Trabalhos Aprovados 2022

Ficha do Proponente

Proponente

    Ana Maria Acker (ULBRA / Uniasselvi)

Minicurrículo

    Doutora em Comunicação e Informação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS e mestra pela mesma instituição. Professora e coordenadora do curso de Jornalismo EaD da Universidade Luterana do Brasil – ULBRA. Docente EaD no Centro Universitário Leonardo Da Vinci – Uniasselvi. É bacharela em Comunicação Social – Jornalismo e especialista em Cinema pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos. Autora do livro Experiências estéticas do futebol no cinema brasileiro, Ed. Appris.

Ficha do Trabalho

Título

    Imagens do Brasil em latência no filme Os Jovens Baumann

Mesa

    Estudos do horror contemporâneo

Formato

    Presencial

Resumo

    A proposta investiga o filme Os Jovens Baumann (2018), de Bruna Carvalho Almeida, por meio da relação entre found footage, memória (HUYSSEN, 2014) e aparatos antigos de captação de imagens. Partimos do pressuposto que tais elementos narrativos e estéticos deslocam a obra, que se passa em 1992, para uma discussão política acerca do Brasil contemporâneo, a percepção de um país em latência (GUMBRECHT, 2014) cujas cicatrizes do passado emergem em espectros difusos, envoltos em glitches de VHS.

Resumo expandido

    A exploração do VHS nos filmes de horror found footage merece uma análise particular por conta da conexão entre essas imagens e os filmes avant-garde ou videoarte. Podemos notar que os filmes de horror mais experimentais das últimas duas décadas são aqueles que exploram as potencialidades do vídeo, erros, glitches e ruídos. A experiência estética com o VHS ou a simulação desta aborda diferentes sensações comparadas às das narrativas digitais de outros dispositivos, como smartphones, webcams ou câmeras de vigilância (ACKER, 2017). A memória é um aspecto importante e o filme Os Jovens Baumann (2018), dirigido por Bruna Carvalho Almeida, tenta evocar o passado ao debate do Brasil contemporâneo, um país em suspensão, latência. O found footage de horror, no qual a obra em análise se enquadra, é um estilo ou subgênero que simula documentário e, às vezes, tentar aplicar truques com a audiência sobre a origem ontológica das imagens e sons (CARREIRO, 2013).
    O filme tem uma trama recorrente nesse modo de produção: membros de uma família, jovens primos, gravam as férias, eventos estranhos acontecem e, depois disso, todos desaparecem. Os personagens costumavam passar os verões em uma grande fazenda de café em Santa Rita d’Oeste, cidade de São Paulo, próxima à divisa com Minas Gerais. O sobrenome Baumann era poderoso e simbolizava uma distinção entre pessoas muito ricas, a elite e as raízes desta com o passado escravocrata do Brasil – informação que acessamos pela voz over. A narradora conta que encontrou os primos quando menina e se lembra deles 25 anos depois. O pai dela, encanador, havia ido até a casa para fazer um reparo e ela ficou impressionada com a imponência da propriedade.
    O ano em que o filme se passa, 1992, é emblemático para a história brasileira: o primeiro presidente eleito após 21 anos de ditadura, Fernando Collor de Mello, renuncia em meio a um processo de Impeachment. Os Jovens Baumann traz a ambiência de desilusão e desesperança de um país em suspensão – um lugar que nunca alcança o futuro porque não consegue restaurar problemas e traumas do passado.
    Essas imagens antigas não acessam uma memória nostálgica (HUYSSEN, 2014). O propósito é causar desconforto e nos levar a uma sensação de suspensão, latência (GUMBRECHT, 2014), conectando 1992 a 2018 – o Brasil do presidente Collor ao de Jair Bolsonaro. Assim, o arcaísmo do filme se assemelha ao da política nacional no ambiente digital.
    A narrativa evidencia a atmosfera documental da obra, algo comum aos found footage de horror. Laura Cánepa (2020) observa que a trama de Almeida é singular no contexto do cinema de horror brasileiro e discute o filme por três aspectos: 1) a reconstituição da década de 1990; 2) as características fragmentadas e enigmáticas das imagens em VHS; 3) a narração, em voz over, em primeira pessoa, por meio de uma simulação de documentário (CÁNEPA, 2020, p. 171). Nesta proposta, focamos a análise nos aspectos um e dois, reconfigurando a relação entre found footage, memória e aparatos antigos de captação reprodução de imagens. Partimos do pressuposto que tais elementos narrativos e estéticos deslocam Os Jovens Baumann para uma discussão política acerca do Brasil atual, a percepção de um país em latência cujas cicatrizes do passado emergem como espectros difusos, envoltos em glitches de VHS.
    O filme desvela diferenças entre classes, questões econômicas, sociais, culturais e raciais. Todavia, para se entender o que é consciência de classe, é necessário ultrapassar a área econômica e incluir aspectos mais amplos (SOUZA, 2017, p. 88). Os primos representam a classe média alta, mas não se veem assim, um fenômeno comum na sociedade brasileira e que as imagens em VHS elaboram por meio dos fragmentos de memória e estética retrô. A produção causa ainda estranhamento e nos instiga acerca de uma percepção que circula nas camadas sociais que detêm o poder desde o passado até a contemporaneidade – o horror se dá justamente nessas reflexões sobre o país.

Bibliografia

    ACKER, Ana Maria. O dispositivo do olhar no cinema de horror found footage. Tese (doutorado), PPGCOM, Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Abr., 2017.

    CÁNEPA, Laura Loguercio. Os Jovens Baumann e o filme encontrado: estratégia singular na ficção de horror brasileira. Mídia e Cotidiano. Volume 14, Número 3, set./dez. de 2020.

    CARREIRO, Rodrigo. A Câmera diegética: legibilidade narrativa e verossimilhança documental em falsos found footage de horror. Revista Significação, v. 40, n. 40, 2013, pp. 224-244.

    GUMBRECHT, Hans Ulrich. Depois de 1945: latência como origem do presente. São Paulo: Editora UNESP, 2014.

    HELLER-NICHOLAS, Alexandra. Found footage horror films: fear and the appearance of reality. Jefferson, NC: McFarland, 2014.

    HUYSSEN, Andreas. Culturas do passado-presente. Rio de Janeiro: Contraponto: Museu de Arte do Rio, 2014.

    SOUZA, Jessé. A Elite do Atraso: da escravidão à Lava-Jato. Rio de Janeiro: Leya, 2017.