Trabalhos aprovados 2023

Ficha do Proponente

Proponente

    Leonardo Alvares Vidigal (UFMG)

Minicurrículo

    Leonardo Vidigal é professor associado na Escola de Belas Artes, Universidade Federal de Minas Gerais, no curso de graduação de Cinema de Animação e Artes Digitais, além de orientar e lecionar no PPG-Artes da mesma escola. É mestre e doutor em Comunicação Social pela UFMG e fez pós-doutorado na Goldmiths, University of London. Publicou em revistas como Contemporânea, Significação, Revista Pós, Devires, Revista Brasileira do Caribe, Volume! e Interactions – Studies in Communication & Culture.

Ficha do Trabalho

Título

    Ponto de escuta e regimes da diegese: ambiguidades na percepção sonora

Seminário

    Estilo e som no audiovisual

Formato

    Presencial

Resumo

    Esta comunicação versa sobre teorias e conceitos relacionados ao ponto de escuta nos estudos de cinema. O objetivo da apresentação será discutir desenvolvimentos teóricos recentes sobre um conceito que pode ser empregado de forma mais nuançada e detalhada, refinando a análise de obras ambíguas e pouco estudadas. O texto considera também a incorporação de aspectos práticos na construção do ponto de escuta e ainda o desenvolvimentos tecnológico, algo essencial no tocante a filmes contemporâneos.

Resumo expandido

    Ponto de escuta é um conceito-chave nos estudos de cinema. Esta comunicação se propõe a continuar o processo de investigação e interpelação da noção de ponto de escuta, o que foi desenvolvido por este autor em outras ocasiões neste encontro e também por meio de artigos publicados ao longo dos anos. Na última década, alguns autores e autoras também se ocuparam deste conceito com contribuições significativas, formando um corpus teórico mais sólido que precisa ser testado e colocado em diálogo com outros pesquisadores e pesquisadoras, e também com a produção contemporânea de cinema, séries e outras obras audiovisuais.
    Um destaque nas recentes contribuições sobre ponto de escuta é a combinação deste conceito com o que chamo de regimes de diegese, analisando sons que estejam associados internamente ao universo da história contada por meios audiovisuais (diegéticos) ou externamente (extradiegéticos), dentro e fora de quadro. Por exemplo, a categoria “som diegético fora de quadro interior”, trazida por Neumeyer, Buhler e Deemer, pode ser relacionada ao ponto de escuta subjetivo de alguém que não pode ser visto pelo espectador-ouvinte. Tais categorias podem trazer nuances e apresentar mais detalhes para a descrição e análise de obras audiovisuais.
    Sons extradiegéticos são geralmente pouco considerados quando estudamos o ponto de escuta. No entanto, se pensarmos no regime de diegese híbrido dos musicais, onde as personagens podem ouvir o canto de uma delas em cena, mas não sabemos se ouvem o acompanhamento instrumental extradiegético que caracteriza muitos exemplares deste gênero, o ponto de escuta pode ser problematizado. Assim, se alguns estão cantando e todos estão dançando, por exemplo, em “West Side Story”, a situação sugere que estão ouvindo a tudo, mas se apenas assistem, como em “The Broadway Melody”, ela sugere que não estão escutando o acompanhamento. Isso também acontece em filmes que não são musicais, mas apresentam momentos semelhantes (como em “Pepé le Moko”). Por isso podemos problematizar pontos de escuta ambíguos para quem está vendo e ouvindo esta cena no universo do filme e também para aqueles que a assistem na sala de cinema ou na sala de casa. Podemos também considerar documentários experimentais, ambíguos por natureza, onde a música extradiegética parece catalisar ações e diálogos entre pessoas e objetos filmados (como em “Scorpio Rising”).
    Outras situações que envolvem o ponto de escuta em documentários também precisam ser investigadas, como em “Crônica de um Verão”, por exemplo, onde um microfone atado a um gravador é escondido sob as roupas de uma das personagens, que faz um monólogo diegético enquanto perambula pelas ruas de Paris. Ou ainda nos documentários em animação, que trabalham com entrevistas ou se valem de reconstituições de fatos e ações, usando todos os recursos sonoros da ficção, como sonoplastia e outros. Isso nos transporta para outros autores, que procuram não situar o ponto de escuta apenas em relação à câmera, mas também em relação à percepção sonora dentro de quadro e também aos sons internos de personagens, como a respiração. Para tanto, precisamos levar em conta aspectos práticos da construção do ponto de escuta pela distribuição de microfones, principalmente aqueles atados ao corpo das personagens, além de gravadores portáteis que permitem separar radicalmente o ponto de escuta do ponto de vista filmado.
    Desde que Michel Chion e Rick Altman começaram a trabalhar com o conceito de ponto de escuta, houve um notável desenvolvimento tecnológico, que não será abordado em detalhes nessa comunicação, mas que também coloca problemas a serem explorados, por exemplo, podendo tornar o ponto de escuta espacial tão identificável quanto o subjetivo, situando um som em apenas um alto-falante. Estas são apenas algumas das perspectivas teóricas a serem abordadas nessa comunicação, procurando exemplos em filmes brasileiros contemporâneos, como “Marte Um”, “Fogaréu”, “Bacurau”, entre outros.

Bibliografia

    Altman, Rick. Sound Space. In: Altman, Rick (org.). Sound Theory/Sound Practice. Nova Iorque: Routledge, 1992.

    BUHLER, James; NEUMEYER, David; DEEMER, Rob. Hearing the movies: music and sound in film history. New York: Oxford University Press, 2010.

    CHION, Michel. A audiovisão – som e imagem no cinema. Lisboa: Texto & Grafia, 2011.

    SCHIFFER, Sheldon. Footsteps, breath and recording devices: Abandoning a camera-centric construction of point of audition, The Soundtrack 5: 1, pp. 15–28, 2012.

    TRANÅS, Marie Welde. Unravelling Point of Audition. Dissertação de mestrado (Mestrado em Musicologia). University of Oslo, Oslo, 2017.

    VIDIGAL, Leonardo A.; CRUZ, Marcos. Scorpio Rising: pontos de escuta e a ascensão da música popular no cinema. Contemporânea, v.12, p.370 – 391, 2014.

    VIDIGAL, Alvares Leonardo. Pontos de escuta e diegese da chanson no cinema. Significação, São Paulo, v. 48, n. 55, p. 212-230, jan-jun. 2021.