Trabalhos aprovados 2025

Ficha do Proponente

Proponente

    Frederico Franco (UFRGS)

Minicurrículo

    Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais (PPGAV) da Universidade Federal do Rio Grande do Sol (UFRGS). Mestre em Cinema e Artes do Vídeo pela Universidade Estadual do Paraná (UNESPAR). Graduado em Realização Audiovisual pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS). Trabalha como crítico de cinema desde 2020. A atual pesquisa versa sobre as intersecções estéticas e teóricas entre o cinema experimental brasileiro e o campo das artes visuais ao longo dos anos 1960 e 1970.

Ficha do Trabalho

Título

    Para além dos famélicos: revisão crítica de Eztetyka da Fome (1965), de Glauber Rocha

Resumo

    A presente comunicação propõe uma revisão crítica do ensaio Eztetyka da Fome, de Glauber Rocha. A ideia central, aqui, é de tensionar o escrito glauberiano com textos oriundos de diferentes campos teóricos.
    Parte-se de referências contemporâneas ao ensaio e ligadas às artes visuais, como Frederico Morais e Décio Pignatari; passando por Teorias do Terceiro Mundo, através de Fanon e Robert Stam; e, finalmente, chega-se a debates atuais acerca da decolonialidade no contexto artístico.

Resumo expandido

    O final dos anos 1950 e início dos 1960 representou um momento de manifestações teóricas daquilo que veio a ser conhecido como terceiro mundo – sendo o primeiro mundo as potências capitalistas como Estados Unidos e Europa Ocidental e o segundo mundo o bloco socialista capitaneado pela União Soviética. A divisão do mundo em três classes foi, segundo Stam (2003), obra do francês Alfred Sauvy, fazendo referência aos três estados da França pós-revolução.. Ao longo das duas décadas citadas, diversos países subdesenvolvidos foram em busca de seu próprio terceiro-mundismo cinematográfico, em sua maioria com aportes teóricos. Na América Latina, por exemplo, Fernando Solanas e Julio Garcia Espinosa foram responsáveis pelo desenvolvimento de ensaios críticos voltados para a construção de um pensamento do Terceiro Mundo no cinema. As conquistas socialistas ao redor do globo, como a liberação do Vietnã dos franceses e a revolução cubana de 1959 servem como alicerce político-teórico para os cinemas do terceiro mundo: o cinema dos países subdesenvolvidos deveria, antes de tudo, ser um instrumento político, pleiteando um enfrentamento com a indústria cinematográfica hegemônica.

    Na onda de textos-manifestos sobre uma arte do terceiro mundo, surge o objeto de análise deste presente artigo. Escrito e publicado no ano de 1965, com uma ditadura militar já em curso no Brasil, Eztetyka da fome é um dos principais documentos teóricos do diretor baiano cinemanovista Glauber Rocha. O ponto de partida do texto glauberiano é tentar desenvolver um manifesto que aponte novas direções estéticas para o dito terceiro mundo. O ensaio, indo adiante, serve como uma maneira de compreender o papel da arte dentro do caos político-social vivido no país; a questão, aqui, é compreender como a arte brasileira pode apresentar contornos políticos capazes de exercer um papel de resistência perante o regime civil-militar. Além de discutir os rumos da arte brasileira dos anos 1960, o autor também tece uma crítica ao condicionamento do olhar do norte global no que diz respeito à produção artística. Dessa forma, Glauber (2021) propõe uma relação estética de ruptura em relação à arte do primeiro mundo, liberando, assim, o olhar terceiro-mundista da ideologia estética dominante.

    O principal objetivo deste trabalho é buscar uma maior compreensão de conceitos abordados por Glauber Rocha (2021), como subdesenvolvimento e fome. Esse movimento se dará por meio da conexão de Eztetyka da fome com outros referenciais teóricos, expandindo o texto glauberiano até outros campos, como a política e até mesmo às artes visuais. A principal ideia, aqui, é estabelecer tais conexões para não apenas compreender o ensaio em si, mas para visualizar como Eztetyka da fome se comporta ao ser tensionado com outras referências teóricas e artísticas.

    Serão três frentes teóricas a serem apresentadas: a primeira delas, comporta textos e referências, de certa forma, contemporâneas ao ensaio de Glauber, como escritos do crítico de arte Frederico Morais, do poeta Décio Pignatari e, mais adiante, do artista Ferreira Gullar. A segunda frente representa estudos referentes à teoria terceiro-mundista, a partir de Frantz Fanon e Robert Stam. Por fim, busca-se inspiração em ideias de escritos mais recentes, voltadas para o termo de arte decolonial. A disposição dos termos aqui levantados, no entanto, se dará a partir de uma mescla, não fragmentando o texto a partir do referencial teóricos – o texto será analisado de modo cronológico, portanto, as referências não apenas abrirão debate com o texto de Glauber como também irão se conectar entre si. Cabe, ainda, um detalhe acerca dos textos selecionados. Por mais que a ideia geral do artigo seja explorar o contexto de países subdesenvolvidos, alguns integrantes do quadro teórico são pertencentes ao norte global aqui muitas vezes criticado. Contudo, seus trabalhos serão fundamentais para realizar pontes conceituais com autores do dito terceiro mundo.

Bibliografia

    DIDI-HUBERMAN, Georges. A sobrevivência dos vagalumes. 1ª ed. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2011.
    FANON. Frantz. Os condenados da terra. 1ª ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1968.
    GULLAR, Ferreira. Vanguarda e subdesenvolvimento. 2ª ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978.
    MORAIS, Frederico. Artes plásticas: a crise da hora atual. 1ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1975.
    PIGNATARI, Décio. Teoria da guerrilha artística. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 4 de junho de 1967. Caderno Quatro.
    ROCHA, Glauber. Eztetyka da fome. Hambre espacio cine experimental, Argentina, 2021.
    SGANZERLA, Rogério. Por um cinema sem limites. 1ª ed. Rio de Janeiro: Azougue Editorial, 2001.
    SHOLETTE, Gregory. Matéria-oscura. 1ª ed. Cali: Archivos del Índice, 2015.
    STAM, Robert; SHOHAT, Elia. Crítica da imagem eurocêntrica: Multiculturalismo e representação. 1ª ed. São Paulo: Cosac Naify, 2006.
    STAM, Robert. Introdução à teoria do cinema. 1ª ed. Campinas: Papirus, 2003.