Trabalhos aprovados 2025

Ficha do Proponente

Proponente

    Georgiane Abreu da Costa (UFPA)

Minicurrículo

    Historiadora e doutoranda em Antropologia, ambos os títulos pela Universidade Federal do Pará, atualmente pesquiso cinema trans na Amazônia a partir de 3 cineastas que elaboram sobre identidade cabocla e multiperspectivismo; produzo críticas de cinema há mais de 15 anos, hoje vinculada ao grupo Feito Por Elas. Trabalho também com educação popular em audiovisual, facilitando oficinas de realização e experimentação junto à Fundação Cultural do Pará e do Núcleo de Oficinas Curro Velho.

Ficha do Trabalho

Título

    Trans-futuro: ancestralidade e identidade cabocla pela ótica LGBTQIAPN+ audiovisual amazônida

Eixo Temático

    ET 3 – FABULAÇÕES, REALISMOS E EXPERIMENTAÇÕES ESTÉTICAS E NARRATIVAS NO CINEMA MUNDIAL

Resumo

    Pesquisando sobre audiovisual contemporâneo paraense encontrei representações de futuro que conjugam encantarias amazônicas e a ressignificação da identidade cabocla. Esse cinema trans, que se posiciona frente a debates de gênero e pensa os atravessamentos entre amazônias rurais e urbanas, aponta para uma ancestralidade projetada no futuro, postulando assim o ethos de uma produção de conhecimentos insubmissos a partir da produção de imagens.

Resumo expandido

    À medida que nos acostumamos à ideia de uma era geológica produzida pela ação humana na terra, suas consequências se acumulam e adensam. Entre desastres ambientais, ecocídios e eventos climáticos extremos, alguns artistas da amazônia brasileira vem buscando responder perguntas como que lugar acolherá suas religiosidades afro-indígenas a partir da destruição do mundo como conhecemos?
    Pesquisando e ensinando sobre audiovisual na produção brasileira durante os últimos 6 anos, com foco no cinema contemporâneo paraense, foi possível notar uma certa tendência presente em filmes, fotografias e performances atuais: representações de futuro que conjugam ancestralidade, novas formas de presença de tradições e encantarias amazônicas e a ressignificação da identidade cabocla em diálogo com o conceito de Antropoceno. A partir desta pesquisa cheguei às artistas que serão aqui apresentadas e à produção de cinema trans no Pará. Essa produção tem características experimentais e de baixo orçamento e vem circulando num nicho muito restrito diante da expansão estética e o engajamento político que empreende. Como escreve Georges Didi-Huberman em Quando as imagens tomam posição, “Tomar posição é desejar, é exigir algo, é situar-se no presente e visar um futuro. Contudo, tudo isso só existe sobre o fundo de uma temporalidade que nos precede, que nos engloba, chamando por nossa memória até em nossas tentativas de esquecimento, de ruptura e de novidade absoluta”. (2017:15)
    Acreditando que esse cinema trans, que se posiciona frente a debates de gênero, mas não só, que pensa também os atravessamentos entre amazônias rurais e urbanas e se insere no debate climático, aponta para uma ancestralidade projetada no futuro, postulando assim o ethos de uma produção de conhecimentos insubmissos, que podem “desembocar em utopias emancipadoras e anticoloniais para um mundo melhor.” (Gontijo, 2023:51)
    Em Iauaraete (2020), curta-metragem dirigido e performado por Xan Marçall, a artista que no momento da realização deste filme vivia longe de sua terra natal, o Pará, reproduz um ritual que a conecta com um devir-onça. Através da lida com plantas de poder, banhos de cheiro e pontos de umbanda, acompanhamos a transformação do corpo da personagem que aos poucos vai assumindo um aspecto menos humano e mais animal. Questionada sobre sua escolha a artista evoca a necessidade de preservar essas entidades ancestrais e buscar imaginar como se darão os cultos às encantarias em outras cidades, que não as amazônicas, e até mesmo quando a ideia de Amazônia como conhecemos se transformar de tal forma que não a reconheçamos mais. Atravessada pela ideia de fim do mundo, Marçall é contundente e afirma que “encantaria é coisa que nunca morre.”
    O slamer, poeta e cineasta Hugo Leonardo, durante lançamento de seu primeiro livro, intitulado Ensaios do Eu, quando interrogado sobre quais imagens da Amazônia gostaria de ver e produzir, diz que gostaria de apresentar encantarias como a Matinta Perêra e o Saci com outros tipos de corpos, rompendo o binarismo: “Eu gostaria de apresentar um Saci trans, com peitos, por exemplo. Já imaginou?”
    As artistas citadas aqui, por coincidência ou não, fazem parte de religiões de matriz afro-indígena e também de grupos representados pela sigla LGBTQIAPN+. O que essa condição de corporalidade e extra-corporalidade praticada a partir da perfomatividade de gênero e da performatividade religiosa trazem como sensibilidade apurada para paisagens que abrigam, além dos humanos e dos animais, seres naturais e encantados? E como essa sensibilidade é apresentada através de fotos, desenhos e filmes?

Bibliografia

    Belaunde, Luisa (2015). Resguardo e Sexualidade(s): uma antropologia simétrica das sexualidades amazônicas em transformação. Cadernos de Campo, n. 24, p. 538-564. Disponível em:
    https://www.revistas.usp.br/cadernosdecampo/article/view/111618

    Didi-Huberman, Georges (2017). Quando as imagens tomam posição – O olho da história, I. Belo Horizonte: Editora UFMG.

    Gontijo, Fabiano (2023). Por uma Antropologia Antinormativa, Pública e Comprometida: algumas considerações sobre a diversidade sexual e de gênero no Brasil. Amazônica: Revista de Antropologia, vol. 15, n. 2, p. 50-72. Disponível em: http://dx.doi.org/10.18542/amazonica.v15i2.14972

    Olaia, Pedro; Sena, José; Frade, Marília; Jr, Paulo César; Marçall, Xan; Ferreira, Mariah e Sanderson, Marcelo. (2021). Corredora Cabokètyka. Revista Humanidades e Inovação, v.8, n. 59: Interseccionalidades das diferenças II. Disponível em: https://revista.unitins.br/index.php/humanidadeseinovacao/article/view/5560