Trabalhos aprovados 2025

Ficha do Proponente

Proponente

    Débora Regina Opolski (IFPR)

Minicurrículo

    Débora Opolski é doutora em Comunicação e Linguagens, com a tese “A fragmentação da performance vocal do personagem no cinema a partir da perspectiva da edição de diálogos”. Integra o grupo de pesquisa Cinecriare – Cinema: Criação e Reflexão. Autora dos livros “Introdução ao desenho de som” (2013, UFPB) e “Edição de diálogos no cinema” (2021, UFPR). Professora do curso técnico em Produção de áudio e vídeo do IFPR e da Pós-graduação em cinema e artes do vídeo (PPG-CINEAV), da UNESPAR.

Ficha do Trabalho

Título

    A criação sonora dos filmes A mesma parte de um homem e O sol das mariposas

Seminário

    Histórias e tecnologias do som no audiovisual

Resumo

    Esta comunicação apresenta uma análise da criação sonora dos filmes A mesma parte de um homem (Ana Johann, 2021) e O sol das mariposas (Fábio Allon, 2024). Utilizando como abordagem metodológica a crítica de processos (SALLES, 2004) pretendemos discutir como estes filmes, ambos paranaenses, utilizam os sons de foley e de ambientes como mediadores entre os seres humanos e não humanos, entre os lugares e as relações que se estabelecem nesses lugares, na produção audiovisual.

Resumo expandido

    As trilhas sonoras dos filmes A mesma parte de um homem (Ana Johann, 2021) e O sol das mariposas (Fábio Allon, 2024) possibilitam pensar os sons como mediadores entre os seres humanos e não humanos, entre os lugares e as relações que se estabelecem nesses lugares. Os sons destes filmes materializam o lugar, produzem e rememoram sentidos e afetos. Porém, não o fazem por conterem características singulares, mas sim, por apresentarem características comuns, compartilhadas e cotidianas em essência.
    Utilizando uma abordagem de análise de processo de criação artística (SALLES, 2004), abordaremos os sons ambientes (backgrounds) e os sons produzidos pelos personagens (Foley) para apresentar uma reflexão sobre a relação entre a trilha sonora e a narrativa, ao indicar de que modo as sonoridades materializam os acontecimentos, estabelecem as relações e criam as realidades dos personagens nos espaços. Pesquisadores como Galetto (2021) e Carreiro (2024), afirmam que os sons ambientes são determinantes para constituir o espaço geográfico e manter a verossimilhança da diegese. Porém, considerando os personagens como agentes ativos no espaço, também é possível e interessante, durante o processo de criação, estabelecer relações entre os sons ambientes e os personagens.
    No caso de A mesma parte de um homem, o ambiente é opressor e as sonoridades do campo aumentam a tensão que permeia as relações. Renata tem uma relação de simbiose com um pássaro, que sonoramente se destaca em duas cenas emblemáticas para a narrativa. Já os sons de Foley materializam a brutalidade das ações. Quase todo o filme se passa em uma casa na área rural. Logo os sons que acompanham as pessoas, os objetos manipulados e os movimentos são sonoramente característicos desses lugares e do modo como elas interagem com os mesmos. As louças não são refinadas. São grosseiras e bastante desgastadas pelo uso. Os passos e movimentos são “duros” ou bruscos, comuns em cotidianos de trabalhos braçais. É nesse universo sonoro que o personagem Lui, o estranho, passa a viver, quando chega na casa, na segunda parte da narrativa. Porém, seu andar, seus gestos e movimentos são suaves e delicados. Lui é um estranho nesse contexto, e o som cria a narrativa.
    Em O sol das Mariposas também temos uma narrativa dividida em duas grandes partes. Da mesma forma que no filme anterior, os sons de Foley são “duros” e bruscos, gerando uma aspereza para as relações. Mas, apesar do contexto de dificuldade da lida no campo, as sonoridades de grilos, pássaros e cigarras (as mesmas do filme anterior), não são opressoras. Pelo contrário, evocam uma atmosfera bucólica e contemplativa, criando uma conexão sensorial com o ambiente rural. Na primeira parte da história, a presença dos sons ambientes reforça a ideia de que a vida naquele local é boa e de que o ambiente é acolhedor, apesar da luta diária para gerar dinheiro no sítio. Na segunda parte da narrativa, contudo, com o retorno do proprietário do sítio – marido de Marta – impondo sua vontade por meio da violência e do uso da força, os sons ambientes naturais são gradualmente substituídos por sons sintetizados, desprovidos de vitalidade e essência. Esse deslocamento sonoro reflete a transformação do espaço, que deixa de ser um ambiente confortável.
    Nestes filmes, o Foley e os sons ambientes moldam as relações e constituem o lugar. Ambos criam sentidos e movem os afetos das relações entre os personagens e os espaços de forma narrativa. Nesse sentido, queremos demonstrar que os filmes A mesma parte de um homem e O sol das mariposas são resultado de um processo de criação artística sonora que propulsiona a narrativa na medida em que os sons se tornam agentes, movimentando e materializando as ações e as relações dos personagens na diegese e no espaço.

Bibliografia

    A MESMA PARTE DE UM HOMEM. Direção: Ana Johann. Produção: Grafo Audiovisual, 2021. 98 min.

    CARREIRO, Rodrigo (org.). O som do filme: uma introdução. 2 ed. e rev. Curitiba: Editora UFPR, 2024.

    CARREIRO, Rodrigo, OPOLSKI, Débora, MEIRELLES, Rodrigo. A imersão sonora no cinema. São José dos Pinhais: Estronho, 2023.

    GALETTO, Ulisses. O sentido do som: uma introdução à pós-produção de som para audiovisual. Curitiba: Appris, 2021.

    O SOL DAS MARIPOSAS. Direção: Fábio Allon. Produção: Processo Multiartes, 2024. 90 min.

    SALLES, Cecília Almeida. Gesto Inacabado: Processo de criação artística. 2ª Ed. FAPESP:
    Annablume, São Paulo, 2004.

    SALLES, Cecília Almeida. Redes da criação: construção da obra de arte. Vinhedo: Editora
    Horizonte, 2006.