Ficha do Proponente
Proponente
- Carolina Amaral de Aguiar (USP)
Minicurrículo
- Carolina Amaral de Aguiar é professora do Instituto de Relações Internacionais da USP (IRI-USP) e pesquisadora visitante da Université Paris Saclay. Doutora em História Social e mestre em Estética e História da Arte pela USP. É autora de artigos e capítulos publicados em vários países, além de ter publicado o livro O cinema latino-americano de Chris Marker (Alameda, 2016).
Ficha do Trabalho
Título
- Um golpe em imagens: produção e circulação de arquivos no 11 de setembro chileno
Seminário
- Arquivo e contra-arquivo: práticas, métodos e análises de imagens
Resumo
- Esta comunicação analisa arquivos icônicos do 11 de setembro chileno, feitos sob repressão. As imagens do golpe, ligadas a um hyper-recording, circularam nas televisões estrangeiras e em documentários militantes. Recentemente, surgiram “novos arquivos”, com a descoberta de imagens que não circularam na época, como as filmagens de Juan Ángel Torti e parte das fotografias de Evandro Teixeira. Pretende-se refletir sobre a construção do arquivo em 1973 as possíveis contribuições das novas imagens.
Resumo expandido
- A comoção mundial gerada pelo golpe de Estado chileno (Compagnon; Moine, 2015) é atribuída, entre outros fatores, às imagens documentais sobre o acontecimento. Registros do 11 de setembro e de seus dias subsequentes, feitos muitas vezes de forma clandestina, passaram a ocupar as redes de televisão estrangeiras, jornais e revistas de todo o mundo, colaborando para a articulação de uma ampla rede de solidariedade às vítimas da ditadura. Nesta comunicação, refletimos sobre o contexto de produção de algumas dessas imagens enquanto arquivo, situando-as no espaço e tempo em que foram feitas, bem como a estudar os sentidos que adquiriram em sua circulação.
Como coloca Rodolphe Olcèse (2021), analisando o cinema documentário e a prática do arquivo, imagem e acontecimento se tornam indissociáveis. Ou seja, o acontecimento não é apenas tema da imagem e não permanece exterior ao arquivo, mas está entrelaçado aos registros dele realizado. Dessa forma, no caso das imagens do 11 de setembro, pode-se pensar que elas produzem, de alguma forma, o próprio evento. No caso das imagens do Chile, realizadas em meio à repressão, contra-arquivo e arquivo se cruzam: a maior parte delas foram feitas por correspondentes estrangeiros ou funcionários de órgãos oficiais; porém, em seu ofício, procuraram captar aquilo que estava cerceado pelos militares, recorrendo a estratégias subversivas e clandestinas para informar em meio à repressão. Também a forma de sair do país e os circuitos pelos quais se difundiram foram diversas, e envolveram tanto a mídia tradicional estrangeira como o esforço de agentes e coletivos clandestinos.
A fotografia desempenhou um papel fundamental, como mostram os exemplos do trabalho dos fotógrafos argentinos Horacio Villalobos e Domingo Politi; dos holandeses Chas Gerretsen e Koen Wessing; do estadunidense David Burnett. Já no cinema, filmaram o acontecimento e suas consequências Peter Hellmich (enviado ao Chile pelo estúdio da Alemanha Oriental coordenado por Walter Heynowski e Gerhard Scheumann) e o chileno Pedro Chaskel. A combinação dos dois registros audiovisuais mais icônicos desse dia, tal como feita em A batalha do Chile (Patricio Guzmán, 1975, 1976 e 1979), tornou-se a sequência por excelência do bombardeio do Palácio de La Moneda. Por sua vez, as fotos tiradas no país foram tomadas frequentemente pelo cinema documentário como os arquivos mais representativos desse dia, e circularam em filmes políticos realizados em vários países, como Compatriotas (1973) e Más fuerte que el fuego (1978), ambos de Walter Heynowski y Gerhard Scheumann da Alemanha Oriental ; El tigre saltó y mató, pero morirá… morirá… (1973) e a edição do Noticiero ICAIC Latinoamericano intitulada La hora de los cerdos (1973), do cubano Santiago Álvarez; e Chili (1974), dos franceses Paul Bourron e Pierre Camus. Nesse sentido, a comunicação pretende analisar algumas das imagens que se converteram em ícone. Como advertem Ana María Mauad e Mauricio Lissovsky (2021), essa característica é dada pela capacidade de dramatizar o conflito.
Outra questão que a comunicação pretende estudar diz respeito aos “novos arquivos” do golpe, que emergiram em um contexto mais recente. Elizabeth Ramírez Soto (2018) adverte que, ao contrário de outros eventos históricos, o golpe de Estado chileno foi resultado de hyper-recording, sendo registrado e difundido por meio de imagens. No entanto, nas últimas décadas, imagens desse evento que não tiveram circulação na época vêm sendo localizadas e expostas. É o caso das sequências audiovisuais feitas em 11, 12 e 13 de setembro de 1973 por Juan Ángel Torti em 16mm ou da maior parte das fotografias de Evandro Teixeira que estiveram presentes na exposição Chile 1973, organizada pelo Instituto Moreira Salles em 2023. O que essas imagens aportam sobre o acontecimento? Como dialogam com as imagens-ícones presentes na memória coletiva sobre o 11 de setembro? Esses são alguns dos questionamentos propostos por esta comunicação.
Bibliografia
- Barros, César. “Declassifying the Archive: The Bombardment of La Moneda Palace and the Political Economy of the Image”. In: Bush, Matthew; Gentic, Tania (ed.). Technology, Literature, and Digital Culture in Latin America: Mediatized Sensibilities in a Globalized Era, New York, Routledge, 2016.
Compagnon, Olivier; Moine, Caroline Moine. “Pour une histoire globale du 11 septembre 1973”. Monde(s), n. 8, 2015. Disponível em: https://www.cairn.info/revue-mondes-2015-2-page-9.htm. Acesso em: 27 mar. 2025.
Olcèse, Rodolphe. Le surgissement des archives. Saint-Étienne ; Presses universitaires de Saint-Étienne, 2021.
Ramírez Soto, Elizabeth. “La cámara que tiembla: sobre el bombardeo al Palacio de La Moneda y algunas imágenes que nos mueven”. Savoirs en prisme, n. 9, 2018. Disponível em: https://savoirsenprisme.univ-reims.fr/index.php/sep/article/view/204/240. Acesso em: 27 mar. 2025.