteira como um lugar em constante estado de transição, repleto de proibições, “criado pelo resíduo emocional de um limite não-natural” (Anzaldúa, 1987, p. 3). Na trama, a representação de uma cosmovisão indígena de mundo ganha destaque central. Além disso, uma parte do elenco é formada por atores amadores indígenas da região. A série também se vale da pluralidade dos idiomas falados no local, sendo possível ouvir diálogos em espanhol, português, inglês e idiomas indígenas locais (não especificados).
    Considerando as escolhas estéticas que a minissérie faz para construir essas representações, vale investigar a possibilidade de estarmos diante de uma narrativa que opera uma abordagem sensível a essas questões.

Bibliografia

    ANZALDÚA, Glória. Como domar uma língua selvagem. In: HOLLANDA, Heloísa Buarque de (Org.). Pensamento Feminista Hoje: Perspectivas Decoloniais. Rio de Janeiro: Bazar do Tempo, 2020.
    ___________________. Borderlands/ La Frontera – The new mestiza. Madrid: Aunt Lute Books, 1987.
    FURLIN, Neiva. Teologia feminista: uma voz que emerge nas margens do discurso teológico hegemônico. Rever, Ano 11, No 01, Jan/Jun 2011. Disponível em: https://revistas.pucsp.br/index.php/rever/article/view/6034
    MIGNOLO, Walter. La idea de América Latina: La herida colonial y la opción decolonial. Barcelona: Gedisa Editorial, 2005.
    ________________. Habitar la frontera: sentir e pensar la descolonialidad (antologia 1999 – 2014). Barcelona: CIDOB, 2015.