Trabalhos Aprovados 2022

Ficha do Proponente

Proponente

    Noah Mancini (UNESPAR)

Minicurrículo

    Nascido em 1996, Noah trabalha como cineasta e crítico. É colunista da Revista Desvio (EBA – UFRJ), técnico em Confecção e Moda pelo SENAI MG, Bacharel Interdisciplinar em Artes e Design pela UFJF e Mestrando em Cinema e Artes do Vídeo pela UNESPAR (Bolsista CAPES).
    Entre seus trabalhos recentes se destacam: Produção executiva do álbum Mavamba, de MC Xuxú; Menção Honrosa com o filme Socialights | Jorge Lafond pela Jornada de Antropologia da UNICAMP.

Ficha do Trabalho

Título

    O afrofuturismo presente no videoclipe “Liberdade”, de MC Xuxú

Formato

    Remoto

Resumo

    O presente estudo propõe-se a analisar as características afrofuturistas presentes no videoclipe “Liberdade”, da artista MC Xuxú. O texto buscará tratar onde, quais, e como as ações de aquilombamento contemporâneo que reivindicam outros futuros para corpos marginalizados podem ser exercidas no audiovisual. Os conceitos de afrofuturismo partirão de Kênia Freitas, Ytasha Womack e Mark Dery, enquanto noções de linguagem serão tomadas de Jean-Claude Bernadet e Décio Pignatari.

Resumo expandido

    Introdução

    O texto trata aspectos do afrofuturismo presentes no videoclipe “Liberdade”, da cantora travesti MC Xuxú. O clipe se ambienta em três momentos: uma sala de aula, uma dimensão extraterrena e em imagens de arquivo. O começo do vídeo é na sala. Nela, a professora leciona sobre Egito Antigo. Dado momento, a aluna (protagonizada por Xuxú) dorme. Adormecendo, é transportada para um sonho: veste um macacão de astronauta, junto a outras pessoas que também habitam esse cosmos.

    O que a gente vê e faz num sonho não é real, mas isso só se sabe depois, quando acordamos. Enquanto dura o sonho, pensamos que é verdade. Essa ilusão de verdade, que se chama impressão de realidade, foi provavelmente a base do grande sucesso do cinema. (BERNARDET, 2000, p.12).

    Com certa estética futurista, elenco majoritariamente com pessoas negras, adornos que dialogam com motivos étnicos (o olho de Hórus em um dançarino e os colares de Xuxú), a visualidade do clipe acaba se atrelando a poéticas do afrofuturismo, “que se apropria de imagens de tecnologia e futuro protético aprimorado – pode, por falta de um termo melhor, ser chamado de Afrofuturismo” (DERY, 1994, p.180).

    Em meio ao universo onírico, são inseridos vídeos de personalidades históricas da luta LGBTQI+ brasileira, com ênfase em pessoas transexuais, sendo estas, em ordem de aparição: Lacraia, João Nery, Cláudia Wonder, Tynna Medsan, Theusa Passarelli, Luana Muniz, Mulher Banana, Rogéria e Jorge Lafond. No momento que as mesmas aparecem, há uma mudança da proporção de tela para 4:1, o formato Polyvision.

    O Afrofuturismo combina elementos da ficção científica, da ficção histórica, da ficção especulativa, da fantasia, do afrocentrismo e do realismo mágico com crenças não ocidentais. Em alguns casos, é uma reelaboração total do passado e uma especulação do futuro repleta de críticas culturais. (WOMACK, 2015, p. 26)

    É interessante que mesmo com a visualidade atrelada a noções de avanço tecnológico industrial, os grafismos que por vezes são aplicados à tela, retomam traços de ancestralidade. Na coreografia, movimentos orgânicos imprimem a densidade da fumaça no ar, remetendo a um estado gravitacional outro.

    Nesse sentido, acessar o universo narrativo das obras afrofuturistas é lidar concomitantemente com a sua dupla natureza: a da criação artística que une a discussão racial ao universo do sci-fi e a da própria experiência da população negra como uma ficção absurda do cotidiano: uma distopia do presente. (FREITAS; MESSIAS, 2018, p. 8)

    A palavra “Liberdade”, título da canção, atrelada à historia da população negra como um direito ainda não conquistado – mesmo na contemporaneidade – é trazida em contexto de aquilombamento. É na afirmação da vida de corpos marginalizados, seja na memória ou enquanto corpo presente, que Xuxú simboliza outros finais possíveis.

    Metodologia

    Questões relacionadas à estética do filme, como proporções de tela, figurino, imagens de arquivo e camadas narrativas serão revisitadas e postas enquanto objeto de reflexão. O clipe será visto constantemente, além do uso de reportagens sobre a repercussão do trabalho.

    A partir daí, pretende-se sugerir significâncias de códigos afro futuristas, como eles são inseridos no clipe, onde estão, que sentido agregam ao vídeo, e com isso ampliar a percepção audiovisual através da captura de tal conceito poético.

    Conclusões

    A partir do prisma do afrofuturismo, percebemos como o clipe reinventa o eu-lírico na música. Através de um sonho, a protagonista é representada em outro espaço, onde tem a voz que almeja. Pode debulhar seus anseios, mas também clamar um futuro melhor. “Esta é a tarefa dos músicos de vanguarda, que de preferência devem atuar para e dentro dos meios de comunicação de massa, até que o sistema tradicional se transforme e seja absolvido” (PIGNATARI, 2002, p. 144). Denuncia a injustiça social, toma frente de um debate, projeta a realidade atual, a que nos antecedeu, e entoa ordens de um amanhã mais digno.

Bibliografia

    BERNARDET, Jean-Claude. O que é cinema. 16. ed. São Paulo: Brasiliense, 2000.

    DERY, Mark. Black to the future: interviews with Samuel R. Delany, Greg Tate and Tricia Rose em Flame Wars: the discourse of cyberculture. Durham: Duke University Press, 1994.

    FREITAS, Kênia; MESSIAS, José. O futuro será negro ou não será: Afrofuturismo versus Afropessimismo – as distopias do presente. Imagofagia: Revista de La Asociación Argentina de Estudios de Cine y Audiovisual. Nº 17, 2018.

    PIGNATARI, Décio. Informação, Linguagem, Comunicação. 25. ed. São Paulo: Ateliê Editorial, 2002.

    WOMACK, Ytasha. “Cadete Espacial” in Freitas, Kênia (org.). Afrofuturismo: cinema e música em uma diáspora intergaláctica. 1. ed. São Paulo: Caixa Cultural, 2015.