Trabalhos aprovados 2023

Ficha do Proponente

Proponente

    ANA MARIA STRAUBE DE ASSIS MOURA (Unicamp)

Minicurrículo

    Ana Straube é jornalista formada pela PUC-SP e mestranda em Multimeios no Instituto de Artes da Unicamp. Em sua pesquisa, analisa cinco documentários latino-americanos produzidos entre os anos de 1971 e 2018, e que abordam de diferentes maneiras a personagem Maria Auxiliadora Lara Barcelos, integrante de organizações clandestinas de luta armada contra a ditadura militar brasileira (1964-1985). Trabalha também como roteirista e desenvolve projetos audiovisuais de ficção e não-ficção.

Ficha do Trabalho

Título

    As duas faces de Dôra

Formato

    Presencial

Resumo

    Este trabalho tem como objetivo analisar dois documentários produzidos por Luiz Alberto Barreto Sanz: “Não é hora de chorar” (1971, Chile), e “Dôra, ou Quando chegar o momento” (1978, Suécia). Ambos os filmes trazem, de diferentes formas, a história da militante Maria Auxiliadora Lara Barcelos (Dôra), presa e banida pela ditadura militar brasileira. A análise parte do contexto histórico e das condições materiais em que os filmes foram produzidos para discutir suas opções estéticas e narrativas.

Resumo expandido

    Em 1971, um grupo de setenta presos políticos brasileiros foi trocado pelo embaixador suíço Giovanni Bucher, no quarto e último sequestro promovido por organizações de luta armada contra a ditadura militar. Entre os setenta homens e mulheres banidos para o Chile estava Luiz Alberto Barreto Sanz que, ao chegar, produz seu primeiro documentário.

    “Não é hora de chorar” (1971) é composto por relatos de tortura e violência sofridas por alguns de seus companheiros. Uma das militantes a dar o seu testemunho é Maria Auxiliadora Lara Barcelos, a Dôra. Após ser banida do Brasil, Dôra passou pelo Chile, México, Bélgica, França e Alemanha, onde cometeu suicídio em 1976. Sua morte é o gancho para que Sanz produza seu segundo documentário, “Dôra, ou Quando chegar o momento” (1978), que conta a história da guerrilheira e também de outros refugiados políticos latinoamericanos que se encontravam na Europa naquele momento.

    Este trabalho tem como objetivo analisar os dois documentários produzidos por Luiz Alberto Barreto Sanz, tendo Maria Auxiliadora como personagem. No primeiro filme, ela está presente por meio de uma entrevista em que descreve sua experiência na clandestinidade, a tortura a qual foi submetida e outros detalhes de sua vivência no presídio feminino de Bangu, no Rio de Janeiro, até a troca pelo embaixador e banimento para o Chile.

    No segundo, Dôra está ausente, mas sua história de vida e militância, e traços de sua personalidade são resgatadas por meio do depoimento de Reinaldo Guarany Simões, ex-militante de uma organização armada e último companheiro de Dôra. Guarany é também co-roteirista do filme, e assume nele a função de refletir sobre as razões que podem ter levado Dôra à morte. Tanto Guarany como Sanz aparecem no filme, que conta com formato e linguagem distintos do primeiro.

    A análise dos filmes parte do contexto histórico e condições materiais em que foram produzidos para discutir as opções estéticas e narrativas adotadas. O primeiro filme, feito com poucos recursos logo da chegada do cineasta ao Chile na condição de refugiado, remonta às teorias de Julio García Espinosa em seu manifesto “Por un cine imperfecto”, em que o autor defende a urgência de um cinema alinhado às inspirações revolucionárias de grupos da esquerda latinoamericana, com a produção de filmes que contribuam para a tomada de consciência das classes populares. Registrado em preto e branco, é um filme composto basicamente por testemunhos e representações de cenas de tortura, encenadas pelas próprias vítimas, cujo principal objetivo é a denúncia das condições enfrentadas pelos presos políticos brasileiros.

    Já o segundo filme, produzido durante a passagem de Sanz pela Suécia, onde esteve exilado após o golpe militar que depôs o presidente chileno Salvador Allende, recorre a outras opções narrativas. Em cores, ele conta com narrações em off, externas, encenações menos explícitas e com a participação dos dois roteiristas também como personagens. Dôra é uma das entrevistadas do primeiro filme e a personagem principal do segundo, embora ausente.

    Em suma, este trabalho compara as duas produções partindo de seus pontos em comum (seria o segundo filme uma continuidade do primeiro?) para refletir sobre as opções estéticas e narrativas adotadas por cada um deles para contar a história de um grupo de exilados brasileiros durante os anos de ditadura, sobretudo de Maria Auxiliadora Lara Barcelos.

Bibliografia

    CAVALCANTI, Pedro Celso Uchôa; RAMOS, Jovelino (orgs.). Memórias do exílio, Brasil 1964-19??. São Paulo: Editora Livramento, 1976.
    COSTA, Albertina de Oliveira; MORAES, Maria Teresa Porciuncula; MARZOLA, Norma; LIMA, Valentina da Rocha (orgs.). Memórias das mulheres do exílio. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1980.
    ESPINOSA, Julio García. Por un cine imperfecto, 1969.
    FERREIRA, Elizabeth F. Xavier. Mulheres, militância e memória. Rio de Janeiro: Editora Fundação Getúlio Vargas, 1996.
    FREIRE, Marcius. Documentário. Ética, estética e formas de representação. São Paulo: Annablume, 2011.
    NASCIMENTO, Ingrid Faria Gianordoli; TRINDADE, Zeidi Araujo; SANTOS, Maria de Fátima de Souza. Mulheres e militância: encontros e confrontos durante a ditadura militar. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2012.
    RAMOS, Fernão Pessoa. Mas afinal… O que é mesmo documentário? (2008) São Paulo: Editora Senac, 2013.