Trabalhos aprovados 2023

Ficha do Proponente

Proponente

    Wilq Vicente (UFABC)

Minicurrículo

    Doutorando em Ciências Humanas e Sociais na UFABC e mestre em Estudos Culturais pela USP. Organizador do livro QUEBRADA? Cinema, Vídeo e Lutas Sociais (CINUSP, 2014) e curador de mostras, entre elas a 1ª Mostra Cinema de Quebrada (CCSP, 2005), Carta Branca ao Submarino Vermelho (19º Festival Int. de Curtas-Metragens de São Paulo, 2008), 3ª Mostra Cinema da Quebrada do CINUSP (2014) e a 1ª Mostra Cinema da Quebrada do MAE-UFBA (2016). Produziu o Circuito de Vídeo Popular na Rede TVT (2011-12).

Ficha do Trabalho

Título

    A centralidade da cultura e a produção audiovisual periférica

Seminário

    Políticas, economias e culturas do cinema e do audiovisual no Brasil.

Formato

    Presencial

Resumo

    O texto busca apresentar uma caracterização da produção audiovisual contemporânea com a participação de pessoas das periferias urbanas brasileiras, enfatizando a disputa de significados que emergem a partir dos anos 2000 em função do aumento da produção e circulação de filmes produzidos por realizadores moradores das periferias. Por isso, este tipo de audiovisual, precisa ser colocado em diálogo com um debate mais amplo que envolva não apenas o cinema, mas também a cultura.

Resumo expandido

    Ao longo dos anos 2000, principalmente nas cidades de Rio de Janeiro e de São Paulo, mas também em outros lugares do país e da América Latina, foi possível verificar o crescimento da produção de filmes e ações audiovisuais desenvolvidas em territórios periféricos.

    Dessa primeira década do milênio é possível destacar algumas pesquisas que registraram essa movimentação. Alvarenga (2004) realiza um recorte da prática do “vídeo comunitário”. Hamburger (2007) aborda a relação entre a apropriação dos “mecanismos de produção” e o rompimento da invisibilidade dos segmentos populares deste país e habitantes de bairros periféricos das grandes cidades. Cota (2008) analisa como as experiências de oficinas de cinema realizadas por projetos sociais geraram mobilização de jovens da periferia na criação de espaços de exibição na cidade de São Paulo. Stücker (2009) olha para as séries Cidade dos Homens (Rio de Janeiro, 2002-2005) e Antônia (São Paulo, 2006-2007) e debate o lugar simbólico que a periferia adquiriu no audiovisual e na indústria cultural. Zanetti (2010) examina como o “cinema da periferia” obteve certa projeção através da ampliação do circuito exibidor.

    Atrelada a essa produção cultural registrada em diversos estudos acadêmicos, também foi possível notar uma ampliação da diversificação de editais de seleção de projetos culturais desenvolvidos em territórios periféricos e por pessoas oriundas da periferia, cursos e oficinas de formação em audiovisual desenvolvidos por ONGs (principalmente aquelas com foco na juventude), o aprofundamento da ótica da diversidade cultural e da cidadania no âmbito das políticas públicas em diferentes esferas, específicas visões de governos em relação à dinâmica entre Estado, cultura e cidade, bem como a incorporação parcial de “talentos” da periferia pela indústria cultural, fenômenos que parecem dialogar diretamente com o contexto das cidades contemporâneas. De forma a fazer coexistir o crescimento de investimentos, o aumento do número de organizações e projetos, novas formas de atuação e articulação pautadas a partir da “centralidade da cultura” no cotidiano das camadas mais pobres da população.

    A produção cultural deste período surge fortemente calcada na ideia de “nossa realidade representada por nós mesmos”, em diálogo com outras expressões e linguagens artísticas que também expressam essa questão. É o caso de filmes e vídeos que são fruto de projetos apoiados por editais públicos, de coletivos e indivíduos formados em oficinas de ONGs, agora já fora do âmbito delas, ou mesmo produções independentes ou apoiadas por universidades. Em produções como Rap, o canto da Ceilândia (2005); Vaguei os livros e me sujei com a merda toda (2007); 2 meses e 23 minutos (2007); Julgamento (2008); A ilusão viaja de baú e a liberdade de bike (2008) e; Qual centro? (2010), identifica-se diferentes formas e estratégias de lidar com as pautas candentes, que expressam o repertório coletivo da década.

    Por isso, este tipo de audiovisual realizado nas periferias brasileiras, precisa ser colocado em diálogo com um debate mais amplo que envolva não apenas o cinema, mas também a cultura. Justamente porque essa produção emerge de um contexto de alargamento cultural, quase inédito nos últimos anos, o que impactou em propostas de filmes dos segmentos subalternos da população.

    O objetivo deste trabalho é compreender as transformações na cena da produção de audiovisual ligada às classes populares nas últimas décadas no país, tendo em vista mudanças nas formas organizativas, nos arranjos políticos sociais e nas narrativas e expressões diversas dessa produção. Essa cena do audiovisual nas periferias passou a apresentar novas narrativas, paisagens e corpos, seja quando olharmos para os espaços onde as práticas foram realizadas, seja na observação das perspectivas políticas e percepções de mundo que estes novos agentes expressaram através de suas produções culturais, em diferentes arranjos produtivos e localidades.

Bibliografia

    ALVARENGA, Clarisse. Vídeo e experimentação social: Um estudo sobre o vídeo comunitário contemporâneo no Brasil. 2004. Dissertação (Mestrado) – Programa em Multimeios da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), Campinas, 2004.

    COTA, Giselle Ferreira. Cinema de Quebrada: oficinas audiovisuais na periferia paulistana e seus desdobramentos. Dissertação (Mestrado) – Escola de Comunicações e Artes, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2008.

    HAMBURGER, Esther. Políticas da Representação. Contracampo (UFF), Niterói, v. 8, p. 49-60, 2003.

    STÜCKER, Ananda. “O audiovisual como instrumento de mudança na cidade e como criação de redes de interlocução cultural e política”. In: VICENTE, Wilq. (org.). QUEBRADA? Cinema, vídeo e lutas sociais. São Paulo: Pró-Reitoria de Cultura e Extensão Universitária/USP, 2014.

    ZANETTI, Daniela. O “cinema de periferia” e os festivais: práticas audiovisuais e organização discursiva. Comunicação & Sociedade, Ano 31, n. 53, p. 191-214, jan./jun. 2010.