Trabalhos Aprovados 2022

Ficha do Proponente

Proponente

    RAFAEL TASSI TEIXEIRA (Unespar (PPGCINEAV)))

Minicurrículo

    Pós-Doutor em Cinema e Audiovisual (Universitat Autònoma de Barcelona – UAB; 2018). Doutor em Sociologia pela Universidad Complutense de Madrid (UCM; 2004). Professor Colaborador do Mestrado e Doutorado em História (PPGHIS\UFPR – Linha de Pesquisa Arte, Memória e Narrativa). Professor Adjunto do Mestrado em Cinema e Artes do Vídeo (PPG-CINEAV\UNESPAR). Líder do Grupo de Pesquisa (CNPq) Eikos – Imagem e Experiência Estética.

Ficha do Trabalho

Título

    Testemunho e Reescritura Fílmica em Jojo Rabbit e The Painted Bird

Formato

    Presencial

Resumo

    O trabalho procura discutir as enunciações e estilos dramáticos e narratológicos apresentados nos filmes Jojo Rabbit (Taika Waititi; 2019) e The Painted Bird (Václav Marhoul; 2019), pensando como tais obras acionam testemunhos literários correlacionando-os com a problemática do representável e irrepresentável, classicamente associado ao tema. Propõe-se, aqui, analisar a reescritura cinematográfica e as brechas entre ficção, literatura, testemunho e forma fílmica.

Resumo expandido

    Dois filmes recentes, partindo de estratégias estéticas e discursivas diferentes, e tendo como protagonistas infantis, problematizam a questão da imagem do horror associada a perseguição e massacre dos judeus durante a Segunda Guerra Mundial. Com enunciação forte, centralidade de personagem infantil, baseado em uma obra literária declarada autobiográfica, e trazendo como recurso principal a exposição constante à múltiplos episódios violentos, The Painted Bird (Václav Marhoul; 2019) narra a progressiva transformação de uma criança judia que precisa sobreviver na Europa (Tchecoslováquia) ocupada de 1942. Faz uso de uma linguagem clássica e episódica para exibir todas as histórias com signos de crua violência, apresentadas sem pudor pela câmera de Marhoul. Em um caminho estético-argumentativo completamente diferente, Jojo Rabbit (Taika Waititi; 2019), também baseada em uma peça literária (o livro de Christine Leunens), perspectiva a narrativa em um menino alemão que descobre que sua mãe esconde uma menina judia em um dos quartos da casa, enquanto se apoia no amigo imaginário Adolf Hitler. Constrói sua linha narrativa utilizando fábula e alegoria no esforço de acompanhar o olhar fantasioso e iludido (escapista) da criança, que deseja fazer parte da juventude hitlerista e, ao mesmo tempo, descobre o amor (e também o nega) no contexto da Alemanha nazista. O filme aciona elementos irônicos\satíricos na contextualização do entorno violento, até que uma única cena dramática, vista no final do filme, funciona como o gatilho da mudança do olhar (a abertura dos olhos da criança). Nesse sentido, a estratégia de “exageração e distorção em um contexto sério, até mesmo trágico” (FRODON, 2013), coloca os dois filmes em direção oposta ao paradigma desenvolvido por Claude Lanzmann no filme canônico Shoah (Claude Lanzmann; 1985): codificação da imagem abjeta, dispositivo cuidadoso da abordagem em um massacre de grandes proporções, registro caracterizado pelo distanciamento. No filme de Lanzmann, a restrição ao uso de arquivos e a ênfase no testemunho, da mesma maneira que os travellings lentos sobre os lugares (vazios) acontecimentos, os planos profundos caracterizados pela sensação constante de fantasmagoria (ROTHBERG, 2000), e o modelo de entrevistas que combina imagens contemporâneas dos locais intercalando a presença do cineasta-interlocutor ora na diegese ora no extracampo, afiançam uma espécie de jogo de anacronias entre o testemunho a ser dito e a imagem a ser um referente impossível. No caso de The Painted Bird e Jojo Rabbit, a reescritura cinematográfica aciona riso, escatologia dramática, profundidade das representações abjetas, deriva imaginária e tratamento ‘realista’ e ‘irônico’ para abordar o tema do olhar da infância e dos testemunhos literários em um contexto de profunda e específica brutalidade (àquela vivida pelos judeus na Segunda Guerra Mundial). A veiculação da comédia, a utilização do Holocausto para tencionar estrutura e narração, fábula e imaginário, testemunho e tragédia, além de adaptação fílmica, não são, nessas obras, estratégias de disposição do extermínio em uma abordagem ‘realista’, mas, sim, um campo fílmico que exorta de maneira inestável e antagônica a exigência de resposta proeminente frente ao desafio da representação de temática sensível (SÁNCHEZ-BIOSCA, 2006). O trabalho, nesse sentido, procura discutir tais enunciações e estilos dramáticos\narratológicos apresentados nos filmes que acionam testemunhos literários, correlacionando-os com a problemática do representável e irrepresentável, classicamente associado ao tema. Além de propor em que medida a reescritura cinematográfica provoca uma brecha entre ficção, literatura e testemunho.

Bibliografia

    ALTMAN, Rick. A Theory of Narrative. New York: Columbia University Press, 2008.
    BRINK, Joram e OPPENHEIMER, Joshua. Killer Images. Documentary Film, Memory and the Performance of Violence. Columbia University Press, 2012.
    FRODON, Jean-Michel. “The Last Laugh. Strange Humors of Cinema”. POMERANCE, Murray (ed.). Wayne State University Press: Detroit, 2013.
    HARTMAN, Geoffrey. Holocausto, Testemunho, Arte e Trauma, In SELIGMANN-SILVA, Márcio. Catástrofe e Representação (pp. 207-235). São Paulo: Escuta, 2000.
    MARAS, S. Screenwriting: History, Theory and Practice. Wallflower Press, 2009.
    OUBIÑA, David. El Silencio y sus bordes. Modos de lo Extremo en la Literatura y el Cine. Buenos Aires: Fondo de Cultura Económica, 2011.
    ROTHBERG, Michael. Traumatic Realism: The Demands of Holocaust Representation. University of Minnesota Press, 2000.
    SÁNCHEZ-BIOSCA, Vicente. Cine de Historia, Cine de Memoria: La Representación y sus Límites. Madrid: Cátedra, 2006.