Trabalhos aprovados 2025

Ficha do Proponente

Proponente

    Renan Paiva Chaves (UNICAMP)

Minicurrículo

    Renan Chaves é professor da Graduação em Midialogia e do Programa de Pós-Graduação em Multimeios do Instituto de Artes da Unicamp. Dedica-se à pesquisa do som e música no cinema e audiovisual. Atua como técnico de som direto e editor de som.

Ficha do Trabalho

Título

    Novas materialidades e estéticas sonoro-musicais do documentário

Seminário

    Histórias e tecnologias do som no audiovisual

Resumo

    Tendo no horizonte a produção documentária contemporânea e os novos desafios que ela traz no âmbito da teoria do som no audiovisual, pretendo compartilhar os primeiros avanços da minha pesquisa atual, sobretudo nos seguintes eixos: (1) novas morfologias sonoras, (2) sonoridades emergentes de novas estruturas urbanas e tecnologias mediadoras em contextos de desastres antropocênicos, (3) sonoridades pós-humanas em perspectivas apocalípticas, (4) novas dimensões do realismo sonoro na era digital.

Resumo expandido

    A era da “reprodutibilidade técnica” benjaminiana, que ainda não entrou no seu segundo centenário, se imbricou, há pelo menos duas décadas, à era do teletransporte técnico – na qual as barreiras espaço-temporais se diluem em favor de um transporte e manipulação acelerados e das materialidade. Aspectos que abriram um leque de possibilidades vasto em relação à criação e fruição artística. É também nessas últimas décadas digitalizadas que os impactos da humanidade no equilíbrio e manutenção do planeta Terra começaram a ser massivamente sentidos. Antropoceno, capitaloceno, plantationoceno, chthuluceno e, de forma geral, o pós-humano são conceitos que abordam esses impactos a partir de diferentes pressupostos.
    Localizado na intersecção desses dois aspectos gerais – erupção do teletransporte técnico e a urgência da conceitualização e discussão sobre o equilíbrio e manutenção do planeta Terra – é que pretendo pesquisar os novos tipos de materialidade sonoro-musical que têm aparecido em obras audiovisuais contemporâneas, especialmente no âmbito do documentário. É o início dessa pesquisa, com seus pressupostos teóricos e exemplos fílmicos, que gostaria de compartilhar no ST “Histórias e tecnologias do som no audiovisual” da Socine.
    Documentários como Leviathan: the fishing life (Castaing-Taylor, 2012), Mountain Fire Personnel (Tyson, 2015), Homo Sapiens (Geyrhalter, 2016), Communion Los Angeles (Levine, 2018) são alguns dos muitos exemplos representativos que abordo para exemplificar como novas construções sonoro-musicais têm nos lançado para fora dos paradigmas do século XX, tanto no âmbito da realização quanto nos aspectos perceptivos e teóricos, ao passo que nos convidam a fruir o mundo sob pressupostos estéticos renovados, mais ligados à fugaz contemporaneidade.
    O som dessas obras desafiam os principais modelos balizadores das teorias do som no audiovisual do século XX. Entre eles, os fundamentais (que estão na base dos principais desenvolvimentos teóricos da área há pelo menos 40 anos) são os ligados (1) à noção de soundscape e à abordagem estética da cultura, dos códigos e dos sistemas ecológicos de Murray Schafer (1969; 1977) e (2) à noção de objeto sonoro da abordagem fenomenológica de Pierre Schaeffer (1966). Reapropriar e renovar essas teorias se torna fundamental para se estabelecer uma dimensão histórica das mudanças estético-mundanas – algo que, sim, tem ocorrido, mesmo que modestamente, especialmente a partir de desdobramentos teóricos do amplo campo dos estudos do som; mas que, salvo exceções (como as pesquisas, por exemplo, de Shilyh Warren [2018], Adam Diller [2020], Holly Rogers [2021]), não dialogam com profundidade com o campo do audiovisual, e, especialmente, do documentário.
    Os quatros exemplos fílmicos supracitados – já debatidos, em certa medida, na literatura interncional – apontam para os principais eixos que desejo seguir na pesquisa. Um deles diz respeito a expandir a noção de morfologia sonora a novos aspectos qualitativos de captação e manipulação contemporâneos – como no caso de Leviathan, em que o aspecto cinético (e à deriva) do aparato de captação se torna elemento estruturante da sonoridade. Outro deles diz respeito a compreender sonoridades que surgem de novas estruturas arquitetônicas e urbanas junto a novas tecnologias mediadoras frente a intempéries e desastres antropocênicos – como no caso de Mountain Fire Personnel. Outro eixo diz respeito à investigação de sonoridades ligadas ao pós-humano, seja em perspectivas mais apocalípticas do antropoceno, seja na exploração de ecossistemas e objetos não-humanoides em construções utópicas ou distópicas – como Homo Sapiens. O outro eixo diz respeito à compreensão das dimensões que a noção de realismo adquiriu no mundo digital, naquilo que podemos chamar de era do teletransporte técnico, em que as noções espaço-temporais se remodelaram – como se pode fruir em Communion Los Angeles.

Bibliografia

    BORN, Georgina. On nonhuman sound – sound as relation. In: STEINTRAGER, James; CHOW,
    Rey. Sound Objects. Durham: Duke University Press, 2019.
    COX, Cristoph. Sonic flux: sound, art, and metaphysics. Chicago: The University of Chicago Press, 2018.
    DILLER, Adam. More-than-human sonic engagements in documentary film and phonography.
    Studies in Documentary Film. v. 15, n. 3, p. 238-55, 2021.
    HARAWAY, Donna. Anthropocene, Capitalocene, Plantationocene, Chthulucene: Making Kin. Environmental Humanities, v. 6, n. 1, p. 159-165, 2015.
    SCHAEFFER, Pierre. Treatise on musical objects: an essay across disciplines. Tradução:
    Christine North e John Dack. California: UC Press, 2017 [1966].
    SCHAFER, Murray. The Soundscape: Our Sonic Environment and the Tuning of the World. New York:
    Alfred A. Knopf, 1977.
    THOMPSON, Marie. Whiteness and the Ontological Turn in Sound Studies. Parallax, v. 23, n. 3,
    p. 266-282, 2017.
    WRIGHT, Mark. Post-Natural Sound Arts. Journal of Sonic Studies, n. 14, 2017.