Trabalhos aprovados 2023

Ficha do Proponente

Proponente

    Rafael de Almeida (UEG)

Minicurrículo

    Doutor em Multimeios pela Universidade Estadual de Campinas – Unicamp. Professor do curso de Cinema e Audiovisual da Universidade Estadual de Goiás- UEG.

Ficha do Trabalho

Título

    O roteiro no cinema documentário: da impossibilidade à imaginação

Seminário

    Estudos de Roteiro e Escrita Audiovisual

Formato

    Presencial

Resumo

    Pretendemos refletir sobre a escrita audiovisual em filmes documentais, buscando discutir a ideia de que o documentário seria acompanhado da impossibilidade do roteiro, conforme Comolli. Nos interessa reconhecer as formas de criação textual que antecedem a realização de obras não-ficcionais, assumindo a ausência de controle absoluto como condição para o exercício de escrita e para a invenção de mundos que dialogam criativamente com a realidade, a partir da noção de roteiro imaginário de Guzmán.

Resumo expandido

    Segundo Comolli, “filmar os homens reais no mundo real significa estar às voltas com a desordem das vidas, com o indecidível dos acontecimentos do mundo, com aquilo que do real se obstina em enganar as previsões. Impossibilidade do roteiro. Necessidade do documentário” (COMOLLI, 2008, p. 176). Diante disso, a presente comunicação propõe uma reflexão em torno ao processo de escrita audiovisual em projetos documentais, buscando discutir a ideia de que o documentário seria acompanhado da impossibilidade do roteiro, conforme Comolli. Portanto, nos interessa reconhecer as formas de criação textual que antecedem a realização de obras não-ficcionais, apesar do nosso entendimento de que tais obras se realizam sob o risco do real, assumindo a ausência de controle absoluto como condição para o exercício de escrita e para a invenção de mundos que dialogam criativamente com a realidade.

    As dinâmicas de mercado investem cada vez mais na necessidade de uma fase de desenvolvimento de roteiro consolidada para projetos documentais, inclusive com a existência de laboratórios e de ambientes de mercado audiovisual específicos. Assim, nos parece urgente pensar em processos de escrita que tanto acolham o acaso, como elemento que perpassa de forma significativa o processo de realização documental, quanto sejam capazes de estruturar narrativamente as propostas considerando seus elementos dramáticos.

    Em geral, a escrita dos projetos de documentário no Brasil é debitária do modelo de projeto sugerido pelo Manual Didático do DOCTV IV (2008), que integrava uma oficina para formatação de projetos documentais. O projeto nos moldes previstos inclui os seguintes itens: Visão original, Proposta de documentário, Eleição e descrição dos objetos, Eleição e justificativas das estratégias de abordagem, Simulação das estratégias de abordagem e Sugestão de estrutura. Atualmente, boa parte dos laboratórios de desenvolvimento solicitam logline e sinopse (elementos básicos para apresentar qualquer projeto audiovisual), além de itens (variáveis para cada laboratório) que poderíamos associar aos que foram originalmente desenhados pelo Manual do DOCTV, tais como: motivação; resumo temático; tratamento visual ou notas do diretor sobre o ponto de vista fílmico; abordagem artística etc. Além disso, também é recorrente que os editais de produção solicitem roteiro, pré-roteiro ou ao menos uma Sugestão de estrutura.

    Por essa perspectiva, “ao pensar na estrutura de um documentário, o diretor enfrenta questões semelhantes às enfrentadas por um roteirista de ficção” (PUCCINI, 2007, p. 112). Ou seja, amparada pela pesquisa realizada durante a fase de escrita do projeto de documentário, a escrita lida com materiais de composição diversos que podem revelar um roteiro imaginário: “uma espécie de história ‘ideal’ que, às vezes, substitui a realidade por uma realidade imaginada, em que aparece o que queremos, o que ansiamos encontrar” (GUZMÁN, 2017, p. 44-45). Nos parece urgente se valer dessa noção como maneira de garantir espaço para a imaginação dramática na escrita de filmes documentais, investindo em uma estrutura narrativa tanto necessária quanto possível.

    Apesar de reconhecermos as armadilhas criadas pelo real durante a fase de realização, “um documentário precisa, sem dúvida, da escrita de um roteiro – com desenvolvimento e desfecho – com protagonistas e antagonistas, com cenários pré-determinados, uma iluminação calculada, diálogos mais ou menos previstos e alguns movimentos de câmera ajustados de antemão. Se trata de um exercício tão aberto e arriscado como necessário; é como a partitura de um concerto de jazz; é quase como um acordo comum ‘do geral e do particular’; é uma pauta que pressupõe todo tipo de mudanças. Mas continua sendo um roteiro”. (GUZMÁN, 1997, s.p.). Logo, não se trata somente de investir esforços em revelar as coisas do mundo que já estão aí, mas sobretudo de apostar na potência criativa daquelas imagens que ainda desejamos ver no mundo.

Bibliografia

    COMOLLI, Jean-Louis. Ver e poder: a inocência perdida – cinema, televisão, ficção, documentário. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2008.

    GUZMÁN, Patrício. Filmar o que não se vê: um modo de fazer documentários. São Paulo: Edições Sesc São Paulo, 2017.

    GUZMÁN, Patrício. O roteiro no cinema documentário. Viridiana, n. 17, 1997.

    PUCCINI, Sérgio. Roteiro de documentário: da pré-produção à pós- produção. Campinas: Papirus, 2012.