Trabalhos aprovados 2025

Ficha do Proponente

Proponente

    Victor Finkler Lachowski (PPGCOM-UFPR)

Minicurrículo

    Doutorando em Comunicação (PPGCOM-UFPR); Mestre em Comunicação (PPGCOM-UFPR); Bacharel em Publicidade Propaganda (UFPR). Integra o NEFICS – Núcleo de Estudos de Ficção Seriada e Audiovisualidades (PPGCOM-UFPR/CNPq). Sócio da Sociedade Brasileira de Estudos de Cinema e Audiovisual (SOCINE). Bolsista CAPES-DS. Escritor, Roteirista e Redator. Autor da coletânea de contos “O Insosso e o Insólito entre os Pinheirais”. Apresentador do Massacre Podcast, dedicado à cultura de horror.

Ficha do Trabalho

Título

    CRÍTICA MATERIALISTA DA GOETIA NO CINEMA INSÓLITO: demonologia e os desejos da carne

Resumo

    Este trabalho desenvolve uma crítica da Goetia no cinema de fantasia insólita pelos filmes Hereditary (2018) e A Dark Song (2016) a partir da filosofia da religião, com uma análise materialista do papel da religião na cultura humana, bem como da apropriação que o cinema faz do fenômeno religioso e vice-versa. São investigadas as funções articulatório-narrativas da Goetia nas obras com base na relação entre humano/cultural/social e mágico/divino/profano.

Resumo expandido

    Este estudo parte de uma análise filosófica da religião sobre como a Goetia é articulada dentro dos filmes de terror Hereditary (2018) e A Dark Song (2016). A filosofia da religião parte de métodos racionais e filosóficos e compreende o fenômeno religioso como um dado da cultura, tentativa do humano se conectar com o transcendente. O dado da cultura analisado no qual ocorre uma mescla de incontáveis possibilidades com a religião é o cinema.
    A Ars Goetia é uma sistematização estabelecida no século XVII, com a apropriação cultural de elementos, entidades e ritos presentes no judaísmo, e adaptando-os para uma classificação ocultista-mágica. A Goetia é historicamente relacionada ao surgimento do capitalismo e suas novas formas de produção, relações de produção e fenômenos, banqueiros, relações de troca e outras formas de compreender o dinheiro. Sendo um sistema para facilitar uma relação de conexão-troca na qual a ritualística realiza uma transferência (o ritualista pede algo para a Entidade, e a Entidade pede algo em troca).
    Para debater a relação entre cinema e religião/espiritualidade, são utilizados os resultados expostos por Almeida (2010) sobre a representação do Diabo no cinema ocidental e as exposições de Luiz Vadico (2012) sobre a complexidade das relações entre religião/cinema e cinema/religião; acrescentam-se autores debruçados no insólito e ns ritualística/ocultismo no cinema.
    Na crítica materialista da religião, Ludwig Feuerbach (2007) propõe que a consciência de Deus é a autoconsciência do homem; ou seja, a religião enquanto uma antropologia invertida acaba por revelar a essência do humano, seu interior revelado, e o humano não percebe que é criador destas representações por uma alienação no qual não se reconhece em sua obra.
    Marx (2010) reforça que o humano busca na realidade fantástica do céu algo sobrehumano, e ali só encontra um reflexo de si; a religião, enquanto criação humana, é a autoconsciência o autossentimento do humano que ainda não se encontrou ou se perdeu; e o mundo humano, com Estado, sociedade, produzem a religião, uma consciência invertida do mundo, para ser a teoria geral deste mundo, sua lógica formal popular de efetivação fantástica e consolo geral. Em Marx, o combate à religião não se dá diretamente contra ela, e sim contra o mundo que a produziu, suas condições econômico-políticas e sociais. A religião é, assim, a expressão da miséria geral do mundo, e, ao mesmo tempo, um protesto oprimido contra essa miséria: o ópio do povo (anestésico para lidar com a realidade contraditória e opressora).
    Freud (2011; 2019) aborda o fenômeno religioso como uma forma do indivíduo buscar a felicidade através de uma regra geral para essa realização pessoal, com a diminuição do mundo real por parte do discurso religioso sendo uma forma de limitá-lo para ser encaixado e domar as forças da natureza e nossas pulsões, e para se viver coletivamente. Para Freud, a crença nos deuses supre as seguintes necessidades: deuses nos protegem das forças da natureza, nos conciliam com a crueldade do destino (morte), nos compensam pelas privações e sofrimentos da vida em sociedade; a partir de certo momento, a religião deixa de ser natural para se tornar moral conforme conhecemos a natureza – leis morais.
    Como resultados obtidos até o curso da investigação, os filmes mostram o uso da Goetia em sua função principal: ritual serve apenas para ganhos materiais, além da importância da propriedade privada para o curso narrativo de tais benesses (mal derivado do desejo). O ocultismo é uma “solução conveniente”, como Freud aponta sobre o pensamento religioso. Outro aspecto é que os filmes não apresentam uma contrapartida (divino, sagrado) moral a essa sistematização tida como “demonológica”; ocorre a intensivação da manifestação daquela força. Assim, do ponto de vista materialista, a Goetia supre sua função de ser uma solução direta para um sistema de troca voltada para atender necessidades materiais de maneira efetiva e iminente.

Bibliografia

    ALMEIDA, Marcos Renato Holtz de. O Diabo e a Indústria Cultural: as diversas faces da personificação do mal nas telas de cinema. Revista Nures (ISSN 1981-156X), n. 16, Setembro-Dezembro, 2010.

    CARROLL, Noel. “The Philosophy of Horror or Paradoxes of the Heart.” Nova York e Londres: Routledge, 1990. Brasil: A Filosofia do Horror ou Paradoxos do Coração (Português), 1990.

    FEUERBACH, Ludwig. A Essência do Cristianismo. Petrópolis-RJ: Editora Vozes, 2007.

    FREUD, Sigmund. O infamiliar / Das Unheimliche, seguido de O Homem da Areia. Trad. Ernani Chaves, Pedro H. Tavares e Romero Freitas. Belo Horizonte: Autêntica, 2019.

    FREUD, Sigmund. O futuro de uma ilusão. Porto Alegre, RS: L&PM, 2011.

    MARX, Karl. Crítica da Filosofia do Direito de Hegel. Tradução de Rubens Enderle e Leonardo de Deus. 2ª ed. São Paulo: Boitempo, 2010.

    VADICO, Luiz. A complexidade das relações entre cinema/religião e religião/cinema. Entrevista concedida à Graziela Wolfart. IHU Online, ed. 412, dezembro de 2012.