Ficha do Proponente
Proponente
- MONTEZ JOSE OLIVEIRA NETO (UFPE)
Minicurrículo
- Graduando em Cinema e Audiovisual pela Universidade Federal de Pernambuco; Bolsista de Iniciação Científica do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), sob orientação da professora Catarina Amorim de Oliveira Andrade; Editor-Chefe da Revista Nostalgia; Membro da Equipe de Curadoria e Programação do Festival Internacional Janela de Cinema do Recife.
Ficha do Trabalho
Título
- As Telenovelas Brasileiras e o Engajamento Melodramático
Eixo Temático
- ET 2 – INTERMIDIALIDADES, TECNOLOGIAS E MATERIALIDADES FÍLMICAS E EPISTÊMICAS DO AUDIOVISUAL
Resumo
- Este trabalho pretende entender como o melodrama, historicamente ligado à simplificação moral (Brooks, 1995), provoca forte engajamento emocional dentro de redes sociais como o Twitter/X. Partindo das telenovelas brasileiras, através de uma pesquisa bibliográfica de teóricos como Brooks (1995), Singer (2011), Williams (1991) e análise de exemplos, objetiva-se observar como essa estrutura intensificou a polarização moral, se adaptando ao digital e reforçando dinâmicas de controle social.
Resumo expandido
- Historicamente, o melodrama está associado a um período que Peter Brooks (1995) categorizou como uma era pós-sagrada, isto é, caracterizada por uma profunda desconstrução das certezas tradicionais (Brooks, 1995, p. 15). Embora o cientificismo oferecesse a promessa de ordem e felicidade, os desejos e os impulsos da coletividade começaram a buscar suas próprias formas de realização. A partir desse desejo, fica patente que o melodrama desperta uma espécie de agitação social, entregando ao espectador alguém (ou algo) para se amar ou odiar, construindo um processo de validação moral. Através do maniqueísmo e sua consequente simplificação do mundo, com o embate entre virtude e vício, o melodrama prevê “[…] uma pedagogia do certo e do errado que não exige uma explicação racional do mundo” (Xavier, 2003, p. 91, grifo do autor). Em outros termos, processos sociais complexos eram simplificados a fim de gerar certo engajamento corporal – isto é, emocional – em seu público.
Essa reação do corpo está diretamente associada a uma das principais características do melodrama: o pathos. Linda Williams (1991, p. 4) adjetivava essa característica como “avassaladora”, isto é, que teria uma forte tendência à emoção como êxtase para o espectador. Aristóteles, por sua vez, definiu o pathos como “[…] uma espécie de dor diante de um mal evidente de natureza destrutiva ou dolorosa no caso de alguém que não merece, sendo esse mal algo que poderíamos imaginar acontecendo conosco” (Singer, 2011, p. 44). Em outros termos, a ideia aristotélica está associada à reação corpórea e ao poder de construir identificação. Esse envolvimento se tornou essencial para a perenidade do melodrama. Na América Latina, o Brasil se tornou um destaque com a produção massiva das telenovelas, com suas características mais conhecidas: a polaridade moral, o exagero cênico, o uso de trilha sonora e a articulação emocional com o público.
Essas características tomaram uma nova forma com o advento das redes sociais, mais precisamente o Twitter/X. O primeiro grande fenômeno da rede foi Avenida Brasil (2012), escrita por João Emanuel Carneiro. As redes sociais, como mencionam Bertoletti e Camargo (2016), constroem uma nova forma de sociedade, em que o principal foco é provocar um processo de engajamento, isto é, fazer com que o sujeito passe uma considerável quantidade de horas conectado à plataforma. Para tanto, os assuntos relevantes são fundamentais para se construir as relações, como é o caso das novelas comentadas durante a exibição do capítulo. Ainda que as telenovelas brasileiras estejam se afastando de um maniqueísmo — a própria supramencionada Avenida Brasil é um exemplo disso — um olhar sobre o comportamento da própria sociedade ainda é base para discussões. O espaço cibernético, por sua vez, tomado por uma política neoliberal, onde a própria ideia de simplificação do mundo se torna patente, potencializa as discussões de cunho moral que são fomentadas pelas telenovelas.
O que se pode entender, observando as interações e a produção de memes, é que o engajamento provocado pelo melodrama clássico, isto é, as reações corporais, encontra sua extensão nas redes sociais, parafraseando Marshall McLuhan (2012). De forma geral, a ideia de melodrama como produto engajador está presente na própria forma com a qual as redes sociais possibilitaram a reorganização social. Em outros termos, os debates sociais das telenovelas são absorvidos pelas redes, que absorvem e intensificam sua lógica maniqueísta, reforçando a simplificação da moralidade. Se, no melodrama clássico, a distinção entre vilões e mocinhos já operava como um dispositivo emocional, nas redes sociais essa lógica se torna ainda mais rígida. A moralidade maniqueísta, longe de ser apenas um artifício narrativo, torna-se um princípio estruturante da interação digital. O que se vê, portanto, é a instrumentalização do melodrama como ferramenta de controle e conformidade dentro da lógica neoliberal das redes.
Bibliografia
- BERTOLETTI, A.; CAMARGO, P. O ensino das artes visuais na era das tecnologias digitais. Curitiba, PR: Intersaberes, 2016.
BROOKS, Peter. The melodramatic imagination. New Haven/ London: Yale University Press, 1995.
MCLUHAN, Marshall. Os meios de comunicação como extensão do homem. São Paulo: Editora Cultrix, 2012.
SINGER, Ben. Meanings of Melodrama. In: ___. Melodrama and Modernity. New York: Columbia University Press, 2011, p. 37-58.
WILLIAMS, Linda (1991). Film Bodies: Gender, Genre and Excess. Disponível em: . Acesso em: 21 mar. 2025.
XAVIER, Ismail. O olhar e a cena: melodrama, Hollywood, Cinema Novo, Nelson Rodrigues. São Paulo, Cosac e Naify, 2003.