Trabalhos aprovados 2025

Ficha do Proponente

Proponente

    Fernanda Tôrres de Miranda Estevam (UFMG)

Minicurrículo

    Fernanda Estevam é graduada em Cinema e Audiovisual pelo Centro Universitário UNA, especialista em Roteiro para Cinema e Televisão e mestre em Ciências Sociais, ambos pela PUC Minas. Doutoranda em Artes na Escola de Belas Artes da UFMG, onde pesquisa cinema de terror brasileiro feito por mulheres. Autora dos contos de terror “A sombra da luz” e “O canto do Urutau”, presentes nas antologias Tremor Acaso Irreal e O drama é Dark, respectivamente. Atua como diretora e roteirista na Partisane Filmes.

Ficha do Trabalho

Título

    A representação da realidade no cinema de terror nas obras O animal Cordial (2017) e Medusa (2021)

Resumo

    O cinema de terror, para além do entretenimento, funciona há anos como um meio para se discutir a sociedade através da fabulação, do fantástico, do exagero e do medo; o cinema de terror brasileiro não é diferente. Esse seminário propõe analisar o discurso social presente no cinema de terror brasileiro a partir dos filmes O Animal Cordial (2017), de Gabriela Amaral Almeida e Medusa (2021), de Anita Rocha da Silveira.

Resumo expandido

    O terror muitas vezes é um reflexo histórico e social, que possibilita fabular a realidade e tratar de assuntos existentes através do fantástico. O Brasil é um país que traz em sua história e em seu presente várias marcas de terror – colonização, escravidão, ditadura militar, racismo, desigualdade social -, e trazer esses assuntos para o cinema é dar visibilade a nossa própria história. O terror nos permite lidar com verdades e realidades as quais nos recusamos a enfrentar.
    No ano de 2016, o Brasil testemunhou um golpe misógino organizado pelo centro e pela direita política do país sobre a então presidenta Dilma Rousseff, um processo cercado de incongruências que impichou a primeira presidente mulher da história do Brasil. A classe média que ascendeu economicamente durante os governos do PT (Partido dos Trabalhadores) quer se distanciar das classes mais baixas e busca se encontrar na burguesia brasileira, que não aceita nem reconhece a classe média como sua igual. Nessa busca pela sua nova identidade social/financeira, a classe média reforça ainda mais seus preconceitos e violências contra as classes mais baixas e a tudo aquilo que elas representam, criando inclusive uma aversão aos símbolos nacionais populares.
    O revanchismo contra os grupos sociais que ganharam mais direitos durante os governos do PT ganha força, sendo representado pelo retrocesso de medidas que protegem esses grupos e pela crescente violência contra esses mesmos grupos. É nesse Brasil que se passa O animal Cordial (2017), obra na qual a roteirista e diretora Gabriela Amaral Almeida explora os terrores de uma realidade social que representa de várias formas a sociedade em que o filme foi produzido.
    Em O animal Cordial (2017), o terror que ocorre dentro do restaurante é um terror social, a sociedade brasileira contemporânea é representada naquele micro espaço, fazendo com que as tensões de classe, gênero e raça deflagrem com violência. Cada personagem representa uma camada distinta da sociedade brasileira de forma extrapolada e ficcionalizada e cada um desses personagens são pessoas que encontramos em nossa realidade, mas com ações e reações maximizadas nos limites das paredes de um restaurante. Somos nós vendo a nós mesmos através da lente do terror.
    Se o período de produção de O animal cordial (2017) acompanhou o processo de ascensão da extrema direita brasileira em seu princípio, Medusa (2021) vive em um Brasil governado por ela. Lançado em 2021 no circuito de festivais e em 2023 no circuito comercial, o filme de Anita Rocha da Silveira viveu a eleição de Jair Bolsonaro à presidência do Brasil, o crescimento exponencial do entrelaçamento de religiões neopentecostais com a política brasileira e, consequentemente, o aumento do poder dessas igrejas na sociedade.
    Essa onipresença das igrejas neopentecostais em inúmeros setores da sociedade brasileira – política, segurança, saúde, políticas públicas e até mesmo no entretenimento – teve grande impacto no país, que se sentiu livre para demonstrar sua face mais conservadora e misógina. Segundo a diretora, a ideia do filme veio de uma notícia de jornal sobre mulheres que estavam violentando outras mulheres que não seguiam os preceitos de suas religiões, e ler sobre isso chamou sua atenção pois para ela, a notícia por si só era aterrorizante, um filme de terror real.
    A análise da relação entre a realidade e as formas do cinema de terror de representá-la, através dos filmes O animal Cordial (2017) de Gabriela Amaral Almeida e Medusa (2021), de Anita Rocha da Silveira, é o objetivo desse seminário.

Bibliografia

    CARNEIRO, Gabriel e SILVA, Paulo Henrique. Cinema fantástico brasileiro 100 filmes essenciais. Editora Letramento. Belo Horizonte. 2023
    CÁNEPA, Laura. Medo do que? Uma história do horror nos filmes brasileiros. Campinas. 2008
    FURUTANI, Guilherme de Oliveira. Cenas Malditas: 2008 e os horrores do cinema brasileiro. UFMG. Belo Horizonte. 2024
    MACHADO, Samir Machado. O entretenimento é um projeto de país. In Revista Piauí, n. 204. 2023. p.76-79
    MARRA, Fernanda. O animal cordial: uma rasura da razão. In Revista Lusófona de Estudos Culturais. vol. 6, n. 1. p. 189 – 199. 2019
    PRIMATI, Carlos. Tela crente e profana? Misticismo, horror e fantástico na televisão brasileira. In. Eclipse – Revista de Audiovisual. Nº 5/ outubro de 2023. Belo Horizonte
    SALDANHA, Beatriz. Poesia, morbidez e insurgência: as diretoras do horror nacional. In Mulheres atrás das câmeras – As cineastas brasileiras de 1930 a 2018, LUSVARGHI, Luiza, SILVA, Camila (orgs). Ed. Estação Liberdade LTDA. São Paulo. 2019. p. 76-88