Trabalhos Aprovados 2022

Ficha do Proponente

Proponente

    Hannah Serrat de Souza Santos (UFMG)

Minicurrículo

    Doutoranda pelo Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social da Universidade Federal de Minas Gerais (PPGCOM/UFMG). Mestre e Bacharel em Comunicação Social pela mesma instituição, interessada nos modos de aparição dos povos e espaços periféricos no cinema. Pesquisadora e crítica de cinema, integra o grupo de pesquisa Poéticas da Experiência (PPGCOM/UFMG). Atualmente, atua como produtora cultural no IFNMG Campus Diamantina.

Ficha do Trabalho

Título

    Por um olhar de superfície: uma abordagem sobre o cinema de Sissako

Formato

    Remoto

Resumo

    Tendo em vista a noção de "superfície da imagem”, utilizada para pensar fotografias pós-coloniais, traçamos uma aproximação junto ao cinema de Abderrahamane Sissako que retrata deslocamentos e trânsitos no oeste africano, mas também interessa-se por uma forma de mobilidade endereçada ao próprio olhar. Atentos a isto, buscamos desenvolver uma proposta metodológica de análise fílmica.

Resumo expandido

    O cinema de Abderrahmane Sissako, realizado sobretudo entre o Mali e a Mauritânia, dedica-se àqueles e àquelas que estão em trânsito, aos imigrantes e aos passantes. Em seus filmes, é preciso que o cinema disponha-se a operar deslocamentos e a propiciar encontros, mas também a manejar as distâncias e os intervalos que se constituem entre os sujeitos em um mundo que requer diferentes formas de coabitação. Assim, o cinema de Sissako, atravessado pela própria biografia do realizador, se atenta à complexidade das relações entre África e o Ocidente, o exterior e o interior. Destaca-se que, em todos os seus longas-metragens, a questão sobre a constituição do olhar e uma relação com diferentes modos de produção de imagens adquire uma importância fundamental pela qual este trabalho particularmente se interessa. Observamos que seus filmes, ao evocarem parte da história da fotografia no oeste africano de certo modo, convidam-nos a refletir não apenas sobre os deslocamentos e trânsitos dos personagens em cena, mas também a experimentar uma forma de mobilidade endereçada ao próprio olhar.

    Tendo em vista “as imagens que projetam uma materialidade de superfície”, tal como as fotografias pós-coloniais africanas que fazem uso de panos de fundo pintados à mão em sua composição, traçamos uma aproximação junto aos filmes de Sissako, considerando a própria alusão que Heremakono (Sissako, 2002), um de seus filmes, faz a este tipo de representação. Como propõe Olu Oguibe (apud Pinney, 2017, p. 314), “as práticas coloniais posicionavam pessoas e objetos em cena, procurando identidades estáveis em lugares de onde eles não poderiam escapar. A prática ‘pós-colonial’ nega isso, posicionando seus referentes em um lugar mais móvel na superfície”, recusando “a profundidade como característica dos regimes de representação coloniais” (PINNEY, 2017, p. 314). O olhar que se detém sobre a imagem que privilegia a superfície difere daquele que se volta para as imagens construídas sob o regime da perspectiva: estas, convocam um olhar exterior, como se elas só pudessem ser observadas de fora, enquanto aquelas nos convidam a percorrer o seu interior. Nesse sentido, diante dos filmes de Sissako, consideramos a necessidade de desenvolver um "olhar de superfície", a partir de uma proposta metodológica de análise fílmica que se interessa pelo modo de aparição política dos rostos, corpos e territórios no cinema do realizador.

    Considerando a recusa de Sissako em reiterar uma percepção fixa ou estável, cega à multiplicidade dos entornos e dos caminhos, buscamos desenvolver uma perspectiva analítica que não nos leve a destacar um figura ou um elemento capaz de adquirir protagonismo nos filmes, mas a nos mover diante da superfície material das imagens (a partir das operações de enquadramento, mise-en-scène e montagem) e apanhar, em meio a este gesto, algo também da superficialidade nas narrativas, das aparentes insignificâncias que nos convidam a recolocar o olhar e a escuta em movimento, a considerar as margens e as travessias como lócus privilegiado e profícuo de uma aparição política. A partir disso, propomos analisar alguns arranjos de imagens, compostos através da seleção de cenas dos filmes de Sissako que, nesse sentido, serão aproximados ao trabalho de fotógrafos africanos.

Bibliografia

    APPADURAI, Arjun. The colonial Backdrops. Afterimage, v. 24, n. 5, 1997.
    ARENDT, Hannah. A vida do espírito. Rio de Janeiro: Relume-Dumará, 1995.
    FANON, Frantz. Pele negra, máscaras brancas. Salvador: EDUFBA, 2008.
    LISSOVSKY, Maurício. O que fazem as fotografias quando não estamos olhando para elas?. In: Miguel Angel de Barrenechea. (Org.). As Dobras das Memória. 1ed.Rio de Janeiro: 7Letras, 2008, v. , p. 26-36.
    MBEMBE, Achille. Sair da grande noite. Ensaio sobre a África descolonizada. Luanda: Edições Mulemba, 2014.
    PINNEY, Christopher. Notas da superfície da imagem: fotografia, pós-colonialismo e modernismo vernacular. GIS – Gesto, Imagem e Som – Revista de Antropologia, São Paulo, v. 2, n. 1, 2017, p. 309-330. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/gis/article/view/129731. Último acesso: 23/03/21.
    OGUIBE, Olu. 1996. “Photography and the Substance of the Image”. In In/sight: African Photographers, 1940 to Present. New York: Guggenheim Museum.