Ficha do Proponente
Proponente
- Victor Adriano Ramos (UFBA)
Minicurrículo
- Roteirista e pesquisador audiovisual, mestre em Cinema e Narrativas Sociais (UFS) e doutorando em Comunicação e Cultura Contemporânea (UFBA). Tem interesse de pesquisa em televisão brasileira, observando a presença de profissionais negros na realização de narrativas seriadas (telenovelas e séries). Desenvolve atualmente pesquisa sobre a relação de profissionais negros nas telenovelas Vai na fé e Amor perfeito, observando a construção de aspectos relacionados a modelos de representação.
Ficha do Trabalho
Título
- Processo de criação da série Encantados: a construção de um universo audiovisual negro na televisão
Seminário
- (Re)existências negras e africanas no audiovisual: epistemes, fabulações e experiências
Resumo
- A série Encantados, produção da Globoplay, apresenta um panorama inédito em relação à presença negra em narrativas seriadas. Criada por uma dupla de roteiristas negras e com maioria de elenco e profissionais negros envolvidos, a série representa o momento atual que o Grupo Globo se apresenta em sua busca por aproximação das pautas raciais. Nosso objetivo é analisar a construção temática dessa obra usando a metodologia proposta por Pierre Bourdieu, compreendendo a função dos agentes envolvidos.
Resumo expandido
- A concretização de uma obra audiovisual é um trabalho que envolve diversos agentes, desde aqueles responsáveis pelo setor criativo (roteiristas, diretores, produtores), até aqueles que aprovam o projeto, que escalam o elenco, que gerenciam a obra, entre outros profissionais. No Brasil a comercialização em grande escala de obras protagonizadas e produzidas por profissionais negros retratando suas vivências raciais é mínimo, como informa os estudos da Agência Nacional do Cinema (ANCINE) e do Grupo de Estudo Multidiciplinar de Ação Afirmativa (GEMAA) sobre a participação de negras e negros no mercado de trabalho audiovisual comercial.
Porém, temos observado nos últimos anos o aumento no interesse do Grupo Globo em produções consideradas representativas, principalmente após a instauração do departamento de inovação e diversidade em 2021, departamento responsável entre outras coisas, pela inserção de profissionais negros em equipes criativas. O Grupo Globo é o maior produtor de narrativas seriadas, assim como um dos maiores propagadores dos estereótipos raciais em suas produções ao longo dos anos, como apontam Araujo (2019), Moreira (2020), Oliveira (2016), Ramos (2022), entre outros.
Nos chama atenção que após a implementação do departamento algumas medidas passaram a ser efetuadas, fazendo com que obras como a série Encantados pudessem ser levadas ao ar no streaming Globoplay e na rede aberta, o canal Globo. A série chama atenção por alguns fatores, é criada por roteiristas negras, a dupla Renata Andrade e Thaís Pontes, com elenco majoritariamente negro e profissionais negros envolvidos em todas as etapas de produção. O resultado é uma série que desafia os estereótipos comumente apresentados no audiovisual brasileiro, onde personagens negras vivem as mais diversas situações, ampliando o imaginário social em relação à presença da população negra, principalmente as pessoas que vivem no subúrbio carioca.
O principal objetivo desse estudo é compreender as posições dos principais agentes envolvidos na elaboração da série Encantados, para isso usamos a metodologia de Pierre Bourdieu, atento aos conceitos de campo, capital e trajetória (Bourdieu, 1992). A investigação busca relacionar todos os agentes, desde a equipe criativa que trabalha diretamente na produção da série, até os agentes situados no Grupo Globo em diferentes departamentos. Não nos interessa somente o pioneirismo da obra, mas os meandros que levaram a sua realização nesse momento histórico em que empresas de comunicação buscaram uma aproximação com temáticas sociais (CALDWELL, 2014). Ainda que o cenário internacional não se mostra mais tão favorável como na última década, a Rede Globo continua mantendo o interesse de expansão da contratação de profissionais negros, como informa o relatório ESG 2023.
Nossos objetivos secundários visam estabelecer a relação que a empresa, a partir de seus agentes, determina como diretrizes, nos parâmetros apresentados por Baxandal (2006), aos seus autores em relação à temática racial. Para isso, usamos as compreensões narrativas propostas por Bordwell (2008) entendendo a obra como um meio que nos possibilita a investigação, já que a obra é o resultado de uma série de decisões, cabendo então ao pesquisador analisar os caminhos escolhidos pelos produtores.
Entendemos a série Encantados como uma obra pioneira, apresentando soluções em relação à representação negra em narrativas seriadas, estendendo a possibilidade de imaginários sociais em relação à representação da população negra. Além de ser uma obra de referência na emissora, se mostrando não apenas como uma possibilidade, mas um importante objeto que representa todas as ações da emissora em relação à inclusão e diversidade. Sabemos que essa aproximação é devido à necessidade da Globo manter e aprimorar seu capital simbólico, nosso interesse é compreender as estratégias usadas para tal tendo como objeto a série Encantados.
Bibliografia
- ARAÚJO, Joel Zito. A negação do Brasil: o negro na telenovela brasileira. São Paulo: Ed. Senac, 2019.
BAXANDALL, M. Padrões de Intenção. São Paulo: Editora Schwarcz, 2006.
BORDWELL, D. Figuras traçadas na luz: a encenação no cinema. Campinas: Papirus, 2008.
BOURDIEU, Pierre. Razões Práticas: Sobre a teoria da ação. Campinas, SP: Papirus Editora, 1996.
BOURDIEU, P. As Regras da Arte. São Paulo: Cia das Letras, 2002.
CAMPOS, Luiz Augusto; Feres Júnior, João. Televisão em cores? Raça e sexo nas telenovelas “Globais” dos últimos 30 anos. Textos para discussão GEMAA, n. 10, 2015, p. 1-23.
Moreira, Adilson. Racismo recreativo. Editora Jandaíra; 1ª edição, São Paulo: 2019.
OLIVEIRA, Laila Thaíse. A mulher negra na primeira pessoa: uma construção de raça e gênero nas telenovelas protagonizadas por Taís Araújo. Dissertação (Mestrado em Comunicação Social) Universidade Federal de Sergipe, 2016.
RAMOS, Victor Adriano. Tem negra nessa novela? Representação da mulher negra em lado a lado.