Trabalhos aprovados 2023

Ficha do Proponente

Proponente

    Danielle Bertolini da Silva (UFMT)

Minicurrículo

    Mestranda em Estudos de Cultura Contemporânea pela UFMT, é diretora, roteirista, produtora e curadora audiovisual. Criou o Festival de Cinema Feminino Tudo Sobre Mulheres.Os documentários “Águas Encantadas do Pantanal” (2000), “De Volta Pra Casa”(2015), “Filhos da Lua na Terra do Sol” (2016), “Mulheres Xavante Coletoras de Sementes” (2020), “Escutando e Vendo” (2021), “Segredos do Coração da América do Sul”, “Chapada dos Guimarães: Destino Ecoturismo” e “Mato Conectado” compõem sua filmografia.

Ficha do Trabalho

Título

    TEREZA DE BENGUELA NO IMAGINÁRIO DE MULHERES DE VILA BELA

Formato

    Presencial

Resumo

    Esta é uma pesquisa realizada com mulheres negras que vivem em Vila Bela da Santíssima Trindade, primeira capital mato-grossense, onde existiu o quilombo do Quariterê nos anos 1700. Através da linguagem cinematográfica, a pesquisa examina como o imaginário sobre Tereza de Benguela, líder do quilombo, influencia a identidade dessas mulheres. O objetivo da pesquisa é explorar como a história de Tereza pode ser usada como uma fonte de fortalecimento para mulheres da região.

Resumo expandido

    Não há registros sobre a origem de Tereza de Benguela – se ela nasceu escrava ou livre, tampouco registros exatos sobre sua aparência física, e este é um fato que se repete na história de muitas pessoas traficadas e escravizadas no Brasil.
    Sabemos muito pouco sobre ela (…) talvez tenha chegado às áreas de mineração por volta de 1730. (GOMES, LAURIANO, SCHWARCZ. 2021)
    Liderança quilombola, esposa de José Piolho, também líder quilombola, assassinado pelas forças da coroa portuguesa, Tereza ocupou seu lugar após sua morte. No quilombo do Quariterê, localizado na região de Vila Bela da Santíssima Trindade, no sudoeste mato-grossense, havia circulação de moeda própria, fartura na produção de alimentos, comercialização do excedente agrícola, fabricação de tecido, um parlamento que se reunia periodicamente para tomada de decisões, e uma forja onde transformavam armas apreendidas nas lutas em ferramentas de trabalho, como enxadas e facas.
    O objetivo desta pesquisa, que pretende transformar-se em um documentário, é abordar a presença de Tereza de Benguela no imaginário de mulheres que vivem hoje em Vila Bela, transitar entre a imaginação e o mundo real – o processo de transformação de mulheres em Rainhas do Quariterê, a personificação de um mito. Os autores que são parte do arcabouço teórico sobre o imaginário são Gilbert Durand, Gaston Bachelard e Saidiya Hartman.
    “Seja documentário ou ficção, o todo é sempre uma grande mentira que contamos. Nossa arte consiste em contá-la de modo que acreditem nela. Se uma parte é documentário e outra parte é reconstituição, isso diz respeito ao método de trabalho, não ao público. O mais importante é alinhar uma série de mentiras ao modo a alcançar uma verdade maior. Mentiras irreais, mas de algum modo verdadeiras. É isso que importa […] tudo é inteiramente mentira, nada é real, mas o todo sugere a verdade…” (KIAROSTAMI, 2004)
    Pretende-se construir um discurso descolonizador, a versão dos que foram vencidos no passado, e tiveram roubados seus direitos, inclusive à memória, os que hoje são descendentes de pessoas escravizadas que lutaram para viver em liberdade, e que hoje representam 72% da população de Vila Bela da Santíssima Trindade, de acordo com a historiadora Silviane Ramos Lopes.
    Para a pesquisa buscamos mulheres das mais variadas idades, moradoras de Vila Bela de Santíssima Trindade, que desejam interpretar Tereza de Benguela em um filme. A motivação é o desejo de estar no cinema, eternizar suas imagens atuando e se tornando a Rainha do Quariterê.
    Para o processo de construção das cenas ficcionais, elas participam de uma oficina com uma atriz quilombola, onde devem vir à tona as facilidades e dificuldades em viver a vida de outra mulher, que para elas é a maior referência feminina já existente, ou pelo menos já ouviram falar bastante.
    Quem foi essa mulher? Como será que era a vida no quilombo comandado por ela?
    Para estas questões não buscamos respostas objetivas, mas sim o que permeia o imaginário das mulheres que vivem hoje em Vila Bela da Santíssima Trindade – e indicam as muitas histórias sobre Tereza de Benguela.
    “Somos Tereza”, título previsto para o filme, utiliza a metalinguagem – um filme sobre a feitura de outro filme, sobre o processo de construção de personagem que, ao mesmo tempo, abrange a identidade de uma cidade, um documentário performático, borrando as fronteiras entre documentário e ficção, e burlando as diferenças entre os dois gêneros cinematográficos.

Bibliografia

    BACHELARD, Gaston. O direito de sonhar. Editora Bertrand Brasil, 1994
    BEZERRA, Cláudio. A personagem no documentário de Eduardo Coutinho. Campinas/SP: Papirus, 2014
    DURAND, Gilbert. A imaginação simbólica. Edições 70, 1993
    FARIAS JÚNIOR, Emmanuel de Almeida. Negros do Guaporé: o sistema escravista e as territorialidades específicas. Revista do Centro de Estudos Rurais – UNICAMP, v.5, nº2, setembro de 2011
    GOMES, Flávio dos Santos. Enciclopédia Negra. Companhia das Letras, 2021
    HARTMAN, Saidiya. Perder a mãe: uma jornada pela rota atlântica da escravidão. Bazar do Tempo, 2021
    HARTMAN, Saidiya. Vidas rebeldes, belos experimentos: histórias íntimas de meninas negras desordeiras, mulheres encrenqueiras e queers radicais. Fósforo, 2022
    HOOKS, bell. Anseios: Raça, gênero e políticas culturais. Elefante, 2019
    KIAROSTAMI, Abbas. O real, cara e coroa. Cosac Naify, 2003
    NICHOLS, Bill. Introdução ao Documentário. Campinas: Papirus Editora, 2005