Trabalhos Aprovados 2022

Ficha do Proponente

Proponente

    EDUARDO CHATAGNIER BORGES PEREZ (USP)

Minicurrículo

    É mestre em História, Teoria e Crítica Cinematográfica na USP, sob orientação do Professor Doutor Cristian da Silva Borges, tendo feito graduação em Audiovisual na mesma universidade (2011). Sua dissertação versa sobre o cinema de Apichatpong a partir da investigação das estruturas narrativas orais e das consequência temporais que tais estruturas acarretam na forma/política cinematográfica. Áreas de interesses : tempo, memória, oralidade, perspectivismo e psicanálise.

Ficha do Trabalho

Título

    No tempo da oralidade: estética e crítica em Apichatpong

Seminário

    Cinemas pós-coloniais e periféricos

Formato

    Presencial

Resumo

    Debruçados sobre os filmes Misterioso Objeto ao Meio Dia e Eternamente Sua de Apichatpong Weerasethakul, refletimos sobre o papel da oralidade e sua decorrente “movência” na obra do diretor, que acarreta na criação de “temporalidades imiscíveis” e diferentes perspectivas que desestabilizam a ideia de um narrador central, bem como desafiam o próprio aparato de registro do qual os filmes são, inevitavelmente, cria.

Resumo expandido

    A presente proposta aborda a estratégia de diluição do narrador no filme Misterioso Objeto ao Meio Dia, do diretor tailandês Apichatpong Weerasethakul. Ao estruturar seu filme a partir de histórias inventadas e contadas por aldeões entrevistados por toda Tailândia, ele propõe um questionamento sobre verdade e realismo no entrecruzamento de documentário e ficção. Pautado em narrativas orais, o filme incorpora ainda estratégias construtivas que opõem-se à rigidez causal da escrita, permitindo uma reflexão sobre a transitoriedade inerente ao discurso e levantando questões que tangenciam a problemática do lugar de fala.

    Utilizando-nos do conceito de “movência”, trabalhado por Paul Zumthor, buscaremos refletir sobre a flexibilização temporal e narrativa que o primeiro longa metragem de Apichatpong propõe ao incorporar o processo errante do filme em sua forma final. Mais ainda, ao fazer da errância sua principal linha de sustentação, o filme se abre para diferentes perspectivas (Eduardo Viveiros de Castro), e tenciona, por um lado, o cinema etnográfico clássico ao deslocar seu ponto de interesse para as formas narrativas latentes e não para os conteúdos manifestos passíveis de registro imediato e, por outro, liberando a própria forma cinematográfica de sua duração final e fatal determinada pela duração cronológica da obra ao instituir um espaço-tempo flexível, determinado pela percepção individual de cada um, ao fazer da memória, e não do registro, o grande elemento organizador do filme.

    Reencarnada agora em forma trabalhada e premeditada, o segundo longa-metragem do diretor, sua primeira ficção, vê as estratégias construtivas do primeiro filme reencarnadas em um duplo bem acabado mais identificável, muito embora não sem suas tensões, enquanto estrutura própriamente ficcional. Eternamente Sua, conta a história de Roong e Min, um casal que foge da vida opressiva da cidade para uma tarde amorosa na floresta.

    O filme, em sua beleza e tensão, já não se vale da explicitação da sua forma de construção, mas incorpora a latência adquirida 100% em sua forma. O deslocamento narrativo se dá, dessa vez, pela surpresa e pela duração (Henry Bergson), que abrem espaço para o surgimento de temporalidades específicas e não utilitárias, “temporalidades imiscíveis” (Cua Bliss Lim) que se encontram e se chocam no ambiente da floresta. Desse choques advém boa parte da força política, da crítica ao colonialismo, da reflexão sobre a autonomia de modos de vida não dominantes, que se faz presente por toda obra do cineasta.

Bibliografia

    ALCOFF, Linda. The Problem of Speaking for Others. Cultural Critique, nº20, Inverno. 1991-1992
    BERGSON, Henri. O Pensamento e o Movente. São Paulo: Martins Fontes, 2006
    BORDELEAU, Érik, et al. Nocturnal Fabulations: Ecology, Vitality, and Opacity in the Cinema of Apichatpong Weerasethakul. Londres: Open Humanities Press, 2017
    INGAWANIJ, May Adadol. Blissfully Whose? Jungle Pleasures, Ultra-modernist Cinema and the Cosmopolitan Thai Auteur. The Ambiguous Allure of the West. Cornell: Cornell University Press, 2018
    LIM, Cua Bliss. Translating Time: Cinema, the Fantastic and Temporal Critique. Duke University Press. Durham e Londres: Duke University Press, 2009
    RITHDEE, Kong. Filming Locally, Thinking Globally: The Search for Roots in Contemporary Thai Cinema. Cinéaste. Cineaste Publisher, 2011
    VIVEIROS DE CASTRO, Eduardo. A Floresta de Cristal. Cadernos de Campo, nº14/15. São Paulo: Universidade de São Paulo, 2006
    ZUMTHOR, Paul. Introdução à Poesia Oral. São Paulo: Hucitec, 1997