Trabalhos aprovados 2025

Ficha do Proponente

Proponente

    emaxsuel roger rodrigues (UFBA)

Minicurrículo

    Cineasta e pesquisador de outras escritas. Graduado em cinema e audiovisual pela UFRB, mestre e doutorando pelo programa de pós-graduação em comunicação e cultura contemporâneas da UFBA. Tem interesse nas áreas de cinema, literatura, estudos comparados e em práticas decoloniais.

Ficha do Trabalho

Título

    Cinema e a possibilidade de existência entre partilhas e ficções

Resumo

    Esta proposta de comunicação é um exercício de leitura comparativa (Solomon, 2023) entre os filmes Entre nós talvez estejam multidões (2020) e Chão (2019) no toca o tema das partilhas e das ficções que denunciam abusos e violências nos pactos sociais. O intuito é compreender como cada filme e sua articulação narrativa apresenta essas partilhas e consegue promover debates, reflexões e apresentar novos modos de se partilhar (ou com-partilhar) a tarefa de habitar o mundo.

Resumo expandido

    Uma reunião entre moradores da ocupação Eliana Silva para celebrar sua existência e a criação de um código postal. Falas sobre a importância de se permanecer com atenção e disposição a enfrentamentos – políticos, econômicos, jurídicos, pessoais; falas que demonstram muito conhecimento sobre a articulação entre a legalidade e a ilegalidade e que esses termos convivem em uma balança frágil com o chamado “poder de mercado”. Troca de imagens e de filme para: um mirante que serve para avistar e avisar sobre possíveis perigos. Vó e P.C estão dentro dele, em vigília. Ao redor do mirante, um acampamento do MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra em meio a uma ampla zona de plantação de monocultura. P.C começa a desenhar em um quadro branco, disposto dentro do mirante. Com seu desenho, ele tenta explicar o que imagina para seu futuro lote. Numa montagem que alterna entre planos de P.C desenhando no quadro e planos de Vó fumando cigarro, Vó apresenta suas concordâncias e discordâncias com o projeto de P.C. Depois será sua vez de desenhar e explicar no quadro branco o que pretende plantar, como vai dividir seu lote para que possa ter criações de animais, plantações que lhe permitam ter uma vida sem privações alimentares ou financeiras. Vó ainda endossa sua torcida para que seu lote faça divisa com o lote de P.C para que possam trabalhar juntos e se ajudarem nos momentos de necessidade.
    Esses são dois movimentos iniciais nos filmes “Entre nós talvez estejam multidões” (2020, direção de Aiano Bemfica e Pedro Maia de Brito) e “Chão” (2019, direção de Camila Freitas). São filmes que se colocam diante de disputas territoriais e tentam abarcar um pouco do significa estar diante da necessidade de moradia e do peso de leis e de aparatos policiais que ainda mantêm uma estrutura colonial cada vez mais subserviente às estratégias mercadológicas. São dois excertos de lutas que percorrem séculos e que tentam denunciar as políticas de inimizade (Mbembe, 2027) por meio de partilhas e ficções que engendram um Estado e um mundo dividido entre quem aprendeu estratégias de manipulação de narrativas e quem tenta propor outras possibilidades de se com-partilhar espaços. Dessas partilhas, para lembrar um termo bastante desenvolvido por Jacques Rancière (2005), o projeto de fim de mundo (Ailton Krenak), da queda do céu (Davi Kopenawa), da catástrofe.
    Essa proposta de comunicação tem a intenção de dispor um espaço de comparação e debate entre imagens e lutas, entre a percepção das partilhas dispostas nos dois filmes, nas possibilidades de leituras que se abrem quando imagens e personagens se encontram: os personagens são o que se está para além do aparato colonial. Seus gestos, seus modos de vida que vão se colocando diante das terras que ocupam, suas estratégias de luta que se rearticulam a cada dia ou cada novo despejo ou a cada nova ocupação. Mais do que estar diante das câmeras para serem retratados, há o se conectar com quem realiza ou, mesmo, se dispor a pegar nas câmeras para denunciar abusos e violências. Nesses gestos de vida, aqui lidos como gestos de potência – uma potência da suavidade como articula a psicanalista Anne Dufourmantelle – a difícil missão de lutar contra as ficções que produzem misérias – políticas, econômicas e no campo do sensível.

Bibliografia

    BEMFICA MINEIRO, A. Fazer imagem, fazer cidade: uma aproximação cartográfica da luta do MLB em Belo Horizonte junto, com e através das imagens. Dissertação (Mestrado em Comunicação Social)—Belo Horizonte: Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social da Universidade Federal de Minas Gerais, 2021.
    BISPO DOS SANTOS, A. A terra dá, a terra quer. São Paulo: Ubu Editora/PISEAGRAMA, 2023.
    DUFOURMANTELLE, A. Potências da suavidade. São Paulo: n-1, 2022.
    KRENAK, A. Ideias para adiar o fim do mundo. 1. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2019. v. 1
    MBEMBE, A. Políticas da Inimizade. Portugal: Antígona, 2017.
    SOLOMON, S. Cinema’s Natures: Comparative Approaches to Ecocinema. Comparative Cinema, v. 11, n. 20, p. 6–9, 21 nov. 2023.