Trabalhos aprovados 2025

Ficha do Proponente

Proponente

    Gabriel Kitofi Tonelo (UFF)

Minicurrículo

    Gabriel K. Tonelo é técnico de som direto e editor de som para produtos audiovisuais. Atualmente, é professor substituto da área de Som no Departamento de Cinema e Vídeo da UFF e professor de Som da Academia Internacional de Cinema (AIC-SP). Com pós-doutoramento recente pela ECA-USP (2019-2023), foi pesquisador visitante na Harvard University (2015-2016) e na University of Chicago (2020-2021), tendo suas pesquisas fomentadas pela FAPESP desde 2010.

Ficha do Trabalho

Título

    Ressonâncias insulares: som direto, edição e mixagem em “Lista de Desejos para Superagüi”

Seminário

    Histórias e tecnologias do som no audiovisual

Resumo

    A apresentação evidencia como a cadeia produtiva do som audiovisual pode servir propósitos narrativos no documentário “Lista de Desejos para Superagüi” (Pedro Giongo, 2024). A partir de fontes primárias, apresentarei de que maneira som direto, edição e mixagem do som evidenciam uma identidade acústica particular da Ilha de Superagüi – entre falas, pautadas por uma prosódia específica de seus habitantes, e a fusão de sons naturais de uma geografia sonoramente heterodoxa.

Resumo expandido

    A apresentação evidencia como a cadeia produtiva do som audiovisual pode servir a propósitos narrativos a partir de uma obra específica: “Lista de Desejos para Superagüi” (Pedro Giongo, 2024. Premiado na Mostra Aurora do Festival de Cinema de Tiradentes, o longa foi filmado na Ilha de Superagüi, localizada no norte do litoral paranaense. Tendo como um de seus focos narrativos o acompanhamento da vida de Martelo, um pescador de 70 anos que ainda não conseguiu se aposentar, o filme apresenta as necessidades e desafios enfrentados pelos moradores da região. Destaca também a cultura local, baseada na pesca artesanal e na relação dos habitantes com a geografia particular da Ilha.

    A reflexão sobre o som em “Superagüi” é fruto de fontes primárias de informação, a partir do contato com profissionais – como Guilherme Farkas e Bianca Martins –que fizeram parte de sua equipe. Esse trabalho é parte de uma série de entrevistas conduzidas por mim e por Renan P. Chaves (UNICAMP) com profissionais da área do som e que atuaram, entre produção e pós-produção, em filmes de destaque do cenário contemporâneo.

    Como veremos, o som desempenha papel fundamental na imersão (CARREIRO, 2023) do espectador na atmosfera de Superagüi. Trata-se de um objetivo que, como apresentarei, demonstrou coerência desde as etapas de produção às de pós-produção e finalização da obra. Em sintonia com reflexões recentes acerca do field recording e a representação do som ambiente de espaços específicos (como em FARKAS, 2023 e COSTA, 201) o trabalho em “Superagüi” objetivou imbuir o registro em “set” com a identidade acústica específica da Ilha. Trata-se de uma geografia marcada pelo relevo plano que apresenta poucas barreiras para a fusão de estruturas acusticamente heterogêneas entre si – como mar, rio e mangue.

    No caso do som direto, tal característica evidencia-se pelo uso exclusivo de microfones direcionais a partir do boom (sem o uso, portanto, de microfones em miniatura), provendo nas situações diálogo entre os habitantes da Ilha, maior dinamismo da relação entre fala e sons ambientes, bem como uma timbragem específica da prosódia dos habitantes. Ainda, o trabalho extensivo de gravação de ambientes sonoros da Ilha – em diferentes estratégias de estereofonia – serviu de maneira valiosa ao trabalho posterior de edição e mixagem, ainda na direção da representação acústica da geografia em questão.

    A reflexão sobre a impressão das sonoridades específicas da Ilha – sons humanos e não-humanos – estendeu-se no trabalho de edição e mixagem. Diante do contexto da edição de ambientes, enfatiza-se uma imagem estereofônica mais aberta dos canais esquerdo e direito, a fim de promover o senso de heterogeneidade dos sons naturais da ilha. O ato de abrir “espaço” no canal central teve como fim, ainda, a alocação de diálogos como meio de garantir destaque à prosódia específica dos habitantes da ilha.

    Evidenciaremos, ainda no contexto da edição de som, de que maneira os efeitos sonoros foram trabalhados na direção de complementar a trilha musical original – que já havia sido incorporada no momento da edição de imagens. Ainda, características presentes na trilha musical remetem a manifestações culturais próprias da Ilha. No caso, a utilização da trilha musical de um instrumento como a rabeca remete, de maneira musicalmente distinta, ao Fandango. Estabelece-se, assim, em uma das camadas sonoras do filme, um diálogo com seu foco narrativo – pautado na relação entre passado e presente em Superagüi, diante de diversas transformações.

    Apresentaremos, também, de que maneira o processo criativo-sonoro em “Lista de Desejos para Superagüi” reflete desafios comuns ao cinema brasileiro contemporâneo, especialmente no contexto de baixo orçamento. O fato da edição e finalização de som do filme ocorrer após a seleção do filme para um Festival ecoa a realidade de vários outros projetos independentes, nos quais o planejamento sonoro é comprimido em curtos espaços de tempo.

Bibliografia

    CARREIRO, Rodrigo. “Notas sobre o papel imersivo do som no cinema”. MATRIZes 17 (1), 2023. DOI: https://doi.org/10.11606/issn.1982-8160.v17i1p115-140.

    CHATTOPADHYAY, Budhaditya. “Reconstructing atmospheres: Ambient sound in film and media production”. Communication and the Public 2 (4), 2017.

    CHAVES, Renan Paiva. A formação do som do documentário: do cinema mudo ao afloramento do eu-realizador. Tese apresentada ao PPG-Multimeios da UNICAMP, 2022.

    COSTA, Fernando Morais da. “Pode o cinema contemporâneo representar o ambiente sonoro em que vivemos?” In: Logos, v.32, Rio de Janeiro: UERJ, 2010.
    FARKAS, Guilherme. Gravação de Campo e Construção de Som Ambiente no Cinema Contemporâneo: Descontextualizações e Transposições Sonoras. Dissertação apresentada ao PPGCine-UFF, 2023.

    Kitö, Meri. Soundscapes of Istanbul in Turkish Soundtracks. In The Oxford Handbook of New Audiovisual Aesthetics, 2013.

    SCHAFER, R. Murray. A Afinação do mundo. São Paulo, Editora UNESP, 2011.