Trabalhos Aprovados 2022

Ficha do Proponente

Proponente

    Cecília Antakly de Mello (USP)

Minicurrículo

    Cecília Mello é Professora Associada no Departamento de Cinema, Rádio e Televisão da Escola de Comunicações e Artes da USP. É autora de, entre outros, The Cinema of Jia Zhangke: Realism and Memory in Chinese Film (Londres: Bloomsbury 2019

Ficha do Trabalho

Título

    Realismo Mágico e a Ontologia Pós-Fotográfica do Cinema Asiático

Formato

    Presencial

Resumo

    Minha intenção nesta comunicação será analisar a manifestação do que venho chamando de “realismo fantasmagórico” nos filmes Memória (2021), de Apichatpong Weerasethakul, e Longa Jornada Noite Adentro (2018), de Bi Gan. A principal hipótese a ser explorada é a de que esta manifestação deriva parcialmente de relações e interações desses filmes com a literatura, a geografia e a história da América Latina.

Resumo expandido

    Minha intenção nesta comunicação será analisar a manifestação do que venho chamando de “realismo fantasmagórico” nos filmes Memória (2021), de Apichatpong Weerasethakul, e Longa Jornada Noite Adentro (2018), de Bi Gan. A principal hipótese a ser explorada é a de que esta manifestação deriva parcialmente de relações e interações desses filmes com a literatura, a geografia e a história da América Latina.

    A comunicação pertence a uma investigação mais ampla sobre as atuais tendências realistas nos cinemas do Leste / Sudeste Asiático e da América Latina. Nota-se, por um lado, a persistência da indexicalidade na opção frequente pelo realismo Baziniano, alicerçado no plano-sequência, na profundidade de campo, nas filmagens em locação e na ênfase em situações do quotidiano. Por outro lado, é cada vez mais perceptível a incorporação de elementos fantásticos, mágicos e fantasmagóricos na diegese, bem como de eventos inexplicáveis e atmosferas de medo que complicam a relação entre a imagem cinematográfica e o real objetivo. Como consequência, esses filmes se abrem à intersecção de diferentes temporalidades: o presente da realidade fenomenológica, as camadas do passado e o universo da memória que pertence ao tempo das presenças póstumas, e as ocorrências estranhas que podem pertencer ao futuro ou serem simplesmente atemporais. Disso resulta o que venho chamando de “realismo fantasmagórico” (2015), produto da relação entre a ontologia pós-fotográfica (Elsaesser, 2015) e os paradigmas espaciais em transformação no cinema e no audiovisual (Bordwell, 1985; Crary, 1990; Bruno, 2003).

    Se a própria noção de espaço na cultura visual contemporânea tende à fluidez, é notável o número de experiências cinematográficas na América Latina e no Leste/Sudeste Asiático que colocam em xeque a propriedade indéxica da imagem e do som cinematográficos, que passam a sofrer de uma “desconfiança epistemológica”. Esta desconfiança parece por sua vez denotar o impacto das intensas transformações espaciais e a consequente perda da referência e da memória que vem marcando a história recente das duas regiões. A perda da perspectiva monocular, a transformação do espaço e o desaparecimento da memória, ao mesmo tempo em que trazem à tona um desejo de preservação do real, também parecem sugerir que não é mais possível confiar no que se vê e no que se ouve.

    Levando essas hipóteses em consideração, meu objetivo será explorar de que forma essa desconfiança epistemológica se manifesta esteticamente nos filmes Memória e Longa Jornada Noite Adentro, nos quais o plano-sequência, espinha dorsal do realismo estético Baziniano, transmuta-se em um amálgama capaz de conter, de uma só vez, múltiplas temporalidades e espacialidades, introduzindo uma dimensão “fantástica” ou “assombrada” à diegese. Ambos os filmes conjugam uma relação privilegiada com a América Latina, principalmente por meio de sua literatura (notadamente Jorge Luis Borges e o “realismo mágico”), mas também por meio de sua geografia e história recentes, confirmando assim a hipótese central do projeto acerca das afinidades entre as duas regiões antípodas – e seus cinemas.

Bibliografia

    Borges, Cristian (2019), Em busca de um cinema em fuga: o puzzle, o mosaico e o labirinto como chaves da composição fílmica. São Paulo: Perspectiva.
    Elsaesser, Thomas (2009), “World Cinema: Realism, Evidence, Presence”, in Nagib, Lúcia and Mello, Cecília (eds.), Realism and the Audiovisual Media. Basingstoke: Palgrave Macmillan
    Gordon, Avery (1997), Ghostly Matters: Haunting and the Sociological Imagination. Minneapolis: University of Minnesota Press.
    Mello, Cecília (2015), Realismo Fantasmagórico. São Paulo: Cinusp.
    Lim, Bliss Cua (2009), Translating Time: Cinema, the Fantastic, and Temporal Critique. Durham and London: Duke University Press.
    Mei Gao (2020), “Between Ontology and Hauntology Magic Realism in Contemporary Chinese Cinema”, in Revista de Comunicação e Linguagens/Journal of Communication and Languages, N.53, pp. 39-56.