Trabalhos Aprovados 2022

Ficha do Proponente

Proponente

    Gabriel Filgueira Marinho (ESPM)

Minicurrículo

    Documentarista pela Universidade de Brasília – UnB (2008), e mestre em História pela Universidade Federal Fluminense – UFF (2011), trabalha principalmente com imagens de arquivo como ferramenta narrativa como realizador de curtas, longas-metragens e séries documentais. Sua principal área de estudo relaciona os campos de memória e História, arquivos e memórias traumáticas. Atualmente é professor na ESPM lecionando nas áreas de televisão, cinema documentário e representatividade no Audiovisual.

Ficha do Trabalho

Título

    A memoria e a nostalgia nos arquivos afrodiasporicos

Seminário

    Outros Filmes

Formato

    Presencial

Resumo

    O agenciamento colonial na produção e nas políticas de conservação de imagens atravessa a realização dos documentários históricos onde a África é o centro narrativo. A partir da análise dos processos de migração e ressignificação, procuramos entender como dois diferentes documentaristas afrodiaspóricos lançam seu olhar para a História do líder da independência do Congo, Patrice Lumumba (1925-1961). Como o acesso ao mesmo escasso material iconográfico, gera duas narrativas-memória distintas.

Resumo expandido

    Os arquivos de imagem e som ocupam um papel de relevância na realização de documentários históricos no mundo ocidental. O uso desse recurso por realizadores de diferentes nacionalidades sugere sua potência na construção de narrativas-memória no audiovisual e na consolidação de uma cultura histórica. Sobretudo na consolidação de uma identidade nacional. Assim, a produção e circulação desses filmes e séries oferece ao passado rostos, texturas e gestos que ocupam o imaginário coletivo.
    Para muitos dos realizadores dedicados a esses filmes, o acesso ao recurso dos arquivos é atravessado por problemáticas como preservação, políticas culturais locais e questões comerciais que envolvem as instituições de memória – notadamente cinematecas, arquivos públicos e cedocs. Esses são os temas comuns nos círculos de debate de realizadores e pesquisadores desses filmes.
    Além desses, outros atravessamentos atingem os cineastas afrodiaspóricos na (tentativa de) construção de narrativas-memória sobre o continente africano. Os problemas aqui têm outra ordem e passam pela escassez de imagens produzidas, a descentralização das fontes (espalhadas por diferentes países com os quais as nações africanas possuíam um passado colonial) e a não-indexação de corpos negros nesses espaços de conservação.

    Esse estado-das-coisas influenciou as narrativas-memória afrodiaspóricas a tomarem outros caminhos para consolidarem uma iconografia do passado do continente. Um percurso que passa pelo uso mais destacado de acervos familiares e pessoais (carregados com a chancela de filme-amador), a oralidade e o reuso dos mesmos arquivos ao longo da narrativa. Notadamente essas articulações de linguagem também fazem parte da gramática dos documentários históricos produzidos em centros hegemônicos, mas de forma pouco destacada. Aqui eles parecem ganhar uma outra dimensão e talvez se tornem marcas de linguagem.

    A partir desse cenário, esse trabalho busca analisar a construção da memória do líder congolês Patrice Lumumba (1925-1961) em documentários históricos de dois diferentes cineastas afrodiaspóricos. E estudar de forma comparativa como se deu o trabalho de acesso aos acervos e o uso dessas fontes para construir

    Em 2018, o cineasta Patrick Kabeya realizou seu segundo longa-metragem “De Patrice a Lumumba”, uma narrativa que se utiliza da carta pessoal do líder político para sua esposa, Pauline Opango, como fio condutor de um filme que mescla memórias pessoais e afetivas com a conquista da independência do país do controle da Bélgica. Aqui são as fotos do contexto privado e os acervos de família que constituem a natureza principal desses arquivos politicos. A História se fazendo nas reuniões em família.

    Já em 2010 foi lançada a série televisiva belga “Kongo: 50 years of independence” em três episódios de 52 minutos cada. Produzida por entidades de diferentes países europeus, seu segundo episódio conta com a direção do inglês afrodiaspórico Daniel Cattier e destaca justamente o período colonial do pais centro-africano até sua independência. Seu olhar sobre o pais que até então nunca tinha estado explora principalmente a história oral e uma articulação não-evidente com as imagens de cobertura, construindo associações mais simbólicas.

    O estudo comparado dessas narrativas revela diferentes graus de acesso aos acervos imagéticos de Patrice Lumumba e de outros nomes que constituem a constelação de personagens da independência do antigo Congo Belga. Além disso, também aponta como esses realizadores desenvolveram metáforas visuais pouco-usais a partir desses acessos limitados aos arquivos, indo para além das relações de redundância (quando as imagens reafirmam o texto de voz over ou voz off) tão comuns em filmes dessa natureza. Nossa primeira aproximação desses títulos, sugerem outras metáforas como visuais como metonímias, alegorias, anacronismos e anacolutos. Seria esse um traço distintivo do uso de arquivos nesses documentários?

Bibliografia

    BARON, Jaimie. The Archive Effect: found footage and the audiovisual experience of history. London and New York: Routledge, 2014.

    LEYDA, Jay. Film beget films: a study of the compilation film. New York: Hill and Wang, 1964.

    BERNARDET, Jean-Claude. A Migração de imagens in TEIXEIRA, Francisco Ilinaldo (org.) “Documentário no Brasil: tradição e transformação”. São Paulo: Summus, 2004

    BOYM, Svetlana. The Future of Nostalgia. BASIC BOOKS: New York, 2002.

    ZRYD, Micheal. Found Footage Film as Discursive Metahistory: Craig Baldwing’s Tribulation 99. In The Moving Image, Volume 3, Number 2, Fall 2003. University of Minnesota Press. pp. 40-61 (Article)