Trabalhos aprovados 2023

Ficha do Proponente

Proponente

    Fernanda Sales Rocha Santos (USP)

Minicurrículo

    Fernanda Sales Rocha Santos é doutoranda pelo Programa de Pós-Graduação em Meios e Processos Audiovisuais da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da Universidade de São Paulo (USP). Mestre pelo mesmo programa. Atualmente realiza estágio internacional como pesquisadora visitante na School of The Arts da Columbia University, em Nova York. Além de pesquisadora, é dramaturga e roteirista audiovisual.

Ficha do Trabalho

Título

    O roteiro não filmado de Lorraine Hansberry

Seminário

    Estudos de Roteiro e Escrita Audiovisual

Formato

    Presencial

Resumo

    A apresentação se debruçará sobre a adaptação para o cinema da peça teatral “A Raisin in The Sun” (1959), de Lorraine Hansberry, tendo como foco a análise de versões do roteiro não aceitas pelas instâncias produtoras do filme lançado em 1961. Por meio desta análise em conjunto com a leitura do memorando do estúdio, proponho a ideia da adesão, no processo de roteirização, a um “melodrama branco” que se mostrou incompatível, naquele momento, com uma história preta.

Resumo expandido

    O roteiro não filmado de Lorraine Hansberry: melodrama branco para uma história preta

    A apresentação se debruçará sobre a adaptação para o cinema da peça teatral “A Raisin in The Sun” (1959), de Lorraine Hansberry, tendo como foco a análise de versões do roteiro escritas pela autora porém não aceitas pelas instâncias produtoras do filme lançado em 1961. “A Raisin in The Sun” é um marco no teatro estadunidense, sendo uma das obras fundamentais de sua modernidade. A peça é sobre uma família negra que vive na periferia de Chicago e encara o dilema do que fazer com um cheque de 10 mil dólares do seguro de vida do patriarca falecido. A dramaturgia toca em temas que envolvem classe social, raça e gênero, levando para Broadway dos anos 1950 um elenco majoritariamente preto e feminino. O sucesso da peça foi tanto que Lorraine Hansberry teve os direitos de “A Raisin in The Sun” comprados pela Columbia Pictures e foi convidada para escrever o roteiro da adaptação para o cinema.

    Diferenciando-se da maioria das adaptações da Broadway por Hollywood daquele período – onde mantinha-se o máximo possível da peça original, alterando-se principalmente partes “censuradas” pelo PCA -, o primeiro tratamento escrito por Lorraine expande a narrativa para fora da sala de estar, insere novos personagens e conflitos. Essa primeira versão do roteiro torna a peça vividamente mais cinematográfica ao mesmo tempo em que reitera um discurso sobre o racismo que na peça está posto de forma menos retórica.

    Analisando, para além dos tratamentos não filmados, o memorando do estúdio com cartas e notas sobre os roteiros, vê-se o esforço dos produtores em cortar tudo o que não está na peça e foi criado por Lorraine em sua busca pelo mais cinematográfico e, concomitantemente, mais político. Lisbeth Lipari (2004) sobre o pensamento de Nakayama e Krizek (1995) sugere a existência de uma construção retórica da branquitude por de trás dessas solicitações de alterações nos primeiros tratamentos de “A Raisin in The Sun”. Lipari sustenta a ideia de que o estúdio não se comprometeria com um filme em que a branquitude fosse retratada como vilã. Diante dessa consideração, gostaria de sugerir uma adesão à uma linguagem melodramática por parte de Lorraine Hanberry, em busca de tornar o filme uma obra, além de mais inserida no padrão Hollywoodiano do período – em termos de linguagem – mais enfática em sua visão de mundo.

    Procedimentos como o uso de comparações imagéticas, paralelismos e metáforas visuais, repetição e redundância trazem mais transparência discursiva ao roteiro não filmado de “A Raisin in The Sun”, tornando a obra mais cinematográfica e mais melodramática ao mesmo tempo. Uso o melodrama para a análise do roteiro de Lorraine Hansberry em três sentidos: 1) como linguagem dominante no período vinculada ao gênero “melodrama familiar dos anos 1950” (Rodowick; Elsseasser, 1987), à ideia de que o melodrama pontua uma visão ideológica de mundo, e isso leva à uma clareza discursiva social e política (Gaines, 2018); à ideia de que quanto mais cinematográfico (em termos de uma linguagem da continuidade clássica) inevitavelmente teremos obras mais melodramáticas (Williams, 2018).

    Assim, paradoxalmente, quanto mais adequado ao padrão da época, menos aceitos foram os tratamentos de “A Raisin in The Sun”. O filme resultante é extremamente parecido com a peça teatral, mantendo sutilezas e ambiguidades que o roteiro de Hansberry abriu mão em busca de uma linguagem e retórica da transparência. Minha hipótese, convergindo em alguns pontos com a de Lipari, é a de que quanto mais a roteirista se utilizava do aparato narrativo tradicionalmente branco em seu roteiro (o que chamo de “melodrama branco”) menos aceitos esses roteiros eram. Busca-se assim, apresentar esses procedimentos dos tratamentos não filmados, pensar sobre suas contradições e levantar questões sobre a conexão entre linguagem cinematográfica, melodrama e branquitude.

Bibliografia

    ELSAESSER, Thomas – Tales of sound and fury. Observations on the family melodrama. In. GLEDHILL, Christine (org) – Home is where the heart is. British Film Institute, 1987
    GAINES, Jane. ‘Moving Picture Melodrama’. In C. Williams (Ed.), The Cambridge Companion to English Melodrama, Cambridge: Cambridge University Press, 2018
    LIPARI, Lisbeth ‘Fearful of the written word: white fear, black writing, and Lorraine Hansberry’s a raisin in the sun screenplay’. In Quarterly Journal of Speech, V. 90, 2004
    NAKAYAMA, Thomas; KRIZEK, Robert, “Whiteness: A Strategic Rhetoric,” Quarterly Journal of Speech, 81 (1995)
    RODOWICK, David. Madness, Authority and Ideology – The Domestic Melodrama of the 1950s. In. GLEDHILL, Christine (org) – Home is where the heart is. British Film Institute, 1987
    WILLIAMS, Linda. ‘Tales of Sound and Fury…or the Elephant of Melodrama’. Melodrama Unbound: Across History, Media, and National Cultures, in GLEDHILL; WILLIAMS (org),New York: Columbia University Press, 2018