Ficha do Proponente
Proponente
- GIOVANNA SIGWALT DE OLIVEIRA PEZZO (UFSCar)
Minicurrículo
- Mestranda no Programa de Pós-graduação em Imagem e Som/UFSCar, com pesquisa voltada ao cinema Latino Americano contemporâneo. Estudou cinema, com ênfase em Direção de fotografia, na EICTV/Cuba, em San Antonio de los Baños. Participa dos grupos de pesquisa ‘Cinemídia’ e ‘Cinema e Audiovisual na América Latina: Economia e Estética’.
Tem experiência como diretora de fotografia e recebeu prêmios de Melhor fotografia nos festivais de cinema de Gramado, Guarnicê, Inhapin e BRNO (Rep. Tcheca)
Ficha do Trabalho
Título
- Alegoria e realismo mágico como estratégias discursivas, no cinema Latinoa-americano contemporâneo
Seminário
- Cinema e audiovisual na América Latina: novas perspectivas epistêmicas, estéticas e geopolíticas
Resumo
- Esta pesquisa busca investigar como o dispositivo narrativo da alegoria e o gênero do realismo mágico se manifestam no cinema latino-americano contemporâneo, a partir da análise dos filmes A febre, de Maya Da-Rin, e La teta asustada, de Claudia Llosa. Sob a ótica comparativa, observar como articulam tais estratégias discursivas, na forma e no conteúdo dos filmes, ao jogar luz sobre histórias de herdeiros de povos originários e refletirem sobre a complexidade dessa condição na sociedade.
Resumo expandido
- Diante do variado espectro que engloba o cinema latino-americano contemporâneo, nossa atenção se volta para duas obras cinematográficas de diretoras mulheres, que apresentam características narrativas e estéticas comuns: A febre (2019), de Maya Da-Rin, e La teta asustada (2009), de Claudia Llosa. O objetivo desta pesquisa é analisar como os filmes tecem uma reflexão sobre seu contexto sociopolítico, ao optarem pelo uso de estratégias narrativas, como alegoria e realismo mágico, para representar personagens indígenas.
Nestas obras ressoam ecos dos movimentos cinematográficos dos anos 1960, que buscavam, no ato de fazer filmes, pensar a América Latina, momento em que o cinema político aflorou preocupado com grandes diagnósticos e destinos coletivos. (XAVIER, 1997) Proponho, então, investigar como, num contexto contemporâneo, ambos filmes remodelam um imaginário latinoamericano anticolonial e de subdesenvolvimento, lançando mão de estratégias que articulam o cinema narrativo clássico e recursos discursivos como alegoria e realismo fantástico, aliados à situação e memória dos povos originários representados.
Pela ótica apresentada por Ismail Xavier, proponho investigar de que maneira tecem reflexões sobre a complexidade da situação sociopolítica dos povos originários, consequentemente, de seus países, por meio da alegoria. Contudo, ao atualizar o debate para uma leitura contemporânea e decolonial, o conceito ganha outras camadas de complexidade. É preciso considerar nos filmes que a situação das personagens indígenas se contrapõe a uma ideia de Nação, de uma “comunidade imaginada” estabelecida por Benedict Anderson, (XAVIER, 1997) que foi explorada pelos movimentos cinematográficos latino-americanos contra o imperialismo nas décadas pós-Segunda Guerra. A ideia de Nação como constructo unificador, se deteriora frente a uma sociedade desigual e opressiva, que leva à inviabilização das diferenças étnicas, culturais e de gênero, em prol de uma integração. Portanto, o que se considera uma ameaça não é mais um fator estrangeiro.
Neste percurso, a ideia de alegoria está associada ao passado e à memória. Os filmes têm como centro de sua ação dramática personagens que determinam suas trajetórias e modelam suas identidades em relação ao próprio passado, com a memória da violência vivida por seus povos, que se manifestam pelas gerações. Podemos considerar que as personagens têm suas trajetórias determinadas pelo peso das histórias que carregam.
Uma estratégia para encarar os fatos é recorrer a um imaginário, cuja compreensão escapa ao entendimento lógico branco. Neste sentido, a narrativa se compõe atrelada ao gênero do realismo mágico. Nele, “se reconhece como efetivamente latino-americano a presença de um certo elemento que envolve, ao mesmo tempo, os mitos ameríndios, mas também o folclore e a cultura oral popular, alimentada por lendas, superstições e crendices”. (SHAW in MELLO, 2021. pg 53).
A escolha por protagonistas de origem indígena oferece a perspectiva de integrar a sociedade em um lugar de subalternidade e revela como tal condição está atrelada a um deslocamento e inadequação. Ou seja, as trajetórias das personagens estão permeadas por sua identidade cultural. As realizadoras recorrem também a algum tipo de “deslocamento” para apresentar os conflitos, seja por meio da alegoria ou do realismo fantástico. Tais escolhas podem ser observadas na chave do ‘olhar branco’ sobre o outro, indígena, e está associado a um incômodo refletido na forma e conteúdo dos filmes. Isso posto, nos sedimenta um pilar que estrutura a análise fílmica, na medida em que tenciona também questões de raça e classe.
A escolha das obras se justifica por uma leitura que conecte as escolhas estéticas ao caráter político do contexto em que são realizadas e do universo que representam. Ambos filmes trazem à tona reflexões sobre identidade, direitos de populações originárias e questões de gênero, assuntos que seguem em debate e aprofundamento.
Bibliografia
- ANDERSON, Benedict. Nação e consciência nacional. Editora Ática, 1989.
GOMES, Paulo Emílio Sales. Cinema: trajetória no subdesenvolvimento.São Paulo: Paz e Terra, 1996.
JAMESON, Frederic. On Magic realism in film. Critical Inquiry, n.12, 1986. The University of Chicago
MELLO, Marcelo Cordeiro. Realismo Mágico e cinema de terceiro mundo no projeto cinematográfico não-filmado de A hora dos ruminantes. Revista Sures. v. 1 n. 16 (2021): p.51-64.
RIEGA, María Claudia Gutierrez. Cine, Mujer u postmemoria: identidad y posmemoria en la Teta Asustada y Paraíso. Universidad de Lima. Lima, 2018.
TODOROV, Tzvetan. Introdução à literatura fantástica. São Paulo: Perspectiva, 1992.
XAVIER, Ismail. A personagem feminina como alegoria nacional no cinema latino-americano. In Balalaica: Revista Brasileira de cinema e cultura. São Paulo, v. 1, p. 84-101, 1997.
XAVIER, Ismail. Alegorias do subdesenvolvimento: cinema novo, tropicalismoe cinema marginal. São Paulo: Cosac Naify, 2012.