Ficha do Proponente
Proponente
- André Zanarotti Adabo (UFSCar)
Minicurrículo
- Bacharel em Imagem e Som pela Universidade Federal de São Carlos – UFSCar. Atuou como assistente de produção no filme Urubu-Rei (dir. Tainá Lima, 2018), como produtor e roteirista do filme Imagem Perfeita (dir. Gabriella Joris, 2023). Foi bolsista Iniciação Científica pelo CNPq com o projeto “A imaginação melodramática no filme O Amor Natural: análise do pacto de intimidade como dispositivo documental” sob a orientação da professora doutora Flávia Cesarino Costa.
Ficha do Trabalho
Título
- Moradia e refúgio, corações em exílio: estratégias melodramáticas em Era o Hotel Cambridge
Eixo Temático
- ET 1 – CINEMA, CORPO E SEUS ATRAVESSAMENTOS ESTÉTICOS E POLÍTICOS
Resumo
- Pretende-se analisar nesta pesquisa os mecanismos estéticos e narrativos através dos quais Era o Hotel Cambridge (dir. Eliane Caffé, 2016) articula intimidade e justiça na construção da memória da ocupação do Hotel Cambridge em São Paulo. O presente estudo se propõe a interpretar o texto fílmico pelo viés do modo melodramático, levando em consideração as particularidades do docudrama como um subgênero cinematográfico e seu diálogo com materiais documentais incluídos na montagem do filme.
Resumo expandido
- O presente projeto pretende analisar a que medida o modo melodramático informa a estruturação e estética narrativa do docudrama Era o Hotel Cambridge, que narra a história ficcionalizada da ocupação de um prédio no centro da cidade de São Paulo na semana que antecede a execução de uma ordem de despejo contra seus ocupantes. A obra, que é composta pela mescla de ficção com registros documentais e entrevistas com os habitantes da ocupação, se concentra em quase sua integridade no interior do prédio e, em particular, na vida doméstica de seus militantes sem-teto e pessoas em situação de refúgio.
É de interesse notar que a inclusão da narrativa nas paixões e injustiças vividas por seus personagens é articulada abertamente no argumento central do filme em defesa do direito à moradia digna e acessível como um direito humano, o que sinaliza o estabelecimento de um diálogo com o texto de Linda Williams sobre o modo melodramático em “Tales of Sound and Fury…” or the Elephant of Melodrama (2018), no qual a autora defende a leitura do melodrama como um modo narrativo que, em sua essência, almeja o alcance de uma justiça melhor.
Para além disso, a inclusão e exploração de temáticas relacionadas à geopolítica internacional, na forma de personagens em situação de refúgio, permite também estabelecer um diálogo com o livro Global Melodrama: Nation, Body and History in Contemporary Film (2015) de Carla Marcantonio, no qual a autora explora a relação entre nação, melodrama e corpo frente a um cenário de globalização, no qual o fluxo de informações, produtos e pessoas tende a borrar as fronteiras simbólicas entre países e suas culturas.
Evidentemente, os dois textos mencionados acima dialogam entre si no sentido que o trabalho do melodrama na construção de um imaginário de uma nação necessariamente explora questões de justiça tanto em um sentindo puramente moral quanto jurídico. Portanto, avaliar o filme Era o Hotel Cambridge como corpus à luz desses textos exige compreender como esse filme explora a sensibilidade melodramática das injustiças que permeiam a existência de suas pessoas sem-teto e/ou refugiadas, no sentido da construção e questionamento do imaginário do Brasil como nação. Para tal, a presente análise se sustenta principalmente nas asserções de Ismail Xavier quanto as alegorias nacionais no cinema brasileiro em Alegorias do subdesenvolvimento: cinema novo, tropicalismo, cinema marginal (2013).
Faz-se necessário reforçar que a obra analisada toma a forma que Fernão Pessoa Ramos define como “docudrama” em Mas Afinal… O Que é Mesmo o Documentário? (2008), tratando-se de uma narrativa decididamente ficcional que alude ao mundo real, sem necessariamente fazer asserções sobre sua compreensão histórica. Para o autor, o documentário pode ser definido amplamente como filmes que fazem asserções sobre o mundo real através de imagens-câmera e estratégias narrativas indexadas socialmente como apropriadas a este gênero cinematográfico como a locução em voz-over e a entrevista.
Sendo assim a presente análise utiliza a expressão “imaginação documental”, proposta por Mariana Baltar em seu livro Realidade Lacrimosa: O Melodramático no Documentário Brasileiro Contemporâneo (2019) para se referir a rede de conotações e expectativas que circundam o conceito de documentário. Para a autora, o documentário carrega consigo a noção do documento como prova científica da investigação histórica e antropológica, imputando ao modo narrativo a necessidade de se ater, mesmo que de maneira simbólica, à legitimação dos fatos por ele apresentados. Tendo essas definições por base, pode-se identificar a presença de dois modos narrativos cinematográficos distintos em Era o Hotel Cambridge que estabelecem uma relação dialética que informa a leitura do filme como um todo.
Bibliografia
- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BALTAR, Mariana. Realidade Lacrimosa: o Melodramático no Documentário Brasileiro Contemporâneo. Niterói: Editora Eduff, 2019.
BROOKS, Peter. The Melodramatic Imagination Balzac, Henry James, Melodrama and the Mode of Excess. New Haven: Yale University Press, 1995. (Edição original: 1976)
MARCANTONIO, Carla. Global Melodrama: Nation, Body, and History In Contemporary Film. Nova Iorque: Palmgrave Macmillan New York, 2015.
NICHOLS, Bill. Introdução ao documentário. Campinas: Papirus Editora, 2005.
RAMOS, Fernão Pessoa. Mas Afinal… o Que É Mesmo o Documentário?. São Paulo: Editora Senac, 2008.
WILLIAMS, Linda. “Tales of Sound and Fury…” or The Elephant of Melodrama. In GLEDHILL & WILLIAMS (eds.) Melodrama Unbound. Nova Iorque: Columbia University Press, 2018.
XAVIER, Ismail. Alegorias do subdesenvolvimento: cinema novo, tropicalismo, cinema marginal. São Paulo: Cosac Naify, 2013
REFERÊNCIA CINEMATOGRÁFICA
Era o Hotel Cambridge (Eliane Caffé, 2016)