Ficha do Proponente
Proponente
- Isabela Coura (UFSJ)
Minicurrículo
- Formada em pedagogia pela Universidade Federal de São João del Rei e, atualmente, mestranda no Programa de Educação pela mesma Universidade. Além disso, atua na co-coordenação do Programa de Extensão Educação, Cinema com os territórios, realizando oficinas e cineclubes.
Ficha do Trabalho
Título
- Zonas de Cinema para as Infâncias: Uma Cartografia Mineira
Eixo Temático
- ET 5 – ETAPAS DE CRIAÇÃO E PROCESSOS FORMATIVOS EM CINEMA E AUDIOVISUAL
Resumo
- O texto apresenta uma cartografia das ressonâncias pedagógicas em três eventos de cinema em Minas Gerais: o cineclube itinerante Cine na Montanha, a Mostra para Crianças e Adolescentes (Recria Cine) e a Mostra Infantojuvenil Sertãozin. Em diálogo com Nego Bispo (2023), Langie (2021), Bergala (2008), Crary (2023) e Bey (2001), observa-se, inicialmente, que essas mostras provocam desvios nas experiências com o tempo, as pessoas, o território e as imagens, produzindo outras subjetividades.
Resumo expandido
- A proposta deste texto é apresentar os primeiros resultados de uma pesquisa de mestrado em andamento que investiga circuitos alternativos de cinema para as infâncias em Minas Gerais. Trata-se de uma cartografia que acompanha as ressonâncias pedagógicas dos encontros coletivos e vivos com o cinema em três eventos: o cineclube itinerante em Delfim Moreira, a Mostra para Crianças e Adolescentes (Recria Cine) em Ervália e a Mostra Infantojuvenil Sertãozin em Sagarana. Afinal, o que os encontros com o cinema proporcionam como experiência educativa, estética e política?
As andanças por esses territórios mobilizaram a pensar sobre as mostras de cinema como quintais que, em si, são territórios inventivos, espaços de transformação, multiplicadores de vida que resistem à lógica da monocultura, que, como tal, se estrutura para reduzir a diversidade. Na terra, como bem nos lembra Nego Bispo (2023), os alimentos são reduzidos a poucas variedades. O que é produzido artesanalmente, as pessoas não querem mais; querem aquilo que foi sintetizado, aquilo que foram influenciadas a desejar e a gostar. A monocultura excede a agricultura e se faz presente também nas próprias imagens, dado que a indústria cinematográfica hegemônica é quem dita o que nos é permitido ver e de que gostar.
As mostras atuam como uma alternativa frente a essa monocultura. Esses eventos produzem rachaduras em seus territórios para que as imagens-sementes, que estão soterradas pela hegemonia das grandes produções, possam ter um momento de respiro, possam divagar entre olhares. Operam, como defende Cíntia Langie (2021), como “circuitos de vazamentos”, já que são espaços alternativos de difusão movidos por outra ordem que não a do capital. Desse modo, possibilitam um encontro, desde a infância, dos moradores dessas cidades rurais e interioranas com o cinema. Para Bergala (2008), o encontro da criança com o cinema durante essa fase da vida é de outra intensidade: “[…] é como se as impressões produzidas nos primeiros anos pelo cinema deixassem uma marca inesquecível na memória afetiva pessoal” (p. 43). Assim como a experiência vivida em um quintal fica dentro da gente a vida toda, quem sabe, a experiência em uma mostra de cinema também.
Além disso, as exibições públicas emergem como uma alternativa para resgatar a experiência de estar junto, uma experiência que vem sendo cada vez mais rara na sociedade. O autor do livro, Terra Arrasada (2023), Jonathan Crary destaca que “o encontro é simplesmente uma pré-condição inescapável para a manutenção da conectividade humana” (p. 113) que, por proporcionar uma presença com o outro, se torna uma abertura possível para uma “relação viva e mútua em um mundo estilhaçado” (p. 113). O cinema nesses espaços, extrapola a exibição fílmica, produz uma abertura para o encontro face a face, instaura um modo de estar junto que vem sendo abandonado pelas redes digitais.
Contudo, essas mostras são sazonais, têm um fim. Diante disso, qual seria, então, a força desse circuito alternativo de cinema? Qual a potência das mostras de cinema que têm prazo para acabar? Hakim Bey, em seu livro Zonas Autônomas Temporárias – TAZ (2001), direciona nosso olhar para acontecimentos na história que não planejavam uma permanência na sociedade; ao contrário, previam seu encerramento. Para Bey, isso não implica dizer que esses acontecimentos fracassam, pois, nesse curto período de existência, algo “[…] mudou, trocas e integrações ocorreram — foi feita uma diferença, […] tais momentos de intensidade moldam e dão sentido a toda uma vida.” (p. 05)
Portanto, compreendemos as mostras como uma TAZ que durante o momento que existiram engendraram desvios para a produção de subjetividades, aprendizagens e experiências com o tempo, com as pessoas, com o território e com as imagens que são de outra ordem: da coletividade, da partilha, do sensível, da nossa formação estética, ética e política no mundo.
Bibliografia
- BEY, Hakim. TAZ – Zona Autônoma Temporária. Tradução: Patrícia Decia e Renato Resende. São Paulo: Conrad Editora do Brasil, 2001. (Coleção Baderna)
BERGALA, Alain. A hipótese-cinema. Pequeno tratado de transmissão do cinema dentro e fora da escola. Tradução: Mônica Costa Netto, Silvia Pimenta. Rio de Janeiro: Booklink – CINEAD-LISE-FE/UFRJ, 2008.
BISPO DOS SANTOS, Antônio. A terra dá, a terra quer. São Paulo: Ubu Editora; Piseagrama, 2023.
CRARY, J. Terra Arrasada: além da era digital, rumo a um mundo pós-capitalista. São Paulo: Ubu Editora, 2023.
LANGIE, Cíntia. Cinema brasileiro e distribuição educativa: uma cartografia dos cinemas localizados em universidades públicas. Rio de Janeiro: Editora Multifoco, 2023.