Trabalhos Aprovados 2022

Ficha do Proponente

Proponente

    Arlindo Rebechi Junior (UNESP)

Minicurrículo

    Doutor e mestre em Letras pelo programa de Literatura Brasileira, da Universidade de São Paulo (USP). Graduado em Comunicação Social pela Universidade Estadual Paulista (UNESP). É professor do Departamento de Ciências Humanas e docente permanente do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação, da UNESP, câmpus de Bauru (SP).

Ficha do Trabalho

Título

    Filmes de viagem e o olhar estrangeiro

Seminário

    Outros Filmes

Formato

    Presencial

Resumo

    Esta comunicação mobiliza as filmagens de viajantes-cinegrafistas estrangeiros, dentro de um contexto colonial, para discutir as formas de apropriação, disciplinarização e construção imaginária sobre o outro. Para promover essa discussão, este trabalho pretende percorrer os filmes de viagens de duas companhias surgidas ao redor de duas grandes figuras do primeiro cinema: Charles Urban e Burton Holmes.

Resumo expandido

    Em um quadro de produção e recepção de imagens em movimento do primeiro cinema, uma forma recorrente tornou-se bastante popular: os filmes de viagem ou também chamados de travelogues. Sua ampla difusão, sobretudo em centros europeus e norte-americanos, deveu-se tanto aos exibidores, que tinham grande interesse pela sua programação em salas, como pelo grande interesse de um público urbano por paisagens desconhecidas e representações de lugares mais distantes (Musser, 1990).
    Os filmes de viagem estavam inseridos nas tradições das narrativas literárias de viagem. Estas, por sua vez, tiveram grande impulso com o trabalho efetivado pelos viajantes naturalistas. Vindo de várias partes da Europa e ligados a vários ramos do conhecimento que se produzia nos séculos XVIII e no século XIX, tais viajantes foram responsáveis, em lugares de franco domínio colonizador europeu, em criar representações literárias, coletar registros de um novo mundo e representar pela forma pictórica os espaços, os hábitos, as pessoas e um mundo natural que em nada tinha a ver com o que as populações urbanas do hemisfério norte conheciam.
    Ao longo do século XIX, já com o uso de tecnologias de representação fotográfica, as narrativas de viagem aproximaram-se de práticas de representação mais espetacularizadas, já sendo comum o uso de imagens de lugares distantes em palestras ilustradas direcionadas a um público urbano que, de modo geral, poucas chances teria de conhecer territórios tão distantes. A aparição do registro de imagens em movimento permitiu, dentro dessa tradição, não só uma nova forma de explorar e exibir um universo desconhecido de hábitos, de gente e de espacialidades demarcadas, mas uma nova forma de pensar, conceber, representar e imaginar – e mesmo disciplinar e governar – o outro e o seu território.
    No período das experiências do primeiro cinema, o mundo distante tornou-se também um interesse mercantil no emergente mercado de exibições que se formava. Viajantes-cinegrafistas europeus e norte-americanos produziram registros, sob a forma de filmes de viagens, que correspondiam também a uma forma de apropriação do mundo alheio (Gunning, 1995), num tipo de experiência que remete a olhares diretamente ligados à assimetria colonizador-colonizado.
    Esta comunicação mobiliza as filmagens de viajantes-cinegrafistas estrangeiros, dentro do contexto mais imediato das experiências do primeiro cinema em territórios resultantes da colonização ou ainda colonizados, para discutir as formas de apropriação, disciplinarização e construção imaginária sobre o outro. Para promover essa discussão, este trabalho pretende percorrer os filmes de viagens e suas práticas subjacentes diretamente ligados e produzidos dentro dessa temática, vindos, em especial, de duas companhias que surgiram em torno de duas grandes figuras do primeiro cinema: Charles Urban e Burton Holmes. Estimulado pelas ideias de Edward Said, de Orientalismo (1978), parte-se da seguinte premissa para essa investigação: só é possível compreender a maneira com que europeus e norte-americanos construíram um olhar sistemático e disciplinado para manejar saberes e controlar e produzir um mundo distante, resultado da colonização, se compreendermos como seus próprios discursos comportam e estabelecem um visão distintamente ontológica, racial e epistemológica entre o que eles supõe ser e o que nós somos para eles.

Bibliografia

    BARBER, X.Theodore. The Roots of Travel Cinema: John L.Stoddard, E.Burton Holmes and the Nineteenth-Century Illustrated Travel Lecture. Film History, n. 5, v.1, p. 68–84, 1993.

    GUNNING, Tom. The Whole World Within Reach: Travel Images Without Borders. In: COSANDEY, Roland; ALBERA, François (Eds.). Cinema sans frontières 1896–1918: Images Without Borders. Lausanne: Payot, 1995. p. 21-36.

    MUSSER, Charles. The Travel Genre in 1903–1904: Moving Towards Fictional Narrative. In: ELSAESSER, Thomas (Ed.). Early Cinema: Space, Frame, Narrative. London: British Film Institute, 1990. p. 123-132.

    PETERSON, Jennifer Lynn. Making the World Exotic: Travelogue and Silent Non-Fiction Film. Durham: Duke University Press, 2004.

    SAID, Edward. Orientalismo: o Oriente como invenção do Ocidente. Trad. Rosaura Eichenberg. São Paulo: Companhia das Letras, 2007 [1978].