Ficha do Proponente
Proponente
- Rodrigo Campos Castello Branco (Filmuni)
Minicurrículo
- Rodrigo Campos Castello Branco é bacharel em Cinema pela PUC-RJ e está concluindo seu mestrado no programa Filmkulturerbe (Patrimônio Audiovisual) na Filmuniversität Babelsberg KONRAD WOLF, em Potsdam Alemanha.
Ficha do Trabalho
Título
- Um barão alemão na Amazônia: cem anos de “Urwelt im Urwald” (1925)
Mesa
- Amazonas: filmes culturais e o extrativismo visual alemão
Resumo
- Há cem anos, estreava em Berlim “Urwelt im Urwald” (Mundo Primitivo na Selva, 1925), documentário sobre a fauna amazônica dirigido pelo Barão Adolf von Dungern. O filme foi sucesso de crítica e referência para obras futuras, mas hoje está perdido. Esta comunicação visa recontar sua história de produção, reconstruir sua narrativa, analisar sua recepção e discutir sua visão eurocêntrica da Amazônia, resgatando um capítulo esquecido do cinema transnacional entre Brasil e Alemanha.
Resumo expandido
- Há exatos cem anos, em outubro de 1925, estreava em Berlim, Alemanha o filme “Urwelt im Urwald” (Mundo Primitivo na Selva), um longa-metragem que documentou parte da fauna da Amazônia. O filme foi fruto de uma expedição feita entre junho de 1924 e março de 1925, financiada pela Ufa e liderada pelo Barão Adolf von Dungern (1870-1939), que também assina a direção do filme. O filme foi sucesso absoluto de público e crítica, considerado um dos melhores filmes do gênero à época do seu lançamento. Infelizmente, o filme é hoje considerado perdido, restando apenas 6 minutos que sobreviveram da sua versão original. Urwelt im Urwald entrou em esquecimento dentro da própria historiografia cinematográfica alemã, além de ser desconhecido no Brasil. Portanto, o objetivo dessa comunicação é de resgatar a história de produção do filme, reconstruir a sua narrativa e examinar como foi sua recepção.
O Barão von Dungern se consagrou como um exímio diretor de filmes de animais no início da década de 1920, enquanto chefe do departamento científico da Decla-Bioscop (Stutterheim 2005). A série “Natureza em Filme” produziu entre 1920 e 1923 mais de trinta curtas-metragens sobre animais nativos europeus, obtendo sucesso graças a um bom equilíbrio entre conteúdo educativo e entretenimento (Dungern 1923).
Chancelado pelo seu renome e a incorporação da Decla pela Ufa, Dungern chega ao Brasil em junho de 1924 com uma equipe para filmar “artística e cientificamente” os animais da Amazônia. A expedição inclui o diretor de fotografia August Brückner e dois biólogos, incluindo Otto Bertram, que havia trabalhado no zoológico do Museu Goeldi, em Belém, entre 1909 e 1914.
A equipe se estabelece em uma casa em Belém, onde permanece até o início de 1925. A partir de Belém, fazem expedições diárias à floresta para filmar e capturar animais. Além disso, realizam viagens mais longas à Ilha do Marajó e a Santarém (Heye 1929; Dungern 1931; Rangnow 1938). Para se locomover entre as cidades e a floresta, dependem de guias locais e do apoio de uma rede germânica local. Ao fim da expedição, além dos metros de película com imagens da Amazônia, transportam mais de cem animais vivos (doados ao zoológico de Berlim), outros cem já mortos (doados ao Museu de História Natural de Berlim) e aproximadamente 10 mil borboletas (espalhadas por coleções privadas e o museu).
A partir de sua cartela de censura, é possível reconstruir “Urwelt im Urwald”, que tinha originalmente 80 minutos, dividido em sete episódios. O filme varia entre representações idílicas e romantizadas da natureza e cenas de violência em que pesa a máxima da “sobrevivência do mais apto”, corroborando visões colonialistas e eurocêntricas sobre esse suposto mundo desconhecido e “primitivo” (Waz 2005; Nagl 2009).
“Urwelt im Urwald” permanece em cartaz por dois meses consecutivos e é aclamado como uma obra-prima. Os críticos destacam seu valor cultural e sua abordagem naturalista e criativa na representação dos animais, contrastando com os já saturados filmes de caçada (Mendel 1925; Nagl 2009). Conta o fato de que a fauna e flora da Amazônia eram sub-representadas no cinema alemão em comparação com os animais da savana africana, dando ao filme de Dungern um caráter entre o ineditismo e o exótico. O impacto do filme é tão significativo que ele se torna referência para a avaliação de produções posteriores ambientadas na Amazônia.
A reconstrução de “Urwelt im Urwald” resgata um capítulo esquecido do cinema de caráter transnacional da relação Brasil-Alemanha. Mais do que um documentário sobre a Amazônia, o filme inaugura uma rede de cineastas alemães que nos anos seguintes seguirão explorando e registrando a região; revela como a Amazônia foi representada sob uma ótica alemã no início do século XX; e escancara uma interseção da lógica colonial entre a apropriação de imagens e a captura de animais.
Bibliografia
- DUNGERN, Adolf von; BONSELS, Waldemar. Brasilianische Tage und Nächte. Hobbing, 1931.
DUNGERN, Adolf von. Natur im Film. In: ZEHDER, Hugo (org.). Der Film von Morgen. Dresden: Rudolf Kaemmerer Verlag, 1923.
HEYE, Artur. Filmjagd auf Kolibris und Faultiere. Nach brasilianischen Tagebuchblättern eines Kurbelmannes. Berlin: Safari-Verlag, 1929.
NAGL, Tobias. Die unheimliche Maschine: Rasse und Repräsentation im Weimarer Kino. München: edition Text + Kritik, 2009.
RANGNOW, Rudolf. Tropenpracht und Urwaldnacht – Auf Tierfang im Amazonas. Braunschweig: Gustav Wenzel & Sohn, 1938.
STUTTERHEIM, Kerstin. Gezüchtet und geopfert. Der Tier- und Naturfilm. In: KREIMEIER, Klaus (org.). Geschichte des dokumentarischen Films in Deutschland. Band 2. Reclam, 2005.
WAZ, Gerlinde. Heia Safari! Träume von einer verlorenen Welt. Expeditions-, Kolonial- und ethnographische Filme. In: KREIMEIER, Klaus (org.). Geschichte des dokumentarischen Films in Deutschland. Band 2. Stuttgart: Reclam, 2005.