Trabalhos aprovados 2025

Ficha do Proponente

Proponente

    Maria Eduarda Lino Sande Santosouza (UFPE)

Minicurrículo

    Maria Eduarda Lino é graduanda em Cinema e Audiovisual na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Bolsista do CNPq, desenvolve pesquisa sobre espaços e paisagens no cinema, sob orientação da Prof.ª Dr.ª Angela Prysthon, no âmbito da sua pesquisa “Antes do fim do mundo, aquém e além da paisagem: corpos, espaços e natureza no cinema e nas artes visuais”. É vice-presidente do Diretório Acadêmico do curso e integrante do Projeto de Extensão “Cineclube XHY-247”.

Ficha do Trabalho

Título

    Objetos que perfuram: O Punctum Barthesiano nos objetos das casas do cinema de Muylaert

Eixo Temático

    ET 4 – HISTÓRIA E POLÍTICA NO CINEMA E AUDIOVISUAL DAS AMÉRICAS LATINAS E DOS BRASIS

Resumo

    A pesquisa investiga como o conceito de punctum, de Roland Barthes, transposto da fotografia para o cinema, se manifesta nos objetos das paisagens domésticas em três filmes de Anna Muylaert: Durval Discos (2002), Que Horas Ela Volta? (2015) e Mãe Só Há Uma (2016). Entendendo a casa como mediadora entre o indivíduo e o mundo, os objetos assumem densidade dramática e sensível, sendo essenciais para a construção estética e atmosfera fílmica.

Resumo expandido

    Essa pesquisa se propõe a investigar como o conceito de “punctum”, elaborado por Roland Barthes em “A Câmara Clara” (1980), transposto da fotografia para o cinema, manifesta-se através dos objetos das paisagens domésticas em três filmes da diretora brasileira Anna Muylaert: Durval Discos (2002), Que Horas Ela Volta? (2015) e Mãe Só Há Uma (2016). Nos três filmes, os personagens se encontram em ambiente de confinamento, distintos entre si. Privados da liberdade de circulação e presos ao espaço da casa, que além de revelar a relação dos sujeitos com o mundo, potencializa a carga expressiva dos objetos ali presentes criando a atmosfera e estética fílmica.
    Barthes define o punctum como “esse acaso que, [na foto], me punge (mas também me mortifica, me fere)” (BARTHES, 1980), um detalhe aparentemente banal que salta da imagem e atinge o indivíduo de forma sensível. Transpondo essa noção para o cinema, parte-se da reflexão proposta por Gilles Deleuze em “A Imagem-Movimento” (1983) e “A Imagem-Tempo” (1985), pensando a partir daí a mudança de linguagem: da fotografia para o cinema.
    A casa e, com ela, seus objetos cotidianos são mediadores entre os personagens e o mundo exterior, como sugere Coccia:
    “somos vidas que necessitam manipular e modificar tudo aquilo que está ao nosso redor para sermos felizes: não nos basta conhecer o mundo e respeitar as regras de conduta interior. […] ‘Casa’ é apenas o nome para esse conjunto de técnicas de adequação entre o si mesmo e o planeta, uma dobra cósmica que faz coincidir, por um momento, psique e matéria, alma e mundo.” (COCCIA, Emanuele. A Filosofia da Casa, 2021).
    Nesses filmes de Muylaert, a casa atua como um ambiente de confinamento – ora de forma explícita, como em “Durval Discos”, quando a mãe de Durval os tranca em casa para impedir que a menina Kiki volte para sua família; ora de forma velada, no caso de Val (Que Horas Ela Volta?), confinada durante a semana na casa dos patrões, em que a diferença entre os objetos de seu quarto e o restante da casa revela questões sociais e culturais; e no caso de Pierre (Mãe Só Há Uma), confinado na casa dos pais biológicos em uma casa que não escolheu e não se sente confortável, mas não pode sair — em todos esses contextos, o espaço da casa e os objetos ganham densidade dramática e sensível.
    Dessa forma, o estudo busca olhar para esses objetos como pontos de ruptura sensível dentro da mise-en-scène, funcionando como punctum no cinema de Muylaert. Objetos que, à primeira vista banais, assumem um papel fundamental na construção estética e na atmosfera dos filmes, trazendo à tona camadas sociais, temporais e culturais sobrepostas e atravessando tanto os personagens quanto o espectador.

Bibliografia

    BARTHES, Roland. A câmara clara: nota sobre a fotografia. Trad. Júlio Castañon Guimarães. – [edição especial] – Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2015.
    COCCIA, Emanuele. A filosofia da casa: o espaço doméstico e a felicidade. Trad. Maurício Mendonça Cardozo. São Paulo: Ubu, 2021.
    DELEUZE, Gilles. A imagem-movimento: cinema 1. Trad. Stella Senra. São Paulo: Editora 34, 2018 (1ª edição).
    DELEUZE, Gilles. A imagem-tempo: cinema 2. Trad. Eloisa Araújo Ribeiro. São Paulo: Editora 34, 2018 (1ª edição).
    MERLEAU-PONTY, Maurice. O visível e o invisível. Trad. Paulo Neves. São Paulo: Perspectiva, 2014 (4ª edição – 5ª reimpressão).
    ALLOA, Emmanuel (Org.). Pensar a imagem. Tradução de Carla Rodrigues, Marianna Poyares, Alice Serra e Fernando Fragozo. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2015.