Trabalhos aprovados 2023

Ficha do Proponente

Proponente

    Vinicius Augusto Carvalho (UFF)

Minicurrículo

    Doutorando em Cinema e Audiovisual pelo PPGCINE da UFF, é formado em Jornalismo (UFSC) com mestrado em Economia Criativa (ESPM) e especialização em TV Digital, Radiodifusão e Novas Mídias de Comunicação Eletrônica (UFF). Na ESPM-Rio é professor desde 2014 e coordena o Portal de Jornalismo. Depois de 13 anos editando e finalizando audiovisuais jornalísticos e de entretenimento na TV Globo, hoje dirige e monta curtas-metragens e atua como editor de peças audiovisuais de comunicação da Netflix.

Ficha do Trabalho

Título

    Entre Planos: a trajetória da pontuação imagética no cinema brasileiro

Formato

    Presencial

Resumo

    A partir dos efeitos visíveis de transição entre planos, propõe-se uma perspectiva de análise histórica da cinematografia brasileira de longas-metragens de ficção com foco nas pontuações imagéticas. O levantamento de fades, fusões e wipes em 235 filmes lançados entre 1930 e 2019 revela tendências e materialidades estruturais e estéticas que dialogam com os conceitos de clássico, moderno e pós-moderno presentes em debates sobre a evolução da gramática e da linguagem narrativa no cinema nacional.

Resumo expandido

    Desde os primeiros filmes brasileiros, cineastas experimentam a construção de narrativas a partir do agenciamento de diferentes imagens, bem como a utilização de efeitos de transição entre os planos como recursos para preservar a continuidade, indicar um salto no tempo, mudança de ambiente ou fim de uma cena. Arijon (1976) sublinha que a pontuação, obtida por meio da inserção de elementos “virtuais”, é capaz de sensibilizar o espectador, sem que para isso o diretor e sua equipe precisem captar novas imagens. Esta investigação lança um olhar sobre a história da cinematografia brasileira de longas-metragens de ficção, com foco em fades, fusões e wipes. Bordwell (2008) define como “ganchos” estes recursos de narração, sinaliza que eles são responsáveis pela coesão entre os segmentos e destaca que, como um dispositivo de contar histórias, afetam tanto o design narrativo quanto o padrão estilístico. Balàzs (1952) completa que, ao inserir uma pontuação imagética, narrador, autor e/ou cineasta estão falando com o espectador.

    Para este estudo foram selecionados 235 filmes, uma amostra diacrônica que abrange gêneros, diretores e montadores diversos entre 1930 e 2019. A investigação trabalha eventuais adversidades na leitura dos dados com o emprego de ferramentas computacionais, como as técnicas “Planos em uma única visualização” e “Frame a frame: anatomia de um plano”, desenvolvidas por Lev Manovich (2013), que propõem a compilação de frames em um diagrama que oferece visibilidade à informação. O registro das transições visíveis revela tendências e materialidades que aproximam suas características estruturais e estéticas de uma evolução das linguagens cinematográficas clássica e moderna. A análise de fades, wipes e fusões é efetuada numa perspectiva de comparação com estilos convencionados e adota o termo “pós-moderno” como possibilidade de diferenciação do estilo de montagem de transições como categoria “meta-histórica” (ECO, 1998).

    O mapeamento confirma que o fade costuma marcar o início e o fim de um evento na tela e, cognitivamente, estabelece uma pausa e dá ao público espaço para tomar fôlego, absorver a emoção e se preparar para o que vai acontecer (CHANDLER, 2009). O efeito, que consiste em surgir ou desaparecer gradualmente com a imagem, teve seu auge na chamada “Era de Ouro” do cinema brasileiro. O recurso utilizado 42 vezes em “Ganga bruta” (1933) e 65 em “O Ébrio” (1946) quase desaparece nas décadas de 1960 e 1970, mas retorna à ilha de edição na virada do século. Por sua vez, a fusão, responsável por conectar visualmente os planos, sobrepondo por um breve período uma tomada com outra, criando momentaneamente uma terceira imagem, usada muitas vezes para indicar um estado mental e considerada a transição mais suave (VERSTRATEN, 2009), é outra pontuação visível detectada desde os primeiros filmes. As 53 fusões em “Vendaval maravilhoso” (1949), as 55 de “Sinhá moça” (1953) ou as 22 em “Cidade de Deus” (2002) ilustram a frequência dessa transição, que, assim como o fade, também foi deixada de lado durante o Cinema Novo, mas ressurgiu décadas depois. Por fim, o wipe, que efetua a transição entre planos por meio de uma margem que percorre a tela e pode estar sob a forma de uma linha horizontal, vertical ou ainda de figuras e que, para Mitry (2000), é um indicador de mudança para um novo espaço, foi muito utilizado em comédias e musicais como “Bonequinha de seda” (1936) e “Samba da vida” (1937). Contudo, esta pontuação passou décadas no ostracismo e volta ao cenário cinematográfico no século XXI em produções como “Mundo cão”(2016) e “Bacurau” (2019).

    O levantamento e a investigação levam a reflexões sobre as pontuações imagéticas que, ao performar atributos rítmicos, simbólicos, estéticos, sintáticos e sensoriais, reforçam o texto fílmico e apresentam uma evolução das características elípticas e suavizadoras típicas do cinema clássico.

Bibliografia

    ARIJON, Daniel. Film punctuation. In: Grammar of the film language. Los Angeles: Silman-James Press, 1976. AUTRAN, Arthur. A montagem no cinema brasileiro (1919-1989). Portal Brasileiro de Cinema. Ensaios, 2005. Disponível em: portalbrasileirodecinema.com.br. BALÁZS, Béla. Theory of the film: Character and growth of a new art. Londres: Dennis Dobson LTD, 1952. BORDWELL, David. The Hook: Scene Transitions in Classical Cinema. David Bordwell’s website on cinema, 2008. Disponível em: davidbordwell.net. CHANDLER, Gael. Film editing: Great cuts every filmmaker and movie lover must know. Studio City, EUA: Michael Wiese Productions, 2009. E-book. ECO, Umberto. Pós-escrito a O Nome da Rosa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985. MANOVICH, Lev. Visualizing Vertov. Cultural Analytics Lab., 2013. Disponível em: manovich.net. MITRY, Jean. The aesthetics and psychology of the cinema. EUA: Indiana University Press, 2000. VERSTRATEN, Peter. Film Narratology. Canadá: University of Toronto, 2009.