Trabalhos aprovados 2023

Ficha do Proponente

Proponente

    Angela Nelly dos Santos Gomes (UFPA)

Minicurrículo

    Docente do bacharelado em Cinema e Audiovisual da Universidade Federal do Pará-UFPA. Doutoranda no PPG Comunicação, Cultura e Amazônia, PPGCOM/UFPA. Mestre em Comunicação pela UMESP-SP. Roteirista, documentarista, produtora, jornalista.

Ficha do Trabalho

Título

    A experiência do cinema Kayapó tecendo uma nova cena estético-política

Seminário

    Cinema e audiovisual na América Latina: novas perspectivas epistêmicas, estéticas e geopolíticas

Formato

    Presencial

Resumo

    Este trabalho traz uma reflexão sobre a experiência de cinema do povo Mebêngôkre-Kayapó do Pará cujas obras e fazer cinematográfico agem na construção de uma “cena estético-política” pois, para além da visualidade como figuração de singularidades socioculturais, desvelam uma perspectiva outra sobre si, os povos originários e sobre a própria Amazônia. Para pensar essa perspectiva nos valemos da contribuição dos estudos decoloniais e de estética e política das imagens.

Resumo expandido

    Apresento com este trabalho uma reflexão acerca da experiência de cinema dos cineastas do povo Mebêngôkre-Kayapó do Pará, que se organizam hoje no Coletivo Beture, no sentido de olhar suas obras e seu fazer cinematográfico como um conjunto, um todo que age para além da visualidade como figuração de singularidades socioculturais, como operadores para a construção de uma “cena estético-política” que questiona a ordem dominante (Rancière, 2009, 2012, 2021a; 2021b;), visto que o cinema e a imagem desvelam uma perspectiva outra sobre si, os povos originários e sobre a própria Amazônia.
    O povo Mebêngôkre-Kayapó é pioneiro no uso das imagens, do cinema e das tecnologias de comunicação como aliado na reivindicação de direitos, sendo um dos primeiros povos da Amazônia a fazer “uso político” do cinema e das imagens ainda na década de 1980 (TURNER 1993). Hoje uma nova geração de cineastas se organiza para se fortalecer e estabelecer como realizadores, sujeitos e protagonistas de suas próprias histórias e narrativas.
    Mas não dá para situar esse cinema na Amazônia sem considerar a ferida colonial (MIGNOLO, 2005) que afeta a formação socioeconômica e histórica da região e seus habitantes. A despeito de viverem sob intensa pressão sobre seu território e modo de vida numa das regiões mais ameaçadas do país, o sul do Pará, parte de uma região da Amazônia conhecida como “cinturão do fogo” exatamente por estar na linha da devastação e destruição resultante de atividades de grileiros, posseiros, madeireiros e garimpeiros, os cineastas Mebêngôkre-Kayapó vêm utilizando a imagem cinematográfica para forjar novas percepções de si, refazer conexões com o território, modo de vida e saberes, para si e para a sociedade não indígena. E com essa “aparição” instauram outros modos de visibilidade, que em última instância é também uma forma de garantia de sua r/existência. A pluralidade de seus filmes, entre os quais os “filmes rituais”, denotam a apropriação do cinema como lugar de escuta, deferência e instauração desse outro modo de visibilidade, no qual as imagens trabalham como operadoras na construção de subjetividades, de desconstrução de olhares e estereótipos que lhes são constantemente impostos por todo um horizonte sócio-simbólico atravessado por colonialismos e neocolonialismos que os atinge enquanto povos originários e enquanto pertencentes a esta região.
    Assim, pelo cinema os Kayapó tomam parte e organizam suas próprias formas de aparição, que age na descolonização de um olhar atravessado historicamente pelas diversas formas de opressões e discursividades coloniais que os atinge como povos originários da Amazônia.

Bibliografia

    CASTRO, Edna (org.). Pensamento Crítico Latino-Americano. São Paulo: Annablume e Clacso. 2019.
    GONDIN, Neide. A invenção da Amazônia. 2 ed. Manaus: Editora Valer, 2007
    MIGNOLO, Walter. La ideia de America Latina: la herida colonial y la opción decolonial. Barcelona: Gedisa, 2005.
    RANCIÈRE, J. A Partilha do Sensível: Estética e Política. Trad. Mônica Costa Netto, 2009.
    RANCIÈRE, Jacques. O destino das imagens. Trad. Mônica Costa Netto. Rio de Janeiro: Contraponto, 2012.
    RANCIÈRE, J. O Trabalho das Imagens. Conversações com Andrea Soto Calderón. Trad. Ângela Marques. Belo Horizonte: Chão de Feira, 2021a.
    RANCIÈRE, Jacques. O método da cena. Belo Horizonte: Quixote Do, 2021b.
    TURNER, T. Imagens desafiantes: a apropriação Kaiapó do vídeo. Revista de Antropologia, [S. l.], v. 36, p. 81-121, 1993. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/ra/article/view/111390. Acesso em: 11 ago. 2020.