Trabalhos aprovados 2023

Ficha do Proponente

Proponente

    João Paulo Lopes de Meira Hergesel (PUC-Campinas)

Minicurrículo

    Professor permanente do Programa de Pós-Graduação em Linguagens, Mídia e Arte da Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas). Doutor em Comunicação (UAM), com pós-doutorado em Comunicação e Cultura (Uniso). Membro do grupo de pesquisa Entre(dis)cursos: sujeito e língua(gens). Participante da Rede Brasileira de Pesquisadores de Ficção Televisiva (Obitel Brasil) e da Red Iberoamericana de Investigación en Narrativas Audiovisuales (Red Inav).

Ficha do Trabalho

Título

    Meninos cuir na ficção televisiva infantojuvenil: Cyrus, de Andi Mack

Seminário

    Tenda Cuir

Formato

    Presencial

Resumo

    Como a ficção televisiva infantojuvenil vem construindo seus personagens cuir? O objetivo deste trabalho é discutir a construção do menino adolescente homossexual na série “Andi Mack” (Disney Channel, 2017-2019). O método utilizado é o da análise de personagens, focalizando quatro cenas protagonizadas por Cyrus Goodman. Os resultados apontaram que o garoto vai se sentindo confortável sobre si próprio e seus sentimentos ao receber apoio dos amigos.

Resumo expandido

    Durante décadas de produção audiovisual destinada a crianças e adolescentes na televisão mundial, os meninos dessa faixa etária foram retratados pela perspectiva do ideal da sociedade heteronormativa e patriarcal, seja com afecção ao esporte, seja com dedicação prioritária ao estudo formal. No campo dos sentimentos, eles sempre foram vistos ora como apaixonados por alguma amiga, ora como paqueradores das meninas que compõem seu círculo social.
    Em “Andi Mack” (Disney Channel, 2017-2019), Cyrus Goodman, de 12 anos, parecia seguir esse caminho, especialmente quando iniciou um namoro com Iris, colega de escola, somente para disfarçar os ciúmes que sentia com a aproximação de Andi e Jonah Beck. No entanto, no primeiro episódio da segunda temporada, um diálogo entre Cyrus e sua amiga Buffy Driscoll surpreendeu os telespectadores: o menino assume que se sente enciumado não por gostar de Andi, mas por gostar de Jonah.
    Com base em Cyrus, que se tornou “o primeiro personagem gay da Disney”, questiona-se: como a ficção televisiva infantojuvenil vem construindo seus personagens cuir? Com o objetivo de discutir a construção do menino adolescente homossexual na série “Andi Mack”, este trabalho engloba séries contemporâneas para o público mais jovem, representações dos adolescentes no audiovisual e relações entre os estudos cuir e a televisão.
    Pesquisas sobre narrativa infantojuvenil na televisão brasileira ainda são tímidas, tendo destaque as que focalizam a relação com a recepção (OROFINO, 2013; COUTINHO, 2009). Em diálogo com pesquisas internacionais sobre “séries teen”, vê-se que esse tipo de produção contribui para compreensão das identidades e vínculos emocionais de adolescentes (PASQUIER, 1996), além das imagens que são consumidas por esses telespectadores (GARCÍA-MUÑOZ; FEDELE, 2011).
    A adolescência consiste na fase da vida em que o indivíduo tem maturidade e visão crítica equivalentes às do adulto e é sugestionado a seguir condutas morais sob as quais cresce, especialmente da família e da escola (CALLIGARIS, 2000). Nessa fase, o sujeito intensifica sua reflexão sobre o mundo em que vive, as ações que o circundam, os comportamentos que as pessoas têm para com ele e os comportamentos que foi ensinado a ter (COELHO, 2000).
    Ao trazer à tela um pré-adolescente cuir, acreditamos haver um espaço de acolhimento para a criança ou o adolescente que assim se identifica e que se enxerga confinado “no claustro da heterossexualidade compulsória” (SOUZA; BRANDÃO, 2020, p. 134). Recorrendo a ideias precipuamente aplicadas ao cinema, nota-se, na existência de Cyrus, “uma proposta e um convite a acreditar no mundo, nos demorar nas paisagens afetivas e olhar para os nossos arquivos pessoais, revisá-los e trazer à tona o invisível” (RIBEIRO; ASSUNÇÃO, 2020, p. 86).
    Para realização deste trabalho, recorre-se à análise de personagens, com base nos estudos de narrativa audiovisual (BORDWELL; THOMPSON, 2013; BUTLER, 2018). Com a finalidade de aproveitar melhor o espaço do artigo e o tempo da apresentação, selecionamos quatro cenas como objetos de pesquisa: a em que Cyrus conta a Buffy que está gostando de Jonah; a em que ele, durante seu bar-mitzvá, conta a Andi que está apaixonado pelo amigo em comum (23/02/2018); a em que conta a Jonah sobre sua orientação sexual (08/02/2019); e a em que há a sugestão de um início de namoro entre ele e TJ (26/07/2019).
    Com base nas análises, pôde-se constatar que o personagem passa por um sofrimento inicial, mas que vai se sentindo confortável sobre si próprio e seus sentimentos ao receber apoio dos amigos, o que lhe permite ter segurança para falar abertamente sobre sua sexualidade e, posteriormente, envolver-se em um relacionamento afetivo com outro garoto. Esperamos que a ficção televisiva infantojuvenil continue abrindo diálogos que colaborem para a formação de cidadãos tolerantes e respeitosos à diversidade do contemporâneo, incluídas as questões que tangem à temática cuir.

Bibliografia

    BORDWELL, D.; THOMPSON, K. A arte do cinema. Campinas: Ed. da Unicamp; São Paulo: Ed. da USP, 2013.

    BUTLER, J. G. Television. 5. ed. Nova Iorque; Londres: Routledge, 2018.

    CALLIGARIS, C. A adolescência. São Paulo: Publifolha, 2014.

    COELHO, N. N. Literatura infantil. São Paulo: Ática, 2000.

    COUTINHO, L. M. Malhação e a representação midiática da juventude brasileira. Anais do 32º Congresso da Intercom. Curitiba, 2009.

    GARCÍA-MUÑOZ, N.; FEDELE, M. Television fiction series targeted at young audience: plots and conflicts portrayed in a teen serie. Comunicar, v. 19, n. 37, p. 133-140, 2011.

    OROFINO, M. I. R. Representações da infância na novela das 6h. Visão Global, v. 15, p. 257-268, 2013.

    PASQUIER, D. Teen Series Reception. Childhood, n. 3, v. 3, p. 351-373, 1996.

    RIBEIRO, V.; ASSUNÇÃO, D. P. Revides infantis. Rebeca, São Paulo, v. 9, n. 2, p. 81-97, 2020.

    SOUSA, R. L.; BRANDÃO, A. S. Inventário de uma infância sapatão em um mundo de imagens. Rebeh, v. 2, n. 3, p. 121-137, 2020.