Trabalhos aprovados 2025

Ficha do Proponente

Proponente

    Fábio de Carvalho Penido (UFMG)

Minicurrículo

    Fábio de Carvalho Penido é doutorando em Comunicação Social pelo PPG-COM/UFMG na linha de Pragmáticas da Imagem. Sua pesquisa está voltada para as intersecções entre o cinema marginal e o cinema independente contemporâneo. Também participa da programação do Cineclube Comum e escreve para a revista Multiplot!.

Ficha do Trabalho

Título

    O cinema marginal e o independente contemporâneo: distopia, abjeção e bandidagem libertina

Seminário

    Estudos Comparados de Cinema

Resumo

    O trabalho é um exercício comparativo entre filmes nacionais do cinema marginal (1968-70) e do independente contemporâneo (2018-2018) a partir do repertório visual que os dois grupos evocam, de abjeção e horror, e seus temas de distopias, bandidagem e libertinagem sexual. A lida comparativa busca analisar as semelhanças, diferenças e limites das formas do cinema brasileiro experimental em sua lida com as crises históricas.

Resumo expandido

    O cinema brasileiro realizado entre fins da década de 1960 e 1970 já recebeu diversas alcunhas. “De invenção” (FERREIRA, 1986), “dilacerado” (AVELLAR, 1986)” e “marginal” (RAMOS, 1987) são alguns dos termos propostos a partir dos agrupamentos dessa múltipla e dispersa produção na busca de alguma unidade ou alívio reflexivo. O espelhamento das angústias de um país pós-golpe militar, em período de ainda mais intensa perseguição política pós-AI-5, está latente nas obras. Os sinais, mesmo que hesitantes, de quaisquer utopias políticas outrora presentes nos filmes da primeira metade da década de 1960 dão espaço a visões devastadas, fragmentadas, do futuro da nação (XAVIER, 2012).
    O cinema brasileiro contemporâneo também produziu uma safra de filmes a partir dos anos de 2010 que busca uma lida direta com a chegada ao poder da extrema-direita. Antes mesmo da eleição do bolsonarismo à presidência, as obras já expressavam signos associados ao conservadorismo social extremado e sua guerra cultural (ROCHA, 2023). Essa ideologia carrega em si a herança da ditadura militar, com remanescentes de seu nacionalismo romântico, sua ênfase na família e religião como pilares sociais.
    Em dois momentos históricos distintos, o cinema brasileiro encontrou formas para filmar um país em crise. As semelhanças e diferenças entre esses caminhos, tantas que sejam, se cristalizam na recorrência de um repertório visual ligado ao “horror e abjeto” que para Ramos (1987) melhor caracterizam a estética do cinema marginal de 1968 até 1973, e que encontram diálogo com a produção da metade dos anos de 2010.
    O embate com os signos da ascensão da extrema-direita brasileira a partir dos anos de 2010 põe em cena a distopia, a bandidagem e a formação de coletivos sociais marginais como temáticas; o abjeto, o horror e a avacalhação como repertório visual de transgressões políticas em seus mundos ficcionais. A semântica dos filmes sugere o cinema marginal entre fins da década de 1960 e 1970 como um predecessor histórico, em especial nas suas apropriações do abjeto como forma de perturbação da ordem social. Teorizado por Julia Kristeva – base para a leitura de Ramos do cinema marginal -, o abjeto serve a contextos históricos e fins políticos distintos no cotejo entre essas obras e temporalidades.
    O presente trabalho propõe a comparação entre um corpus do presente e do passado: os curta-metragens do coletivo Anarca Filmes, X-Manas (2018), Waleska Molotov (2017), e do coletivo Chorumex, Os anos 3000 foram feitos de lixo (2017) e Tsunami Guanabara (2018); os longas Hitler Terceiro Mundo (José Agrippino de Paula, 1968), Orgia ou O Homem que deu cria (João Silvério Trevisan, 1970) e Jardim das Espumas (Luiz Rosemberg Filho, 1970). A comparação será conduzida pela análise de uma sequência de cada filme, como fragmento capaz de cristalizar diversas questões centrais de cada um e expandir o pensamento para o próximo.
    O fio condutor da análise das obras busca se ater às formas em que o corpo emerge no “lugar que aloja a experiência e se inscreve a história” como escreveu Xavier (2005) acerca do cinema marginal, espaço de conflito entre destino individual e coletivo. As obras, de diferentes formas, são inspiradas pelo afã de fazer do corpo o locus de experimentação diante dos impasses políticos dos seus presentes históricos. Isso traz aos filmes ora o desejo de inscrever o corpo em narrativas teleológicas, ora apresentá-lo como local por excelência da fragmentação, da impossibilidade da unidade subjetiva e social.
    E ainda, em uma postura mais interpelativa, o trabalho busca questionar o próprio conceito de abjeto e sua pertinência para caracterização dos filmes, tanto quando realizada por Ramos (1987) quanto agora para os filmes do cinema contemporâneo. O ponto de partida dessa inquietação se dá a partir das provocações realizadas por Butler (2003) e Krauss (1997) acerca dos limites da abjeção na arte e sua circunscrição, como repertório visual, em “vocabulário” limitado de

Bibliografia

    AVELLAR, José Carlos. O cinema dilacerado. Alhambra: Rio de Janeiro, 1986.
    BUTLER, Judith. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003.
    BOIS-ALAIN, Yve; KRAUSS, Rosalind F. Formless: a user’s guide. New York: Zone Books, 1997.
    FERREIRA, Jairo. Cinema de Invenção. Max Limonad: São Paulo, 1987.
    RAMOS, Fernão. Cinema Marginal (1968/1973): a representação em seu limite. Editora Brasiliense: São Paulo, 1987)
    ROCHA, João Cezar de Castro. Bolsonarismo: da guerra cultural ao terrorismo doméstico. Belo Horizonte: Autêntica, 2023.
    XAVIER, Ismail. O cinema marginal revisitado, ou o avesso dos anos 90. São Paulo: CCBB, 2004.
    XAVIER, Ismail. Alegorias do subdesenvolvimento: cinema novo, tropicalismo, cinema marginal. Cosac Naify: São Paulo, 2012.