Ficha do Proponente
Proponente
- Bruno Carboni Gödecke (PUCRS)
Minicurrículo
- Bruno Carboni é mestre e doutorando em Comunicação Social pela PUCRS, onde desenvolve atualmente a pesquisa intitulada “O papel do julgamento intuitivo no processo criativo da montagem cinematográfica”. Na prática da produção audiovisual, exerceu a função de montador em séries, curtas e longas-metragens, tendo trabalhos exibidos em festivais como Cannes, Berlim e Locarno. Como diretor e roteirista, estreou em 2023 o longa-metragem “O Acidente”
Ficha do Trabalho
Título
- Encontrando o ritmo: uma definição compreendida entre a teoria e a prática da montagem
Seminário
- Edição e Montagem audiovisual: reflexões, articulações e experiências entre telas e além das telas
Resumo
- Este trabalho propõe elaborar uma definição do conceito de “ritmo” na montagem cinematográfica através de uma articulação entre prática e teoria. Para isso, primeiro buscará identificar, em entrevistas de montadores, os sentidos recorrentes do termo entre os pares. Em seguida, colocará estes sentidos em diálogo com formulações teóricas de Jean Mitry, Hans Gumbrecht e Karen Pearlman. O objetivo é propor uma base conceitual que some e esclareça a relevância comunicacional do termo para a área.
Resumo expandido
- O termo “ritmo” está presente no vocabulário dos montadores cinematográficos, frequentemente invocado como uma qualidade a ser construída ou descoberta ao longo do processo criativo. No entanto, os sentidos atribuídos a esse termo variam amplamente na prática e muitas vezes contrastam com as abordagens teóricas da área. Embora frequentemente comparado à acepção do termo na música ou dança, a compreensão do ritmo no cinema apresenta complexidades próprias, derivadas da combinação com o visual das imagens e de sua dependência da organização temporal na montagem.
Este trabalho propõe articular uma definição de ritmo que integre formulações teóricas às percepções práticas dos cineastas e montadores. Para isso, parte-se da análise dos depoimentos reunidos na obra Na Ilha: Conversas sobre montagem cinematográfica, em que montadores brasileiros relatam sua experiência na área. A partir desses relatos, onde o termo aparece 16 vezes em 11 dos 26 depoimentos, identificam-se três usos recorrentes do termo: (1) o ritmo percebido na imagem, vinculado aos movimentos internos do plano e à mise-en-scène; (2) a construção do ritmo nas sequências, associada à alternância de tensões e relaxamentos ao longo da montagem; e (3) o ritmo do filme como um todo, que se refere à sensação de coesão na experiência fílmica.
Além disso, nota-se que a utilização do termo pode estar tanto vinculada a uma montagem rápida e dinâmica quanto apropriada por cineastas que trabalham com tempos dilatados e contemplativos. A insistência no uso do termo por montadores de diferentes tradições e estilos demonstra então sua relevância comunicacional, funcionando como um conceito que expressa sensações subjetivas.
Essas concepções da prática são colocadas em diálogo com autores que discutem o tema sob diferentes perspectivas teóricas. Jacques Aumont e Jean Mitry analisam historicamente o uso do termo no cinema, destacando a necessidade de diferenciá-lo do ritmo musical, pois sua percepção está profundamente ligada à significação das imagens e à construção narrativa. Hans Ulrich Gumbrecht oferece uma abordagem mais ampla — não necessariamente vinculada ao cinema —, compreendendo o ritmo como a tentativa de conferir forma a um fenômeno temporal. Demonstrando também que a recorrência, memorização e sincronização são características vinculadas ao conceito. Já Karen Pearlman investiga como a percepção do ritmo se dá de maneira intuitiva e física na prática da montagem, apoiando-se em conceitos da neurociência e da cognição.
A partir da apresentação das abordagens teóricas, este trabalho revisita os três usos citados do termo “ritmo” na prática da montagem, para compreender como essas teorias complementam os relatos. Com isso, defende-se que, embora o termo seja frequentemente utilizado para descrever aspectos internos dos planos e de sequências de montagem, sua formulação mais coerente está relacionada a uma impressão qualitativa e subjetiva da experiência do filme como um todo. Dessa forma, o ritmo é melhor referido não como um fenômeno isolado em determinadas cenas, mas como uma construção que emerge da coerência e recorrência entre os elementos visuais, temporais e narrativos ao longo de toda a obra.
Ao integrar percepções práticas com abordagens teóricas, este trabalho propõe uma definição em que o ritmo pode ser compreendido como uma impressão subjetiva resultante da sincronização da atenção do observador com construcão narrativa e sginificação obtida através da forma temporal das imagens observadas. Tal definição busca levar em consideração tanto os elementos intelectuais, quantos os elementos de corporeidade e sensorialidade que são evocados no uso histórico do termo, validando sua relevância comunicacional e permanência no vocabulário dos montadores.
Bibliografia
- AUMONT, Jacques; MARIE, Michel. Dicionário teórico e crítico de cinema. Campinas, SP: Papirus, 2003.
ATHERTON, Claire. In: BACQUÉ, Bertrand; LIPPI, Lucrezia; MARGEL, Serge; ZUCHUAT, Olivier. Montage: Une anthologie (1913-20218). Genebra: Mamco, 2018.
BERNSTEIN, Julia et al. Na Ilha: Conversas sobre montagem cinematográfica. 1.ed. São Paulo: Paraquedas, 2022.
GUMBRECHT, Hans Ulrich. Graciosidade e Estagnação: ensaios escolhidos. Rio de Janeiro: Ed. PUC- Rio , 2012.
GUMBRECHT, H. U. Ritmo e significado. Terra Roxa e Outras Terras. V. 43, n. 1, p. 117-128, 2023.
MITRY, Jean. Dictionnaire du cinéma. Paris: Larousse, 1963a.
MITRY, Jean. Esthétique et Psychologie du Cinéma: I. Les structures. Paris: Éditions Universitaires, 1963b.
PEARLMAN, Karen. Cutting Rhythms: Shaping the film edit. 2.ed. Burlington, MA: Focal Press, 2016.