Trabalhos aprovados 2025

Ficha do Proponente

Proponente

    Murilo de Castro (UNESPAR / FAP)

Minicurrículo

    Mestrando em Cinema e Artes do Vídeo (PPG-CINEAV – Unespar / FAP) — Linha de Pesquisa 1: Teorias e Discursos no Cinema e nas Artes do Vídeo; Bacharel em Relações Internacionais (UP); Membro do Grupo
    de Pesquisa Eikos (Unespar/PPG-CINEAV/CNPq); Sócio da Sociedade Brasileira de Estudos
    de Cinema e Audiovisual (SOCINE); Autor do livro “A Poética da Angústia: Ensaios sobre o Cinema de Gaspar Noé” (2025).

Ficha do Trabalho

Título

    VISÕES QUE SE EMBAÇAM, CORPOS QUE CHORAM: Poéticas da Morte no Cinema de Gaspar Noé

Eixo Temático

    ET 1 – CINEMA, CORPO E SEUS ATRAVESSAMENTOS ESTÉTICOS E POLÍTICOS

Resumo

    A presente pesquisa visa trazer um pouco de luz aos estudos sobre a morte e o luto no Cinema através de dois filmes do diretor argentino Gaspar Noé. Postos em análise, “Enter the Void” (2009) e “Vortex” (2021), a fim de analisar as representações dos tópicos anteriores (morte e luto) em extremos quase-opostos. Ao método, considera-se a análise fílmica de caráter Imanente, proposta por Ismail Xavier (2018), os estudos de narratologia de Machado (2007) e demais obras acerca do morrer.

Resumo expandido

    A morte e o luto sempre marcaram presença dentro do Cinema durante toda sua história. Antes mesmo do Primeiro Cinema, a fotografia já fazia o trabalho do registro mortuário. Através dos séculos, diversos sentidos foram atribuídos à morte. O historiador francês Philippe Ariès ressalta que durante o fim do XV e momentos do XVI, o erotismo foi atribuído ao destino comum, como se a morte beijasse o vivo como aviso ou como designo. Ao fim do XVI, a morte não o beija, mas o viola (Ariès, 2012). Assim, as artes são fontes vitais do exercício de transformar aquilo que está condenado em eterno. Sobre a relação arte-morte, o crítico francês e teórico, André Bazin, aponta: “Fixar artificialmente as aparências carnais do ser é salvá-lo da correnteza da duração: aprumá-lo para a vida” (Bazin, 2018, p. 26). Sendo assim, o Cinema presta o serviço-imortalizador de corpos, experiências e ideias.
    Tais corpos (estes que choram), performam a filmografia do argentino Gaspar Noé. Desde o seu primeiro filme, “Tintarella di Luna” (1985), a morte, de pronto, se faz presente. Os fios narrativos da condição e as tramas voltadas a ela se entrelaçam. Traçando um paralelo de quase-extremos encontramos “Enter the Void” (2009) e “Vortex” (2021), retratando a morte em momentos diametralmente opostos da vida. No primeiro, em uma juventude rebelde e selvagem. No segundo, em uma velhice monótona, agridoce e regada pelo esquecimento.
    Construída como evento, pelo afastamento do olhar cotidiano, a partir do século XX, a morte faz com que Ariès (2012) aponte detalhes sobre a morte natural, no ambiente residencial e no ambiente hospitalar. São exatamente nesses dois ambientes que as mortes de “Vortex” acontecem. O tabu construído em cima da morte, pelo afastamento da mesma com a lente do cotidiano físico, como aponta o sociólogo alemão Norbert Elias: “empurrada mais e mais para os bastidores da vida social” (Elias, 2001, p. 19), faz com que se crie, paradoxalmente, um fascínio e uma rejeição pelo momento mortuário. A morte, quando ocorrida em local de convívio público, se torna um evento. Relembrado com pesar por aqueles que se faziam presentes no momento do fato, e por vezes, incessantemente reforçado pela mídia local. O fim de Oscar, em “Enter the Void” é um exemplo disso. Assassinado a tiros pela polícia dentro do banheiro de um bar, sua morte causa frenesi no salão principal do estabelecimento, posteriormente interditando o local e sendo comentada pelos becos e ruas de Tóquio.
    Sobre o luto, Ariès chegou a alertar sobre o possível desaparecimento do mesmo nas sociedades modernas: “[…] só se tem direito a chorar quando ninguém vê nem escuta: o luto solitário e envergonhado é o único recurso” (Ariès, 2012, p. 87). Em Gaspar, o luto é tão rico quanto a morte. O luto de Murphy em “Love” (2015) talvez seja o mais intimista e próximo do apontamento de Ariès, uma vez que o personagem abdica das suas responsabilidades familiares, como pai e esposo, para viver a depressão frente à provável morte de sua ex-namorada. Dentro de “Enter the Void” e “Vortex”, suas representações são sutis, mas tão aterradoras quanto.
    Compreendendo o caráter formalista dos filmes do diretor, se mostra necessário considerar as ideias da Ubiquidade e do Olho Privado (e de seu Duplo), encontradas em “O sujeito na tela: Modos de enunciação no cinema e no ciberespaço” (2007), de Arlindo Machado. Ao método, se vê de bom grado a Análise Imanente, proposta por Ismail Xavier em “Análise fílmica em artigos científicos” (2018).
    Por fim, o trabalho tem o intuito de relembrar o Cinema do direito à morte, este que é inato ao corpo humano, ponderando que a morte “[…] é um aspecto particular do ser e não só do não-ser; é um certo algo e não um completo nada.” (Vigotski, 1999, p. 266). Ou seja, que a morte também é possuidora de um caráter positivo, mesmo que este seja desconhecido pela biologia.

Bibliografia

    ARIÈS, Philippe. História da Morte no Ocidente. Ed. especial. Rio de Janeiro: Nova
    Fronteira, 2012.

    BAZIN, André. Morte todas as tardes. In: XAVIER, Ismail (org.). A Experiência do Cinema. 1ª ed. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1983. cap. 1.5.2., p. 129 – 135.

    ENTER THE VOID. Direção: Gaspar Noé. 2009.

    ELIAS, Norbert. A solidão dos moribundos. 1ª ed. Rio de Janeiro: ZAHAR, 2001.

    MACHADO, Arlindo. O sujeito na tela: modos de enunciação no cinema e no ciberespaço. 1ª ed. São Paulo: 2007.

    VIGOTSKI, Lev S. O significado histórico da crise da Psicologia: uma investigação metodológica. In: VIGOTSKI, Lev S. Teoria e Método em Psicologia. 2ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 1999. p. 203 – 417.

    VORTEX. Direção: Gaspar Noé. 2021.

    XAVIER, Ismail. Análise fílmica em artigos científicos [Entrevista concedida a]. Revista Significação. São Paulo: Revista Significação. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=dQ2W87EUzjs. 2018.