Trabalhos aprovados 2023

Ficha do Proponente

Proponente

    Mariana Queen Ifeyinwaeze Nwabasili (USP)

Minicurrículo

    Mariana Queen Nwabasili é jornalista e pesquisadora, doutoranda e mestra em Meios e Processos Audiovisuais pela Escola de Comunicações e Artes da USP, onde também se graduou em Jornalismo. Mestra em Curadoria Cinematográfica pela Elías Querejeta Zine Eskola, na Espanha, com bolsa do Projeto Paradiso. Interessada nas conexões entre Cinema, Comunicação, História e Ciências Sociais, pesquisa autorias, representações e recepções cinematográficas vinculadas a raça, gênero, classe e (de)colonialidade.

Ficha do Trabalho

Título

    Debates sobre legitimidade de autoria e representação social e racial

Seminário

    Cinema no Brasil: a história, a escrita da história e as estratégias de sobrevivência

Formato

    Presencial

Resumo

    Propõe-se uma reflexão sobre a existência de relações entre os debates sobre representação social e os debates sobre representação racial tornados públicos ao longo da história do cinema nacional e o entendimento desses debates como parte de uma historicidade dos Estudos de Cinema Negro Brasileiro, campo heterogêneo que vem se consolidando historicamente a partir de verificáveis e disputadas produções de pessoas negras na crítica de filmes, no âmbito acadêmico e também na curadoria de festivais.

Resumo expandido

    Propomos na comunicação expor ideias presentes em um artigo inédito que segue sendo lapidado e se intitula “Relações históricas entre os debates sobre legitimidade de autoria e representação social e racial no cinema brasileiro”. O artigo e os desdobramentos originados dele fazem parte de uma frente de pesquisa individual adjacente de nossa pesquisa de doutorado: o interesse em identificar uma historiografia do que temos observado ser uma gradual e atual consolidação do subcampo – que para termos práticos e conceituais chamaremos de campo (BOURDIEU, 1983) – de Estudos de Cinema Negro Brasileiro, que, a nosso ver, abrange estudos e críticas da representação dos negros e da cultura negra no cinema nacional ao longo de sua história.
    A hipótese a ser explicitada é de que existem relações de continuidade entre os debates e problemáticas relacionadas aos anseios, formas e questionamentos da legitimidade de representação do povo brasileiro e/ou das temáticas nacionais e populares em nosso cinema desde a década de 1950 e os debates e problemáticas relacionadas aos anseios, formas e questionamentos das representações cinematográficas de corpos negros surgidas com maior protagonismo em nossos filmes especificamente desde esse período.
    Para nós, a mobilização dos debates sobre legitimidade de autoria e representação social e racial no cinema brasileiro se constitui como um processo, implicando reatualizações em novas conjunturas históricas. Afinal, há momentos em que os anseios e discussões sobre a representação do povo brasileiro em nosso cinema irão, inclusive por meio de personagens históricas (artistas entre eles), convergir com os debates raciais – e também feministas – feitos no Brasil e no exterior entre os as décadas de 1950 e 1980.
    A nosso ver, os debates sobre legitimidade de representação do povo e do nacional popular (ou seja, de representação da classe popular brasileira) encabeçados, já na década de 1960, por membros do CPC (Centro Popular de Cultura) do Rio de Janeiro e pelo crítico e teórico Jean-Claude Bernardet em publicações jornalísticas (GERBER, 1991) ao criticarem os cinemanovistas, fazem parte de uma primeira fase da publicização dessas discussões.
    Esses debates teriam como atualização, ou como segunda fase de publicização, as críticas sobre legitimidade de representação de corpos negros em filmes do Cinema Novo também tornadas públicas a certa altura. Exemplo maior disso é o texto “A senzala vista da casa grande”, elaborado pela historiadora e militante negra Beatriz Nascimento (1942-1995) como crítica negativa ao filme Xica da Silva (Cacá Diegues, 1976) publicada no jornal alternativo Opinião à época do lançamento do longa-metragem.
    Em grande parte, a relação entre os dois momentos de debates mencionados e a centralidade do Cinema Novo neles pode ser explicada devido ao fato de, para diferentes pesquisadores, esse movimento vanguardista, influenciado pelo debate sobre temáticas nacionais e populares no cinema brasileiro instaurado na década 1950, ter colocado personagens negras como protagonistas de seus filmes, porém, pensando o negro como um ator social que guiava as lutas da classe oprimida e era, paradoxalmente, “desracializado” quanto às explicitações narrativas das obras (CARVALHO, 2008; SOUZA, 2013). Para Carvalho (2008), na grande maioria dos filmes do movimento, o negro representava uma classe, um povo, o brasileiro popular, a ser protagonista de ações revolucionárias.
    Se, como parte desse histórico, que defendemos ser parte da construção dos Estudos de Cinema Negro Brasileiro, a autoria de pessoas negras (atores, cineastas, pensadores, críticos) foi apontada ou mesmo disputada como critério para a instauração do que seria e é entendido por Cinema Negro Brasileiro (CARVALHO, 2008), acionamos a construída marcação da diferença racial negra (BRAH, 2006) em sua afirmação política estratégica (COSTA, 2002) para destacar a centralidade e o possível pioneirismo de Nascimento na instauração desse campo.

Bibliografia

    BERNARDET, J. Cinema brasileiro: propostas para uma história. São Paulo: Cia. de Bolso, 2009.
    _______. Piranha no mar de rosas. São Paulo: Nobel, 1982.
    BOURDIEU, P. “O Campo Científico”. In ORTIZ, Renato (Org.). Bourdieu – Sociologia. São Paulo: Ática. Coleção Grandes Cientistas Sociais, 1983, vol. 39. p. 122-155.
    BRAH, A. (2006). Diferença, diversidade, diferenciação. Cadernos Pagu, 2006, p. 329-376.
    CARVALHO, N. “Racismo e anti-racismo no Cinema Novo”, In Estudos de Cinema SOCINE. São Paulo: Anablume, 2008.
    COSTA, C. L. “O sujeito no feminismo: revisitando os debates”. Cadernos Pagu, 2002, p. 59-90.
    GERBER, R. “Glauber Rocha e a experiência inacabada do Cinema Novo”. In GOMES, Paulo Emílio Salles et. al. Glauber Rocha. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1991.
    NASCIMENTO, B. “A senzala vista da casa-grande”. Jornal Opinião, Rio de Janeiro, p. 20-1, 15 out. 1976.
    SOUZA, E. Cinema na panela de barro: mulheres negras, narrativas de amor, afeto e identidade. Tese de doutorado, Unb, 2013.