Trabalhos Aprovados 2022

Ficha do Proponente

Proponente

    Letícia Coelho Lenz Cesar (UFF)

Minicurrículo

    Graduada em Cinema e Audiovisual pela Universidade Federal do Ceará (2017). Possui pós-graduação MBA em Direção de Arte para Propaganda, TV e Vídeo pela Universidade Estácio de Sá (2020). Atualmente é mestranda do programa de pós-graduação em Cinema e Audiovisual da Universidade Federal Fluminense. Exerceu o cargo de professora substituta do Curso de Cinema e Audiovisual da Universidade Federal do Ceará na área de Som/Realização entre 2018 e 2020.

Ficha do Trabalho

Título

    Perdi meu corpo: O uso de alegorias nas narrativas animadas.

Formato

    Presencial

Resumo

    Este trabalho realiza uma reflexão acerca da alegoria presente no cinema animado, aplicando-a na análise da narrativa do filme Perdi Meu Corpo, do diretor Jérémy Clapin. A pesquisa é executada a partir de uma revisão bibliográfica analítica concentrada no campo de estudo da animação, partindo da hipótese de que a animação é um campo fértil para trabalhar narrativas alegóricas. Conclui-se que a subversão da realidade e uso do fantástico favorecem o uso de alegorias no cinema animado.

Resumo expandido

    A presente pesquisa trata do uso de alegorias nas narrativas animadas. Primeiramente, é importante destacar que a interpretação alegórica populariza-se ainda na Grécia Antiga. Para os antigos filósofos, certos textos eram demasiadamente fantasiosos e, portanto, a aceitação da sua literalidade era absurda, de forma que se passou a buscar os sentidos ocultos e mais profundos que estariam por trás da sua significação. Nesse sentido, a autora Susan Sontag acrescenta:
    A interpretação, portanto, pressupõe uma discrepância entre o claro significado do texto e as exigências dos leitores (posteriores). Ela tenta solucionar essa discrepância. O que ocorre é que, por alguma razão, um texto se tornou inaceitável, entretanto não pode ser desprezado. A interpretação é uma estratégia radical para a conservação de um texto antigo, considerado demasiado precioso para ser repudiado, mediante sua recomposição. O intérprete, sem na realidade apagar ou reescrever o texto, acaba alterando-o. Porém ele não admite isso. Ele afirma que pretende apenas torná-lo inteligível, revelando seu verdadeiro sentido. (SONTAG,1987, p.3).
    Dessa forma, entende-se que a interpretação alegórica passa a ser utilizada quando não se pode, ou não se quer, considerar o sentido literal como único, ou como verídico e, portanto, busca-se novos significados para atribuir ao texto. Por outro lado, o uso intencional de alegorias nas artes cresceu ao longo da história como modo de expor a visão subjetiva do autor.
    Nesse sentido, a construção da linguagem cinematográfica herdou também o uso de metáforas e alegorias, previamente exploradas nas outras formas de arte. O cinema de animação, em especial, carrega consigo o potencial alegórico do cinema e o transcende na construção de mundos que contém as suas realidades próprias. O uso de alegorias e metáforas nas narrativas animadas tornou-se frequente como forma de referir-se a problemas políticos e sociais, ou a temas abstratos para os quais não é possível atribuir uma forma física.
    Além disso, a animação, desde os seus primórdios, possui como característica uma capacidade subversiva amplamente aceita pelo público. Na narrativa animada, o fantástico e as metamorfoses atuam como leis naturais, dissipando qualquer incredulidade ou distanciamento entre a obra e o espectador. Para Magalhães (2015, p.66) “o animador cria novos caminhos, ele brinca com o real. Ele observa a realidade com a intenção de recriar, modificar, subverter.” Ademais, Paul Wells afirma:
    “O filme de animação permite que o (s) cineasta (s) sejam mais expressivos e, portanto, mais subversivo do que é prontamente reconhecido. Quase conscientemente, os animadores, ao constatar que eles, e seus trabalhos, são marginalizados e/ou destinados a públicos inocentes, inapropriados ou acidentais, usam este espaço aparentemente desguardado para criar filmes com prazeres superficiais e profundidades ocultas.” (WELLS, 1998, p.6)
    O filme Perdi Meu Corpo (2019), do diretor Jérémy Clapin, parte de uma estética realista no que se refere a formas e movimentos, mas se utiliza de uma narrativa fantástica, na qual uma mão decepada parte em busca de seu dono pelas ruas de Paris. Permeando diversos temas, a animação fala principalmente sobre conexão, mesmo que isso nunca seja mencionado de forma direta. A temática central fica evidente para o espectador quando o filme narra a história de afetos de um jovem francês, enquanto mostra, de forma paralela, a jornada de sua mão em busca de conectar-se novamente com o seu corpo.
    Assim, o uso da alegoria na narrativa animada de Perdi Meu Corpo busca situar o público dentro do tema abstrato, a partir dos diversos recursos que já foram mencionados anteriormente. A alegoria funciona de forma ainda mais efetiva na animação porque o recurso do fantástico para evocar certas ideias não causa estranhamento na audiência, pelo contrário, a fortalece, fato que poderia enfrentar mais resistência em um cinema live action.

Bibliografia

    MAGALHÃES, Marcos Amarante de Almeida. O tempo do animador. Rio de Janeiro, 2015. 115 f. Tese (Doutorado em Design) – Departamento de Artes & Design, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, 2015.
    SONTAG, Susan. Contra a interpretação. In: SONTAG, Susan. Contra a interpretação. Porto Alegre: Editora L&PM, 1987.
    WELLS, Paul. Understanding Animation. Routledge. 1998