Trabalhos aprovados 2023

Ficha do Proponente

Proponente

    Rodrigo Corrêa Gontijo (UEM)

Minicurrículo

    Rodrigo Gontijo é artista, curador e professor na Universidade Estadual de Maringá. É Doutor e Mestre em Multimeios pelo Instituto de Artes da UNICAMP e Bacharel em Comunicação e Multimeios pela PUC-SP. É autor de artigos sobre cinema experimental e expandido. Como artista desenvolve projetos de cinema ao vivo, instalações audiovisuais e filme-ensaio. Realizou a concepção, pesquisa e curadoria da exposição “As Aventuras de Alice” no Farol Santander-SP (2022).

Ficha do Trabalho

Título

    Alice & Alicia – experimentações de Navarro e Plá a partir de Carroll

Seminário

    Cinema experimental: histórias, teorias e poéticas

Formato

    Presencial

Resumo

    Os filmes “Alice no País das Mil Novilhas” de Edgard Navarro e “Alicia en el País de las Maravillas” de Eduardo Plá, ambos de 1976, são adaptações de “As Aventuras de Alice no País das Maravilhas” (1865) de Lewis Carroll. Esta comunicação visa estabelecer um cotejamento das obras para refletir, à luz do regime noturno das imagens (DURAND, 2012), como pontos de aproximação estabelecem diálogos, que se desdobram em estratégias de resistência à repressão social e política vigente em cada país.

Resumo expandido

    As Aventuras de Alice no País das Maravilhas (1865) de Lewis Carroll apresenta, através de um universo lúdico, referências aos costumes e imaginários específicos da sociedade vitoriana, a partir de uma escrita cifrada que produz enigmas e que se multiplica em variados caminhos interpretativos. Desde a sua primeira adaptação para o cinema (1903), a jornada de Alice pelas imagens em movimento continuou por diversos países, com cerca de 40 diferentes versões. Na América do Sul, em 1976, foram realizados dois filmes: o curta brasileiro “Alice no País das Mil Novilhas” de Edgard Navarro e o longa argentino “Alicia en el País de las Maravillas” de Eduardo Plá. Apesar dos filmes terem características distintas – curta/longa, Super-8/35mm, narrativa experimental/ficcional, circulação por festivais/circuito comercial – a proposta desta comunicação é estabelecer um cotejamento dos dois filmes, relacionando-os à publicação original de Carroll, para refletir, à luz do regime noturno das imagens (DURAND, 2012), como acontecem aproximações e diálogos que se desdobram em estratégias narrativas de resistência à repressão social e política vigente em cada país.

    A experimentação da linguagem cinematográfica, em diferentes níveis, é uma marca destes diretores que, coincidentemente no mesmo ano, produziram adaptações de um mesmo livro em plena ditadura militar de seus países. Plá, artista plástico que transitou pelo Super-8, realiza seu primeiro e único longa-metragem. Nele, o diretor altera sua proposta original e se aproxima de uma narrativa mais clássica, depois de ser preso por filmar uma cena de Alice com máscara de gás em um lixão de Buenos Aires (MITROVICH; FRIEDHEIM, 2010). Já Navarro, em seu filme de estreia, confronta a repressão ao abordar de maneira anárquica questões morais e sociais, a partir de ideais libertários da contracultura. Alinhado às produções em Super-8 de sua época, seu filme apresentava “espaços de respiração democrática […], contestação política, esculacho do status quo vigente” (MACHADO, 2006).

    O livro de Lewis Carroll é permeado por personagens que, de maneira velada, promovem constantes críticas à moralidade e aos costumes da era vitoriana. A figura do Coelho Branco representa o universo dos adultos escravizados pelo relógio (GARDNER, 2013), regime imposto pelas jornadas de trabalho exaustivas decorrentes da Revolução Industrial. Situações semelhantes aparecem nas duas produções audiovisuais. No filme de Plá, o Coelho surge trajando as cores da bandeira da Argentina, promovendo uma referência ao estado repressor. Já Navarro, critica as hierarquias sociais ao evocar um coelho, representado por um ator negro, que conduz Alice por um mundo libertário que questiona a moral vigente. Referências a estados alterados de consciência e ao sistema judiciário também aparecem no livro e nas duas produções através da ingestão de substâncias psicotrópicas e pela presença da Rainha de Copas.

    Ao identificar, selecionar e aproximar estes trechos citados, os filmes em questão, apesar de suas diferenças, estabelecem diálogos e interações a partir de propostas estéticas que se conectam ao regime noturno das imagens (DURAND, 2012), conceito que pode corroborar com as reflexões em torno de determinados filmes experimentais latino-americanos realizados durante Estados de exceção.

Bibliografia

    CARVALHO, M. do S. Super-8 de Invenção – o cinema experimental de Edgard Navarro visto por Jairo Ferreira. Revista Eco-Pós, [S. l.], v. 19, n. 2, p. 48–56, 2016. Disponível em: https://revistaecopos.eco.ufrj.br/eco_pos/article/view/3359. Acesso em: 10 abr. 2023.

    DURAND, G. As Estruturas Antropológicas do Imaginário. São Paulo: Martins Fontes, 2012.

    GARDNER, M. Alice – Edição Comentada e Ilustrada. Rio de Janeiro: Zahar, 2013

    MACHADO JÚNIOR, R. Poetas, artistas, anarco-superoitistas – a marginália 70 e o cinema experimental. Sinopse (São Paulo), [S. l.], v. 4, n. 10, p. 97-102, 2006. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/sin/article/view/209274. Acesso em: 18 de abril de 2023.

    MITROVICH, V.; FRIEDHEIM, F. W.. Alicia en el país. Representaciones en un film argentino de 1976. Primeras Jornadas de historia oral del Noroeste argentino, 2010.