Trabalhos Aprovados 2022

Ficha do Proponente

Proponente

    Rafael de Amorim Albuquerque e Mello (UFMG)

Minicurrículo

    Produtor audiovisual e Jornalista formado pela UFPE, atualmente é mestrando do Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social da UFMG na Linha de Pragmáticas da Imagem e integra o Grupo de Pesquisa Poéticas da Experiência. Investiga modulações de encenações de si de jovens em experiências audiovisuais no cinema brasileiro e sua relação com o espaço social. Tem como temas de interesse documentário, análise fílmica comparada, entrevista, cinema militante, cinema e educação, entre outros.

Ficha do Trabalho

Título

    Autoencenações da juventude e o espaço social: MLB-MG e Caranguejo-PE

Formato

    Presencial

Resumo

    Olhando para gestos de juventudes em experiências audiovisuais do Coletivo Caranguejo Tabaiares Resiste, no Recife, e o MLB de Minas Gerais, indagamos como tais filmes constroem os espaços sociais destes sujeitos em suas autoencenações. Fazemos um cotejo com produções realizadas em diferentes contextos do cinema brasileiro moderno. A análise se desenvolve pelo arranjo cênico da Corrida, a exemplo de situações de fuga e deambulações reflexivas, que reverbera a relação dos jovens com o espaço.

Resumo expandido

    A pesquisa parte de experiências audiovisuais envolvendo o Coletivo Caranguejo Tabaiares Resiste, da comunidade de mesmo nome em Recife, e o MLB (Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas) de Minas Gerais. Por meio de oficinas de realização fílmica, a juventude aparece de forma decisiva na construção de uma autoimagem coletiva em meio a situações de disputas, que no caso desses filmes envolve o direito à moradia, ameaçado pelo avanço da especulação imobiliária nos respectivos locais. Buscamos articular os espaços sociais e autoencenações valorizando gestos, movimentos, nuances e posturas da juventude, de modo que a visionagem crítica das cenas em conjunto, organizadas em pranchas, deu origem ao arranjo cênico de Corridas. Fundamentamos a análise nos conceitos auto-mise-en-scène de Comolli (2009), da ideia de fuga em Dénètem Toum Bona, assim as reflexões benjaminianas acerca da juventude. Convoca-se filmes do cinema brasileiro moderno com a intenção de investigar a autoencenações da juventude no cinema brasileiro em relação aos espaços sociais com o objetivo de aprofundar a análise das experiências de coletivos contemporâneos, colocando-as em perspectiva histórica em relação ao cinema brasileiro. Mais precisamente, trazemos os filmes Couro de Gato (Joaquim Pedro de Andrade, 1962) e Lacrimosa (Aloysio Raulino e Luna Alkalay, 1969). Diante das diferenças entre os filmes, propomos uma vizinhança que destaque as modulações pelas quais essa juventude encena a si mesma diante da câmera.
    Em julho de 2019, a comunidade Caranguejo Tabaiares foi alvo de um “decreto de desapropriação em caráter de urgência”, expedido pela prefeitura da cidade. A desapropriação ocorreria em virtude das obras de requalificação do Canal do Prado, em cujas margens se localiza. Após intensa mobilização envolvendo a comunidade e movimentos sociais o decreto foi revogado. Entre as ações, se destacaram oficinas audiovisuais com a juventude do local que resultaram no videoclipe. Sem Destruição, que busca afirmar o senso de pertencimento dos moradores através de um combativo bregafunk. Em relação aos filmes do MLB, analisamos A Rua é Pública, Palmilha Aniversário e Castigo e Papagaio Verde, oriundos de oficinas com crianças da Ocupação Isidora e Eliana Silva entre 2013 e 2017 – no momento que as ruas estavam sendo abertas.
    A explosão de novas mídias intensifica certa interpelação à auto exposição dos povos pela imagem – convite elaborado dentro de uma perspectiva de vigilância e esgotamento do discurso de si do capitalismo contemporâneo. Nesse processo de apelo a exposição de si abre-se uma fissura. Um outro tipo de relação com a imagem em que jovens, crianças e adolescentes aparecem como atores críticos, que encarnam a possibilidade de uma experiência ainda porvir. Aparelhos e dispositivos previamente concebidos por uma ótica de esgotamento de si, consumo e vigilância se ressignificam. Esses sujeitos se relacionam com a câmera através de uma postura, que surge como decorrência prática da mise-en-scène, em encenações conjuntas de si, seja na reação ao olhar externo, seja na emanação de um olhar interno em que a câmera se “dispõe” aos filmados, articulando rostos, olhares e gestos, pela/na imagem em cenários de conflito.
    A Corrida é entendida como busca por um destino que se desdobra no espaço. Analisaremos modulações da corrida, observadas a partir de cenas dos filmes, caso da fuga da câmera em Lacrimosa, da perseguição da polícia pelos meninos em Couro de Gato, das corridas pelos becos de Caranguejo Tabaiares e das diversas cenas presentes em filmes do MLB. São momentos em que a corrida das crianças abre as cenas, em que os atores-sujeitos crescem no quadro através da corrida, inaugurando ainda movimentos de fuga e deambulações reflexivas. Nas paisagens, a princípio vazias a corrida das crianças é a evidência da vida em movimento, da paisagem e do território ocupados, habitados e, desta forma, vivos.

Bibliografia

    ARAÚJO, Luciana. Joaquim Pedro de Andrade: primeiros tempos. Alameda, 2013.
    BENJAMIN, Walter, e João Barrento. Rua de Mão Única – Infância Berlinense. Autêntica, 2013.
    BERNADET, Jean-Claude. A discreta revolução de Aloysio Raulino. In: CARDOSO VALE, Glaura (org.). Catálogo do 17º Forum.doc BH. Belo Horizonte: Associação Filmes de Quintal, 2013.
    BONA, Dénètem Touam. A arte da fuga: dos escravos fugitivos as refugiados.. Tradução: Amilcar Packer
    BUTLER, Judith. Vida precária. Contemporânea: Revista de Sociologia da UFSCar, São Carlos, SP, v. 1, ed. 1, p. 13-33, 1 jun. 2011.
    COMOLLI, Jean-Louis. Ver e poder: a inocência perdida: cinema, televisão, ficção, documentário. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2008. 373 p.
    SOUTO, Mariana. Constelações fílmicas: um método comparatista no cinema. Galáxia (São Paulo), no 45, dezembro de 2020, p. 153–65. DOI.org (Crossref
    RANCIÈRE, Jacques. O tempo da emancipação já passou? In: SILVA, R. (Org.). A república por vir. Lisboa, 2011.