Trabalhos Aprovados 2022

Ficha do Proponente

Proponente

    Leonardo Medeiros da Silva (UFOP)

Minicurrículo

    Mestrando do Programa de Pós-graduação em Artes Cênicas da Universidade Federal de Ouro Preto (PPGAC/UFOP). Licenciado em Teatro pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (DEART/UFRN). Atualmente é membro do grupo DRAMATIC – Grupo de Pesquisa em Dramaturgia: Teorias, Intermídias e Cena cultural. Tem interesse nos seguintes campos de estudo: estética e teoria teatral; dramaturgia; cinema.

Ficha do Trabalho

Título

    Ecos de Antígona no Cinema

Formato

    Presencial

Resumo

    Este trabalho discute as reescritas que a tragédia grega efetua no cinema. Para tanto, objetiva-se uma análise da obra Antígona (441 a.C.), de Sófocles, tendo como eixo de reflexão um exame de duas versões fílmicas da tragédia, a saber: Antigone (Yorgos Javellas, 1961) e Antígona – A Resistência Está no Sangue (Sophie Deraspe, 2019). A partir do legado que caracteriza a tragédia de Antígona, pretende-se considerar as interdiscursividades desse mito trágico no cinema.

Resumo expandido

    Chamamos a atenção aqui para algumas dimensões analíticas que envolvem o processo de transposição da dramaturgia trágica para o cinema. Vários conceitos têm configurado uma miríade que aponta para uma “teoria da adaptação”, tais como a transcriação, a reescrita, a tradução, o dialogismo, a apropriação, a intertextualidade, etc. (STAM, 2006). Se tradicionalmente havia inflexibilidade no que tange aos processos de releitura fílmica, ancorados em geral sob a tutela crítica da “fidelidade”, hoje, as atenções voltam-se para os estudos da tradução, apropriação, transcriação e reescrita do texto – literário – para as telas de cinema (SILVA, 2013). É preciso levar em conta que os textos são antecedentes de outras textualidades, tais como os mitos da Antiguidade são, por exemplo, recontados através da literatura, pintura, HQs, games, dramaturgia, séries, cinema, entre outros. Os mitos, a título de exemplificação, continuam sendo revisitados, atualizados e debruçados constantemente, dado a sua esplendorosa capacidade de reflexão sobre as complexidades humanas (STEINER, 1995). Alguns dos exemplos que poderíamos constar nesse sentido diz respeito às tragédias de Édipo Rei (427, a.C.), de Sófocles, e Medeia (431 a.C.), de Eurípides. Essas tragédias, dentre outras, continuam a fertilizar inúmeras reflexões sobre as relações individuais e coletivas nos dias atuais, promovendo ao mito antigo um papel singular nas mais distintas esferas do conhecimento humano. Posto isso, propõe-se aqui realizar uma reflexão sobre a tragédia grega Antígona (441 a.C.), também de Sófocles, tendo em vista sua representação no cinema. Visa-se, como principal eixo de reflexão, um exame de duas versões fílmicas desta obra trágica, a saber: o filme grego Antigone (Yorgos Javellas, 1961) e a releitura contemporânea Antígona – A Resistência Está no Sangue (Sophie Deraspe, 2019). Enquanto o primeiro filme realiza um movimento de retorno à Antiguidade, recriando o ambiente histórico e mítico da tragédia sofocliana, o filme da cineasta Sophie Deraspe atualiza o mito, deslocando temporalmente os sentidos da narrativa para o contexto contemporâneo, onde tensões culturais, migratórias, jurídicas, étnicas, midiáticas e sociais reconfiguram a narrativa clássica. É no centro dessa dinâmica que se pretende explorar o conceito de intermidialidade, isto é, a inter-relação entre distintas mídias, levando em conta a desfronteirização e a interação de diferentes esferas de mediação, tais como a dramaturgia trágica e o cinema (CLÜVER, 2007). Partimos do pressuposto que a intermidialidade é, também, um “[…] momento em que a propriedade de uma mídia passa a habitar outra” (PINTO e DOMINGOS, 2018, p. 29). No mito trágico, a personagem Antígona, símbolo de rebeldia e resiliência, enfrenta a tirania do rei Creonte ao transgredir o decreto real no qual proibia o sepultamento do corpo de Polinices, seu irmão. O gesto de honra ao ente querido demonstra um caráter fraterno e obstinado da heroína frente a uma causa natural, ligada tanto pelo vínculo incestuoso entre seus familiares, como por reverência às tradições de outrora. Em razão de seus propósitos, seu feito ainda se constitui como um eco reverberante, fator este que perpassa desde tradições míticas presentes nos períodos mais remotos da humanidade, até as reescrituras cinematográficas e dramatúrgicas nos séculos XX e XXI. Reconhece-se nessa empreitada inter-relacional entre o trágico e o fílmico uma dimensão intertextual, intermidial, transcultural e trans-histórica que a figura de Antígona ocupa nos atuais estudos de comparação e ressignificação entre linguagens estéticas e midiáticas. As reescritas do mito abarcam um amplo conjunto de camadas, de modo a atravessar esferas de ordem cultural, política, ideológica, histórica, poética e social. Estas dimensões, por sua vez, penetram significativamente no escopo intermidial e intertextual que o mito trágico de Antígona reverbera nas narrativas fílmicas.

Bibliografia

    ANTÍGONA – A Resistência Está no Sangue. Dir. Sophie Deraspe. Pro. Marc Daigle. Canadá: ACPAV, 2019. Drama. 109 min.

    ANTIGONE. Dir. Yorgos Javellas. Pro. Demetrios Paris. Grécia: Norma Film Productions, 1961. Drama. 93 min.

    CLÜVER, C. Intermidialidade. Pós, Belo Horizonte, v. 1, n. 2, p. 8-23, nov. 2011.

    PINTO, Á. G.; DOMINGOS, A. C. M. William Shakespeare: diálogos intertextuais e intermidiáticos no filme Anônimo. Tradução em Revista, Rio de Janeiro, v. 2018, p. 1-26, 2018.

    SILVA, M. V. B. Adaptação Intercultural: o caso de Shakespeare no cinema brasileiro. Salvador: EDUFBA, 2013.

    SÓFOCLES. Antígona. Trad: de Millôr Fernandes. Rio de Janeiro: Paz e Terra. 2020.

    STAM, R. Teoria e prática da adaptação: da fidelidade à intertextualidade. Ilha do Desterro, Florianópolis, v. 51, p. 19-53, 2006.

    STEINER, G. Antígonas. Trad: Miguel Serras Pereira. Rio de Janeiro: Relógio D’Água Editores, 1995.