Trabalhos aprovados 2023

Ficha do Proponente

Proponente

    Mariana Dias Miranda (PPGCOM/UFRJ)

Minicurrículo

    Doutoranda em Comunicação e Cultura pelo Programa de Pós-graduação em Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (PPGCom/UFRJ). Mestre em Cinema pelo Programa de Pós-Graduação em Cinema e Audiovisual da Universidade Federal Fluminense (PPGCine/UFF). Sua pesquisa atual tem como foco o conceito de atmosfera no cinema e as relações entre afetos negativos e formas estéticas no cinema contemporâneo latino-americano.

Ficha do Trabalho

Título

    Breve história do Stimmung e suas redefinições na teoria do cinema

Formato

    Presencial

Resumo

    A partir do mapeamento das problemáticas que envolvem a análise estética do conceito de Stimmung e sua mobilização no cinema atualmente, propõe-se recuperar, através de uma breve genealogia, o contexto de seu afloramento no século XVII. Tomando como recorte a teoria humoral e a gramática das emoções associada a paisagem e sua subsequente incorporação no discurso da teoria do cinema, visa-se tensionar a trivialização e esvaziamento do conceito, oferecendo pistas para sua análise na encenação.

Resumo expandido

    Na última década tornou-se notável o reavivamento do termo “atmosfera” – e seus derivados “humor” e Stimmung – em âmbito interdisciplinar, com foco em diversas áreas, como: turismo/eventos, arquitetura, espaço urbano, filosofia política, teoria literária, artes plásticas e cinema. O conceito, emergente nos primórdios da filosofia estética do século XVII e, subsequentemente incorporado ao cinema em autores clássicos como Béla Balazs (1970) e Lotte Eisner (1965), hoje parece retornar na esteira dos debates metodológicos do que ficou conhecido como “virada afetiva”.
    Através do mapeamento de autores que mobilizam a concepção de Stimmung no cinema, literatura e estudos da paisagem (BALÁZS, 1970; BÖHME, 2017; BRUNO, 2022; EISNER, 1965; GIL, 2005; GUMBRETCH, 2014; entre outros), nota-se que a noção de atmosfera traz junto de si um referencial complexo que se relaciona tanto a multiplicidade de interpretações e definições, quanto ao seu forte uso metafórico, enquanto simples ilustração de certos aspectos que dotam um ambiente de elementos afetivos ou, por fim, pela figura quase transcendental de um leitor/espectador e suas sensações corporais enquanto alicerce explicador da localização da atmosfera. Tal noção torna-se excessivamente aberta, ambígua e grande parte de seu problema teórico se deve ao seu acionamento por autores e áreas distintas que poucas vezes se colocam em diálogo.
    Paralelo a esse contexto, David Wellbery (2017), ao realizar a história conceitual do Stimmung, constata a sua trivialização no discurso contemporâneo enquanto um sintoma de seu esgotamento. Assim, permanece como questão fundamental se ainda há pertinência na mobilização deste conceito, pergunta para a qual o próprio Wellbery parece indicar, com certo pessimismo, um caminho de resposta: “Devemos responder com ceticismo, pois mesmo uma rápida olhada na situação atual no campo da estética mostra que há poucas oportunidades para reviver o conceito de Stimmung como um termo significativo” (WELLBERY, 2020, p.431).
    Partindo deste questionamento e, de certo modo, discordando de sua descrença, esta comunicação pretende retomar, através de uma breve história da invenção da paisagem e da teoria humoral nos séculos XVII e XVIII (COURBIN, 2020), a emergência de uma gramática das emoções associada ao ambiente. Neste período, há um movimento no qual a paisagem torna-se ferramenta para articulação imagética e metafórica das dinâmicas afetivas interiores e, estritamente, as palavras atmosfera e humor ou Stimmung têm, de maneira sintomática, suas primeiras inscrições e predominância no debate estético.
    Culminando, também, na reinvenção do mundo exterior, não como mero reflexo solipsista de um eu, mas enquanto um tipo de identificação de uma disposição que emana do movimento natural de contato e mediação entre sujeito e mundo. Também é neste caminho que Gil (2005, p.13) classifica, mesmo que brevemente, a noção de atmosfera fílmica ligada: “(…) a uma visão romântica do espaço: como se este carregasse um peso escuro e misterioso, através do prolongamento da alma das coisas do mundo, ou porque a atmosfera seria a própria alma do mundo.” Esta complexidade do jogo entre interior e exterior, que considero herdeira deste período histórico, parece informar as definições de Stimmung mais próximas ao sentido de ambiência.
    Em síntese, esta comunicação, ao recuperar este recorte histórico bem como suas figuras estéticas em exemplos diversos – tanto literários quanto fílmicos – pretende explorar os modos com que a noção de mediação entre sujeito e paisagem deste período, corroboram e informam a teorização da composição de um espaço cinematográfico saturado de forças baseadas na relação entre elementos ativos da encenação. Retira-se, com isso, a primazia da figura humana, compreendendo a espacialidade e seus elementos componentes em interação, e como estes são construídos enquanto criadores de forças e de presença, possuindo assim, disposição e um humor próprio.

Bibliografia

    BALÁZS, Bela. Theory of the film: character and growth of a new art. Londres: Dover Publications, 1970.
    BÖHME, Gernot. The aesthetics of atmospheres. Nova York: Routledge, 2017.
    BRUNO, Giuliana. Atmospheres of projection: environmentality in Art and Screen Media. Chicago: The University of Chicago Press, 2022.
    COURBIN, Alain; COURTINE, Jean Jacques; VIGARELLO, Georges (org.). História das emoções 2: das luzes até o final do século xix. Petrópolis: Vozes, 2020. p. 17-52.
    EISNER, Lotte H. The Haunted Screen: Ghosts in Literature and Film. Londres: Thames and Hudson, 1965.
    GIL, Inês. A atmosfera no cinema: O caso de A sombra do caçador de Charles Laughton entre onirismo e realismo. Braga: Fundação Calouste Gulbenkian, 2005.
    GUMBRECHT, Hans Ulrich. Atmosfera, ambiência, stimmung: sobre um potencial oculto da literatura. Rio de Janeiro: Contraponto Editora, 2014.
    WELLBERY, David. Stimmung. New Formations, [S.L.], v. 93, n. 93, p. 6-45, 1 jul. 2018. Lawrence and Wishart.