Ficha do Proponente
Proponente
- Fabián Rodrigo Magioli Núñez (UFF)
Minicurrículo
- Professor Associado do Departamento de Cinema e Vídeo da Universidade Federal Fluminense (UFF), onde também é credenciado ao Programa de Pós-Graduação em Cinema e Audiovisual (PPGCine). É líder do grupo de pesquisa CNPq Plataforma de Reflexão sobre o Audiovisual Latino-Americano (PRALA) e pesquisador membro do comitê gestor do Laboratório Universitário de Preservação Audiovisual (LUPA-UFF).
Ficha do Trabalho
Título
- Apenas duas moças latino-americanas sem dinheiro no banco: ‘Bete Balanço’ (1984) e ‘Sussi’ (1987)
Seminário
- Cinema e audiovisual na América Latina: novas perspectivas epistêmicas, estéticas e geopolíticas
Resumo
- A partir das reflexões sobre o declínio da ideia de “cidade latino-americana” e o aumento da segregação socioespacial de nossas metrópoles, ocorrida durante as “décadas perdidas” na América Latina, os anos 1980 e 1990, pretendemos realizar um estudo comparativo entre os longas ‘Bete Balanço’ (Brasil, 1984), de Lael Rodrigues, e ‘Sussi’ (Chile, 1987), de Gonzalo Justiniano.
Resumo expandido
- No livro ‘A cidade latino-americana: uma figura da imaginação social do século XX’, Gorelik estuda uma ideia, a “cidade latino-americana”, que fremiu os pensadores urbanos dos anos 1940 aos 70. A América Latina foi um laboratório social para muitas propostas teóricas, marcadas pelo entusiasmo da possibilidade de implantá-las nesse subcontinente, como se ela tivesse uma história e uma geografia que pudesse se iniciar do zero. As ditaduras interromperam esse processo, arrematado pelo declínio do paradigma revolucionário dos anos 1980. A partir dessa década, os estudos sobre a cidade começaram a ser dar por intermédio de uma leitura culturalista, cuja hegemonia ainda se dá no presente século. O que mais impressiona Gorelik é o corte radical que se deu entre a “cidade latino-americana” e o culturalismo dos estudos urbanos contemporâneos, dando um tom melancólico quando olhamos para um certo otimismo presente nas discussões nos estudos sobre a cidade e o planejamento urbano no período do pós-guerra até a implantação das ditaduras. Por sua vez, Maricato aponta para as “bombas socioecológicas” que estouraram nas metrópoles latino-americanas nas duas “décadas perdidas”, os anos 1980 e 1990, uma marcada pela hiperinflação e pela dívida externa, e a outra, pelo neoliberalismo. Assim, o aumento da segregação socioespacial é, na verdade, um fenômeno global, mas, como aponta a urbanista brasileira, o desmonte do aparelho estatal devido ao credo neoliberal possui efeitos muito mais perversos em regiões onde jamais se conseguiu erigir um Estado de bem-estar social, como é o caso da América Latina. E, assim, os problemas estruturais que já estavam presentes no processo de urbanização de nossas metrópoles, mesmo durante o período de alto crescimento econômico, se agravaram profundamente nas duas últimas décadas do século passado, como é possível constatar, como exemplifica Maricato, com o aumento exponencial dos índices de favelização e da violência urbana, chegando a graus até então jamais vistos pelas sociedades latino-americanas.
É nessa conjuntura que propomos analisar dois longas-metragens dos anos 1980, protagonizadas por duas jovens mulheres que saem da província em direção à metrópole, em busca da conquista de seus sonhos. Tal tema não é original no cinema latino-americano, uma vez que podemos constatar desde o período silencioso e, com mais força, a partir da década de 1940, vários filmes protagonizados por personagens migrantes e imigrantes, que deixaram para trás localidades rurais ou periféricas para partirem em direção a grandes centros urbanos. Na verdade, se trata de um tema também presente em nossa leitura, que, assim como no cinema, apresenta a cidade grande, seja como o espaço da liberdade e da mobilidade social, seja como o hostil local da corrupção do caráter, da solidão e da alienação. Os filmes a serem analisados são o brasileiro ‘Bete Balanço’ (1984) de Lael Rodrigues e o chileno ‘Sussi’ (1987) de Gonzalo Justiniano. Ambos filmes fizeram um notório sucesso de bilheteria em seus respectivos países e narram a história de moças que saem da província em direção à metrópole em busca de ascensão social. Em tom leve, o longa brasileiro é um musical rock, em total sintonia com o cenário musical em expansão na época, direcionado para um público jovem. Por sua vez, ‘Sussi’ é uma comédia que flerta com o melodrama, dando um tom irônico e caricato a tipos de personagens entranhados no imaginário latino-americano. Além disso, ambos filmes possuem uma forte carga erótica, embora o longa chileno, devido à censura pinochetista, seja muitíssimo mais implícito e, por isso mesmo, consegue lançar mão da comicidade, uma vez que a sua protagonista brinca com o estereótipo da mulher bela e atraente, que conquista melhores condições de vida graças à sua juventude e atributos físicos. Assim, nosso propósito é como o imaginário da “moça que parte para a cidade grande” se reatualiza em um contexto tão singular como foram os anos 1980.
Bibliografia
- BOUILLET, R. Muito mais que o balanço Bete: estudo de caso do filme ‘Bete Balanço’. Monografia (Bacharelado). UFF, Niterói. 2004.
BUENO, Z. P. Leia o livro, veja o filme, compre o disco: a produção cinematográfica juvenil na década de 1980. Tese (Doutorado), Unicamp, Campinas, 2005.
GORELIK, A. A cidade latino-americana: uma figura da imaginação social do século XX. Salvador: EdUFBA, 2024.
LAGOS OLIVERO, C. A. La construcción simbólica de Santiago de Chile: representaciones del espacio público de la ciudad en la producción cinematográfica nacional. Tese (Doutorado), UCM, Madri, 2015.
MARICATO, E. Urbanismo na periferia do mundo globalizado: metrópoles brasileiras, São Paulo em Perspectiva, 14 (4), 2000, p. 21-33.
SALIM, D. M. Pegou a guitarra e foi ao cinema: rock e juventude na filmografia de Lael Rodrigues nos anos 1980. Dissertação (Mestrado), UFF, Niterói, 2013.