Trabalhos Aprovados 2022

Ficha do Proponente

Proponente

    Silvia Okumura Hayashi (FAAP)

Minicurrículo

    Silvia Hayashi é doutora em Meios e Processos Audiovisuais (Universidade de São Paulo – Escola de Comunicações e Artes). Foi bolsista da CAPES e pesquisadora visitante na York University (Toronto, Canadá). Trabalha como montadora e realizadora de projetos audiovisuais. Foi professora temporária do Curso Superior do Audiovisual da ECA-USP. É professora de montagem do curso de Cinema da Fundação Armando Álvares Penteado.

Ficha do Trabalho

Título

    Espaço negativo – matéria, tempo e a inscrição da luz no cinema

Seminário

    Montagem Audiovisual: Reflexões e Experiências

Formato

    Presencial

Resumo

    Filmes produzidos em celulóide não desapareceram da produção cinematográfica mesmo com o desenvolvimento de câmeras de cinematografia digital de alta resolução. Este trabalho reflete sobre a persistência no uso do celulóide na produção cinematográfica recente e sobre os pontos de contato e conflito entre os processos analógico e digital de produção de imagens, com ênfase no processo de inscrição da luz e o registro do tempo no cinema.

Resumo expandido

    Em Afterward: A Matter of Time: Analog Versus Digital, the Perennial Question of Shifting Technology and Its Implications for an Experimental Filmmaker’s Odyssey, Babette Mangolte descreve a percepção de uma fotógrafa e realizadora de filmes experimentais sobre um evento então recente no cenário tecnológico do cinema: o surgimento das câmeras digitais destinadas à produção cinematográfica. Examinando as diferenças nas formas de gravação de imagem analógica (celulóide revestido com emulsão de sais de prata) e digital (sensor com um grid de pixels), Mangolte reflete sobre as diferentes formas de gravação do tempo nos suportes analógico e digital e sobre as afinidades e disparidades desses suportes de gravação com a experiência do tempo. Nas duas últimas décadas o desaparecimento do celulóide na produção audiovisual é uma profecia nunca cumprida. As impressões digitais do celulóide estão por toda a parte no audiovisual contemporâneo. Produções cinematográficas Hollywoodianas filmadas e até mesmo projetadas em celulóide são listadas ano a ano e os títulos que fazem parte dessas compilações abarcam títulos dos mais importantes para a indústria cinematográfica, de Star Wars Episódio VII – O Despertar da Força (2015) a 007 – Sem tempo para morrer (2021), passando pela filmografia recente de Paul Thomas Anderson e Christopher Nolan, fazendo do celulóide o protagonista de toda uma leva de filmes recentes. Fora do cenário da indústria estadunidense, o celulóide está presente também em filmes da tradição autoral do cinema. Boa parte da filmografia recente de Mia Hansen- Løve, Apichatpong Werasetakul ou Luca di Guadagnino foi gravada em filme. O uso direto do celulóide é o viés mais visível de uma cultura cinematográfica que tem o processo fotoquímico como base, mesmo com a progressiva migração para equipamentos de gravação e pós-produção digitais. No workflow ou pipeline de produção de filmes digitais, os rastros da cultura analógica podem ser encontrados por toda a parte, do uso do ISO como forma de definir a sensibilidade do material de gravação ao procedimento de “revelação digital” para a visualização de imagens gravadas em arquivos digitais RAW. A transposição da produção cinematográfica para a mídia digital motivou a Academy of Motion Pictures Arts and Sciences a estabelecer um protocolo de trabalho com arquivos digitais que tem como uma das diretrizes a produção de cópias de segurança em filme 35mm para a preservação de filmes realizados digitalmente. Estes são apenas alguns exemplos da intensa convivência entre as mídias analógicas e digitais na produção cinematográfica contemporânea. A persistência do celulóide na parte mais prestigiosa do cinema, seja pelo viés econômico ou do reconhecimento canônico, deixa entrever a importância do material de gravação e do visual específico que dela decorre. Num universo audiovisual onde o produto mais comum é produzido digitalmente e onde a criação e veiculação de imagens digitais precárias pode ser feita por quase qualquer um (STEYERL, 2012) o uso do celulóide como forma de diferenciar produtos audiovisuais pode ser vista como uma estratégia de mercado. A questão puramente comercial, a do produto especial, não dá conta por completo do que está em jogo no uso do celulóide para captura de imagens. Damon Krukowski, ao analisar as vidas analógica e digital do áudio aponta mudanças na nossa percepção do tempo, espaço, amor, dinheiro e poder (KRUKOWSKI, 2019) decorrentes da desmaterialização da música, e o mesmo poderia ser levado ao campo audiovisual. No jogo de luzes e sombras analógicas e digitais, filme e mídia digital são ordens temporais com implicações políticas e estéticas (CUBITT, 2014) que mediam o nosso fascínio por um pré-cinema digital e um pós-cinema digital híbrido no qual coexistem o celulóide, a emulsão, sensores, pixel grids, projetores e monitores.

Bibliografia

    MANGOLTE, Babette. Afterward: A Matter of Time: Analog Versus Digital, the Perennial Question of Shifting Technology and Its Implications for an Experimental Filmmaker’s Odyssey in Camera Obscura, Camera Lucida Essays in Honor of Annette Michelson , pp. 261 – 274. Amsterdam: Amsterdam University Press
    CUBBIT, Sean. The Practice of Light: A Genealogy of Visual Technologies from Prints to Pixels. Cambridge: MIT Press, 2014.
    ERNST, Wolfgang Digital Memory and The Archive, Minneapolis: University of Minnesota Press, 2013.
    KRUKOWSKI, Damon. Ways of Hearing. Cambridge: MIT Press, 2019.
    MICHELSON, Annette and WHITE, Kenneth. Michael Snow October Files. Cambridge. MIT Press, 2019.
    STEYERL, Hito. The Wretched of the Screen. Berlin, Sternberg Press, 2012.